OPINIÃO Berkah, o maior fã de Éder em Bali
Durante uma semana em Bali jurei que não falaria ou pensaria em futebol. Ingenuidade tonta, já que sou português... Mas sempre conheci alguém que ‘enriqueceu’ na final do Europeu à custa de Éder... Eu sou o Jorge Pessoa e Silva e esta é a crónica semanal do Livro do Desassossego
No momento em que entrei no Boing 737 para iniciar a viagem para Bali, prometi a mim mesmo que haveria de conseguir ter o telemóvel sempre desligado e, durante uma semana de férias, fazer questão de não saber e não falar de desporto. Por muito que gostemos do que fazemos, há momentos em que temos de saber desligar, descarregar a bateria antes de a voltar a carregar. Concentrar noutros interesses e aprender a deixar correr os minutos devagar.
Grosso modo cumpri o que prometi, mas houve alguma ingenuidade em acreditar que durante uma semana nem tocaria no tema desporto. E a culpa é de CR7. Sempre que dizia que era português logo retorquiam, em tom de maravilha e exclamação, «oh… Cristiano Ronaldo». Senti-me tonto por me ter surpreendido. E lá falava um pouco de CR7, da seleção de Portugal, do Benfica, Sporting e FC Porto, esquecendo promessas feitas à partida de Lisboa, imbuído no espírito de um verdadeiro ministro dos Negócios Estrangeiros. Os portugueses foram os primeiros europeus a estabelecer uma presença colonial nas ilhas da Indonésia, em 1512. E ainda hoje me agradecem termos para lá levado o... café arábico. Outra grande marca portuguesa… Cristiano Ronaldo.
Há exceções, como a de Berkah, que tem um ídolo diferente: Éder. Na final do Euro de 2016 juntou-se a muita gente num clube privado para assistir à final. Privado e escondido para que a polícia não visse que ali se iria apostar, atividade ilegal em Bali. Com a maioria a colocar o dinheiro na França, Berkah teve um ato de loucura ao apostar todo o salário de um mês de trabalho duro na vitória de Portugal. Ainda hoje reconhece que não sabe onde tinha a cabeça, mas logo sorri ao rever as imagens de Éder a marcar o golo da vitória lusa. «Viva Éder, viva Portugal», atira, antes de se lembrar que a esplanada estava cheia e muita gente ansiosa para atender.
Bali, hindu, está repleta de templos, religiosidade, tradições, procissões. Natureza e exotismo. Boas praias de água quente. Simpatia dos locais. E muitos, mas muitos estrangeiros.
Viajar é um estado de espírito. Crescimento. E é mesmo o melhor remédio para a xenofobia, racismo e outras formas de intolerância. É aprender a aprender. Até sobre qual o nosso lugar no Mundo e a nossa verdadeira dimensão. Pequena demais para nos levarmos muito a sério.
Na viagem de regresso dou por mim a pensar que os aeroportos são excelentes ecossistemas para estudar a natureza humana. Dou por mim a reparar nas pessoas. Brancos, negros, castanhos ou amarelos. Cristãos, judeus, muçulmanos, hindus ou ateus. Andam no mesmo passo apressado, os filhos fazem birra da mesma maneira, as expressões de satisfação ou ansiedade são perfeitamente iguais, a tensão do avião a levantar voo é a mesma, o alívio quando aterra é mimético. Só entre a tripulação do meu voo, 20 nacionalidades e 22 línguas faladas. Um mundo numa casca de noz a 10 mil metros de altitude.
Cheguei a Portugal e liguei os dados do telemóvel. Há bronca no futebol. Fernando Gomes fez uma rasteira a Pedro Proença. Ou uma resposta a agressão? Comunicados e acusações recíprocas. Até Marcelo Rebelo de Sousa se meteu ao barulho e pediu bom senso e que se lave a roupa suja dentro de casa.
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FC Porto e Benfica trocam comunicados acusatórios em redor de um negócio de há duas décadas entre uma empresa de Rui Costa, então jogador, e outra de Reinaldo Teixeira, atual coordenador dos delegados de Liga e candidato à presidência do organismo.
Sinto que boicotaram os meus esforços diplomáticos em prol de Portugal. Acho que vou voltar já para Bali…