«Criámos o memorial ‘Tirop’s Angels’ para evitar mais mortes de mulheres no Quénia»
Agnes Tirop foi assassinada em 2021, à facada, pelo marido (DR)

«Criámos o memorial ‘Tirop’s Angels’ para evitar mais mortes de mulheres no Quénia»

ATLETISMO13.02.202416:55

Joan Chelimo, amiga de Agnes Tirop, assassinada pelo marido em 2021, lançou um movimento em sua honra. «A violência acontece todos os dias com mulheres que não sabem o que fazer», lamenta

Agnes Jebet Tirop era uma das maiores esperanças do atletismo feminino do Quénia quando em 2021, em Iten, a dez dias de completar 26 anos, foi esfaqueada até à morte pelo marido, Emmanuel Rotich. Agnes era campeã africana de corta-mato, ganhara a medalha de bronze nos 10 000 metros dos Mundiais de 2017 e 2019 e fora 4.ª classificada nos 5000 m dos Jogos Olímpicos de 2020. A 12 de setembro de 2021, bateu o recorde do mundo dos 10 km em estrada em corrida apenas para mulheres. Trinta e um dia depois estava morta.

Joan Chelimo, amiga de Agnes Tirop e vencedora das meia-maratonas de Praga, Berlim e Boston, decidiu, então, criar um memorial em sua honra. «De forma a que ninguém se esqueça do que se passou com ela, do que tantas vezes se passa no Quénia e daquilo que se passará um pouco por todo o mundo; as agressões de maridos às suas esposas», diz Joan Chelimo a A BOLA.

«Agnes era uma querida, estava sempre a sorrir. Era calada, mas muito simpática. Treinávamos juntas em Iten e a nossa amizade foi crescendo. Em 2021, quando foi assassinada, não consegui correr durante uma semana. Não acreditava que ela estava morta. Só acreditei quando fui a casa dela e a vi deitada no chão», recorda Joan a A BOLA.

Joan Chelimo, de amarelo, num treino na pista de Eldoret (DR)

«Conversei com muitos amigos e amigas e todos diziam o mesmo: temos de estar alerta. Isto não pode continuar. A violência no Quénia acontece todos os dias com várias mulheres, mulheres que não sabem para onde se virar ou como escapar. Senti que precisávamos de criar algo forte para recordar a Agnes e para garantir que a morte dela levasse a alguma mudança significativa. E criámos os Tirop’s Angels», acrescenta a maratonista de 2h18.04, tempo feito em 2022.

«O nome diz quase tudo», explica Joan. «Viemos em paz e queremos levar paz às mulheres do Quénia. Quando começámos, a maioria dos homens pensava que era um movimento contra eles e contra o casamento. Nada disso. O nosso objetivo é orientar e educar a próxima geração de rapazes e raparigas. Queremos, no fundo, celebrar a vida da Agnes e queremos que as atletas tenham acesso a locais seguros para que, caso sejam violadas, ainda possam treinar e sentir-se seguras. Queremos educar as mulheres sobre os seus direitos porque muitas não os conhecem. A tragédia de Agnes poderia ter sido evitada se ela se sentisse capaz de falar. Queremos criar uma plataforma onde, se as mulheres estiverem a passar por alguma coisa nas suas vidas, possam falar connosco e compartilhar o que está  a acontecer. Quando ela morreu, eu esperava que os atletas do sexo masculino no Quénia, especialmente aqueles com uma grande visibilidade internacional, expressassem a sua tristeza e recorressem às redes sociais, apelando ao fim de tal violência. Mas houve silêncio», esclarece, ao nosso jornal.

Joan Chelimo foi uma das criadoras dos ‘Tirop’s Angels’ (DR)