24 novembro 2023, 08:00
António Silva, o capitão sem braçadeira no Benfica
O gesto no dérbi com o Sporting, o dedo em riste na Champions e muito mais; jovem central é um líder silencioso nos encarnados
Paulo Madeira, antigo defesa-central e internacional português, que também foi capitão do Benfica, olha para António Silva com entusiasmo e esperança, comparando o número 4 das águias com Rúben Dias, antigo jogador dos encarnados que agora é figura no Manchester City.
— O que é preciso para ser um capitão de equipa?
– Acima de tudo, ter os respeito dos companheiros de equipa. O António Silva tem feito, neste ano e meio mais ou menos, coisas fantásticas na alta roda do futebol. O Otamendi é o capitão e nem fale a pena falar da carreira dele, mas diria que o António está a fazer o caminho dele, no clube e na Seleção. Terá deslizes, como todos na carreira, e num central, como a um guarda-redes, todos apontam um deslize, não acontece tanto com os médios e os avançados. Mas o António é muito jovem e está a traçar um caminho parecido ao que traçou o Rúben Dias.
— Por ter sido formado no Benfica, isso também dá uma legitimidade diferente ao António para apelar ao benfiquismo da equipa…
– Tem uma idade diferente da de Otamendi e, é verdade, foi formado no Benfica… tem traços de liderança que, volto a dizer, via no Rúben Dias; acho-os muito idênticos no percurso nos primeiros anos de Benfica. Vamos ver o que acontece, se não sai como o Rúben…
— É muito difícil ser capitão no Benfica?
– É. É uma responsabilidade muito grande. É fácil quando as coisas correm bem, nessas alturas é fácil e sabe bem ser capitão da equipa, mas quando correm mal… aí, sim, é preciso saber ser um verdadeiro capitão, um verdadeiro líder. E, sim, o António tem um bocado disso.
24 novembro 2023, 08:00
O gesto no dérbi com o Sporting, o dedo em riste na Champions e muito mais; jovem central é um líder silencioso nos encarnados
Vítor Manuel vê no central um «líder natural». O treinador português identifica nele características «especiais» e atribui também méritos a Roger Schmidt.
«Gosto de tudo no António Silva», resume, Vítor Manuel um dos senadores do futebol português, no final de uma conversa com A BOLA sobre a capacidade de liderança e características técnicas do defesa-central de 20 anos do Benfica.
O jovem foi protagonista, no dérbi com o Sporting (2-1), de novo episódio que aqueceu o coração dos adeptos, quando pegou em João Neves aos 90+4’ para que não se perdesse tempo com celebrações e se tentasse ainda o golo do triunfo, que chegou mesmo.
O treinador de 71 anos identifica nos comportamentos em jogo de António Silva e na relação com os companheiros as qualidades de «um líder natural». A prova está, por exemplo, «na forma natural e discreta como se impôs, sem ter de andar em bicos de pés, sem precisar de dizer que é melhor que este ou aquele, que é isto ou aquilo». Vítor Manuel acrescenta que no jovem central se sente «a presença de alguém especial e que não precisa de manifestações públicas para revelar o jogador que é».
«A personalidade e essa liderança natural vem, com certeza, do berço, do núcleo familiar. Faz parte da essência dele. É tudo natural e sem maquilhagem», argumenta o treinador, que também recorda o lance, na época passada, em que António Silva esticou o dedo ao veterano Leonardo Bonucci, então na Juventus, na fase de grupos da Liga dos Campeões: «Não foi a primeira vez que teve comportamentos, já contra a Juventus mostrou esse sentido de liderança. coletivo e responsabilidade, enfrentando Bonucci. É um miúdo com personalidade fortíssima.» Vítor Manuel considera, porém, que António Silva «não tinha necessidade» de pedir desculpa depois do jogo com o Salzburgo, na Luz, no qual foi expulso aos 13’, mas o gesto «também revela caráter e grande humildade». «Não foi por ele que o Benfica perdeu. Claro que houve consequências pela expulsão. Ele sentiu essa obrigação de pedir desculpa, revelando mais uma característica importante da personalidade», assinala.
António Silva já se declarou «benfiquista ferrenho» e Vítor Manuel considera que «isso acrescenta sempre mais qualquer coisa em campo» por se defender o clube do coração: «Isso só pode contribuir para que se transcenda. Faz parte do ADN dele, fez todo o percurso no clube. Não é que vá obrigar os companheiros a ser mais benfiquistas, mas seguramente eles sentem isso em António Silva.»
Vítor Manuel defende que António Silva «aproveitou bem a oportunidade» para afirmar-se no Benfica. E aproveitou bem, ainda, estar a jogar ao lado de Nicolás Otamendi, de quem beneficia «do exemplo da experiência», que se passa «em conversas, nos jogos e nos treinos». Mas, segundo o treinador, o campeão do mundo também tem beneficiado: «Tem sido muitas vezes o guarda-costas de Otamendi. Os dois têm de complementar-se para que a sociedade funcione. E se António Silva tem aprendido muito com Otamendi, que sabe tudo do futebol, também já o protegeu muitas vezes em momentos difíceis»
Vítor Manuel, como se disse, gosta de tudo em António Silva. E tudo é o quê? «Serenidade, qualidade, leitura do jogo, capacidade para sair com bola, jogo aéreo, ocupação de espaços», responde o experiente treinador, que identificou, esta temporada, «uma fase mais apagada que foi ultrapassada». O treinador reconhece ainda «muito mérito» de Roger Schmidt, que «olhou para António Silva e viu algo de especial».
O capitão da equipa não tem qualquer estatuto ou privilégios especiais, mas tem um certo grau de responsabilidade pelo comportamento da equipa.
«É isto e apenas isto que as leis de jogo referem em relação aos capitães de equipa», começa por esclarecer o ex-árbitro Duarte Gomes, que traçou para A BOLA o que, na ótica de um árbitro, deve ser o capitão de uma equipa profissional de futebol.
«É isto e apenas isto que as leis de jogo referem em relação aos capitães de equipa. Já as normas e instruções para árbitros — documento complementar que também regula a sua tarefa — vão um pouco mais além, não em relação ao seu papel em si, mas em questões mais operacionais: a indicação na ficha de jogo, a eventual substituição por quem for designado como sub-capitão, o abandono temporário da partida, etc.
Na prática, o que se espera é que o capitão seja o representante máximo da equipa junto da equipa de arbitragem. Como já se percebeu, isso não lhe confere direitos acrescidos mas a responsabilidade de os liderar dentro das quatro linhas. Sob o ponto de vista do árbitro, de quem tem por missão dirigir jogos, os capitães de equipa têm que ser a referência maior de ética, respeito e saber estar. Espera-se que sejam a voz sensata e apaziguadora, que defende os interesses dos seus de forma firme mas respeitosa. Um capitão é alguém que mereceu a confiança dos seus pares e/ou técnicos para os comandar dentro do terreno de jogo. Isso confere-lhe responsabilidades acrescidas.
Obriga-o a ser educado e a ter capacidade de encaixe.
Obriga-o a ser um mediador, um diplomata. As suas características pessoais devem ser reconhecidas por todos: deve ser discreto e eficaz. Deve ser sempre o primeiro a sanar conflitos, nunca aquele que os inicia. Deve acalmar os jogadores mais alterados e evitar que criem atos de indisciplina. Um capitão nunca fala em seu nome, mas em nome dos seus. E um verdadeiro capitão nunca se pode esquecer que é visto pelos colegas como um exemplo de dignidade e caráter, um profissional comprometido, altruísta, resiliente. Uma referência como homem, como jogador e pessoa. Felizmente há em Portugal muitos jogadores com esse perfil.»