«Vejo no António Silva traços do Rúben Dias»

«Vejo no António Silva traços do Rúben Dias»

NACIONAL24.11.202312:30

Paulo Madeira, antigo defesa-central e internacional português, que também foi capitão do Benfica, olha para António Silva com entusiasmo e esperança, comparando o número 4 das águias com Rúben Dias, antigo jogador dos encarnados que agora é figura no Manchester City.

Paulo Madeira no antigo Estádio da Luz em 1992 (ASF)

— O que é preciso para ser um capitão de equipa? 
– Acima de tudo, ter os respeito dos companheiros de equipa. O António Silva tem feito, neste ano e meio mais ou menos, coisas fantásticas na alta roda do futebol. O Otamendi é o capitão e nem fale a pena falar da carreira dele, mas diria que o António está a fazer o caminho dele, no clube e na Seleção. Terá deslizes, como todos na carreira, e num central, como a um guarda-redes, todos apontam um deslize, não acontece tanto com os médios e os avançados. Mas o António é muito jovem e está a traçar um caminho parecido ao que traçou o Rúben Dias. 

— Por ter sido formado no Benfica, isso também dá uma legitimidade diferente ao António para apelar ao benfiquismo da equipa… 
– Tem uma idade diferente da de Otamendi e, é verdade, foi formado no Benfica… tem traços de liderança que, volto a dizer, via no Rúben Dias; acho-os muito idênticos no percurso nos primeiros anos de Benfica. Vamos ver o que acontece, se não sai como o Rúben… 

— É muito difícil ser capitão no Benfica? 
– É. É uma responsabilidade muito grande. É fácil quando as coisas correm bem, nessas alturas é fácil e sabe bem ser capitão da equipa, mas quando correm mal… aí, sim, é preciso saber ser um verdadeiro capitão, um verdadeiro líder. E, sim, o António tem um bocado disso.

«É tudo natural sem maquilhagem»

Vítor Manuel vê no central um «líder natural». O treinador português identifica nele características «especiais» e atribui também méritos a Roger Schmidt.

Vítor Manuel (Miguel Nunes/ASF)

«Gosto de tudo no António Silva», resume, Vítor Manuel um dos senadores do futebol português, no final de uma conversa com A BOLA sobre a capacidade de liderança e características técnicas do defesa-central de 20 anos do Benfica. 

O jovem foi protagonista, no dérbi com o Sporting (2-1), de novo episódio que aqueceu o coração dos adeptos, quando pegou em João Neves aos 90+4’ para que não se perdesse tempo com celebrações e se tentasse ainda o golo do triunfo, que chegou mesmo. 

O treinador de 71 anos identifica nos comportamentos em jogo de António Silva e na relação com os companheiros as qualidades de «um líder natural». A prova está, por exemplo, «na forma natural e discreta como se impôs, sem ter de andar em bicos de pés, sem precisar de dizer que é melhor que este ou aquele, que é isto ou aquilo». Vítor Manuel acrescenta que no jovem central se sente «a presença de alguém especial e que não precisa de manifestações públicas para revelar o jogador que é». 

«A personalidade e essa liderança natural vem, com certeza, do berço, do núcleo familiar. Faz parte da essência dele. É tudo natural e sem maquilhagem», argumenta o treinador, que também recorda o lance, na época passada, em que António Silva esticou o dedo ao veterano Leonardo Bonucci, então na Juventus, na fase de grupos da Liga dos Campeões: «Não foi a primeira vez que teve comportamentos, já contra a Juventus mostrou esse sentido de liderança. coletivo e responsabilidade, enfrentando Bonucci. É um miúdo com personalidade fortíssima.» Vítor Manuel considera, porém, que António Silva «não tinha necessidade» de pedir desculpa depois do jogo com o Salzburgo, na Luz, no qual foi expulso aos 13’, mas o gesto «também revela caráter e grande humildade». «Não foi por ele que o Benfica perdeu. Claro que houve consequências pela expulsão. Ele sentiu essa obrigação de pedir desculpa, revelando mais uma característica importante da personalidade», assinala. 

Benfiquista ferrenho

António Silva já se declarou «benfiquista ferrenho» e Vítor Manuel considera que «isso acrescenta sempre mais qualquer coisa em campo» por se defender o clube do coração: «Isso só pode contribuir para que se transcenda. Faz parte do ADN dele, fez todo o percurso no clube. Não é que vá obrigar os companheiros a ser mais benfiquistas, mas seguramente eles sentem isso em António Silva.» 

Guarda-costas de... Otamendi

 Vítor Manuel defende que António Silva «aproveitou bem a oportunidade» para afirmar-se no Benfica. E aproveitou bem, ainda, estar a jogar ao lado de Nicolás Otamendi, de quem beneficia «do exemplo da experiência», que se passa «em conversas, nos jogos e nos treinos». Mas, segundo o treinador, o campeão do mundo também tem beneficiado: «Tem sido muitas vezes o guarda-costas de Otamendi. Os dois têm de complementar-se para que a sociedade funcione. E se António Silva tem aprendido muito com Otamendi, que sabe tudo do futebol, também já o protegeu muitas vezes em momentos difíceis» 

Tantas qualidades

 Vítor Manuel, como se disse, gosta de tudo em António Silva. E tudo é o quê? «Serenidade, qualidade, leitura do jogo, capacidade para sair com bola, jogo aéreo, ocupação de espaços», responde o experiente treinador, que identificou, esta temporada, «uma fase mais apagada que foi ultrapassada». O treinador reconhece ainda «muito mérito» de Roger Schmidt, que «olhou para António Silva e viu algo de especial».

O capitão da equipa não tem qualquer estatuto ou privilégios especiais, mas tem um certo grau de responsabilidade pelo comportamento da equipa.

«É isto e apenas isto que as leis de jogo referem em relação aos capitães de equipa», começa por esclarecer o ex-árbitro Duarte Gomes, que traçou para A BOLA o que, na ótica de um árbitro, deve ser o capitão de uma equipa profissional de futebol.

O ex-árbitro Duarte Gomes (Miguel Nunes/ASF)

«É isto e apenas isto que as leis de jogo referem em relação aos capitães de equipa. Já as normas e instruções para árbitros — documento complementar que também regula a sua tarefa — vão um pouco mais além, não em relação ao seu papel em si, mas em questões mais operacionais: a indicação na ficha de jogo, a eventual substituição por quem for designado como sub-capitão, o abandono temporário da partida, etc. 

Na prática, o que se espera é que o capitão seja o representante máximo da equipa junto da equipa de arbitragem. Como já se percebeu, isso não lhe confere direitos acrescidos mas a responsabilidade de os liderar dentro das quatro linhas. Sob o ponto de vista do árbitro, de quem tem por missão dirigir jogos, os capitães de equipa têm que ser a referência maior de ética, respeito e saber estar. Espera-se que sejam a voz sensata e apaziguadora, que defende os interesses dos seus de forma firme mas respeitosa. Um capitão é alguém que mereceu a confiança dos seus pares e/ou técnicos para os comandar dentro do terreno de jogo. Isso confere-lhe responsabilidades acrescidas. 

Obriga-o a ser educado e a ter capacidade de encaixe. 

Obriga-o a ser um mediador, um diplomata. As suas características pessoais devem ser reconhecidas por todos: deve ser discreto e eficaz. Deve ser sempre o primeiro a sanar conflitos, nunca aquele que os inicia. Deve acalmar os jogadores mais alterados e evitar que criem atos de indisciplina. Um capitão nunca fala em seu nome, mas em nome dos seus. E um verdadeiro capitão nunca se pode esquecer que é visto pelos colegas como um exemplo de dignidade e caráter, um profissional comprometido, altruísta, resiliente. Uma referência como homem, como jogador e pessoa. Felizmente há em Portugal muitos jogadores com esse perfil.»

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