ENTREVISTA A BOLA «Florentino devia escolher Angola, está a queimar o tempo à espera de Portugal...»
André Macanga, um dos históricos capitães dos Palancas Negras, revela que conselhos dá a Florentino, médio do Benfica, sobre convite da federação angolana. Excerto de uma grande entrevista a A BOLA.
André Macanga construiu uma carreira sólida em Portugal, em clubes como Alverca, Académica, Salgueiros ou Boavista, tendo passado pelo FC Porto. É também uma das figuras em destaque na história da seleção de An gola, um capitão com história. Hoje é treinador e está a fazer formação em Portugal, uma espécie de segunda pátria do ex-jogador. De visita a A BOLA, falou muito dos Palancas.
- Quão orgulho sente por ter sido capitão da seleção de Angola?
- Quando chegamos a uma seleção é um orgulho. É preciso trabalhar bastante. É o ponto mais alto de uma carreira. Houve uma fase em que ainda duvidei se poderia representar a seleção angolana ou portuguesa. Chegaram a dar-me indicações de que após o processo de nacionalização poderia ter esperanças de representar a seleção de Portugal. Hoje, olhando para trás, começo a ver que fiz a escolha certa para representar o meu pais, Angola.
- Na mesma situação estará agora Florentino, jogador do Benfica. Tanto pode jogar por Portugal como por Angola. Que conselho lhe daria?
- Primeiro, digo-lhe que gostava de o ver a jogar por Angola. Seria um jogador que poderia acrescentar algo mais à nossa seleção. Hoje, sem margem de erro, eu posso dizer que temos uma seleção que está coesa, está compacta, tem os seus objetivos para alcançar. Jogo após jogo, a nossa seleção está muito forte. E isso deveria ser incentivo para Florentino. Se, eventualmente, quiser projetar ainda mais o futebol que está a apresentar no Benfica, acho que devia escolher os Palancas. A seleção portuguesa tem muitos jogadores para aquela posição. Eu, André Macanga, não estou a ver o Florentino, neste momento, a jogar de caras numa seleção portuguesa. E eu penso que ele está a queimar o seu tempo no sentido de ficar à espera da seleção portuguesa quando tem uma seleção, cada vez mais forte que lhe abriu as portas, o quer acolher de braços abertos e onde pode ter um papel fundamental.
- Como é que estás a ver este momento dos Palancas? O a no de 2024 foi um ano de recordes… Na CAN, mas não só…
- Este momento resulta também do saber esperar. No início do selecionador Pedro Gonçalves as coisas não começaram logo a correr bem e ainda bem que Federação não se precipitou. Temos de dar tempo para que as coisas possam acontecer com naturalidade. Eu fui sempre conversando com o Pedro Gonçalves. Fui transmitindo algumas informações daquilo que é a seleção. Fui lhe dizendo que é preciso ter tempo. Conseguir agregar os mais antigos com os mais novos. Não ter pressa. Hoje, felizmente, as coisas têm acontecido com naturalidade.
- No CAN de Marrocos, é possível fazer história e ultrapassar a barreira dos quartos de final?
- E possível, desde que haja apoios. Desde que se planifique e se trabalhe antecipando as situações. Desde que todos falem a mesma língua, que é o futebol.
- O André é um dos 23 jogadores da história do futebol angolano que jogou um Mundial. Que memórias guarda dessa experiência única?
- Nós tínhamos um excelente grupo. Tínhamos um líder, que era o selecionador Oliveira Gonçalves. Depois desse líder, nós tínhamos uma equipa. E depois, houve sempre muita conversa entre nós. Começámos a sonhar que íamos conseguir a qualificação quando fomos empatar à Nigéria. No jogo decisivo, em Kigali, com o Ruanda, conseguimos manter a calma, sem ansiedade, e não nos sai da cabeça o lance do golo do apuramento… O Zé Kalanga a fazer aquelas diabruras que tão bem fazia, o cruzamento com selo de golo e o Akwá a faturar de cabeça… Foi a loucura.
- Chegou o Mundial da Alemanha e a estreia com Portugal…
- Portugal teve de suar muito para vencer 1-0. Uma seleção que tem alguns dos melhores jogadores do Mundo. E até chegou às meias finais nesse Mundial. Para Angola seguiram-se dois empates… Qualquer dos jogos poderia ter caído para o nosso lado… Caímos na fase de grupos, mas demos boa imagem de Angola.
- Os 20 anos desse grande feito cumprem-se em 2026. Que melhor cerimónia de evocação do que nova presença num Mundial? Está com fé?
- Os nossos bravos jogadores têm demonstrado que estão unidos. A equipa está toda compenetrada para conseguir resultados positivos. Tenho a certeza absoluta que, neste momento, os nossos jogadores estão confiantes. Muitos deles estão a jogar também em bons clubes europeus e não só. E isso está a fazer com que também traga mais competitividade. E temos um bom selecionador, o Pedro Gonçalves.
- O que aconteceu ao Pedro Mantorras, devido a grave lesão, é ou não um dos maiores crimes que aconteceu no futebol?
- Eu acho que sim. Pedro Mantorras, se não tivesse o azar da lesão, seria um dos melhores jogadores a atuar num dos grandes clubes europeus. Isso, sem dúvida. Conheci o Mantorras no Alverca e o então presidente, Filipe Vieira, encarregou-me de cuidar dele. Dei-lhe muitos conselhos, estava destinado a ser dos melhores do mundo, mas depois aquela lesão… Uma pena…
Orgulho por ter sido contratado pelo FC Porto, pena não ter jogado
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André Macanga construiu uma carreira sólida. Em Portugal, fez a formação no Arrifanense, passou por Vilanovense, Salgueiros, Alverca, V, Guimarães, Académica e Boavista. «Joguei a titular em todos os clubes, à exceção de um», conta. Refer-se ao FC Porto, clube pelo qual assinoiu em 2000, acabando por ser emprestado. «O treinador era Fernando Santos. E O FC Porto não só tinha uma excelente equipa, como na altura havia a limitação de estrangeiros e eu contava como angolano. Mas foi um orgulho ter chegado lá, pena não ter jogado como queria», comentou. Macanga jogou ainda no Gaziantepspor da Turquia, mais sete anos no Kuwait e um no Catar. Deixou de jogar em 2013. A carreira de treinador de André Macanha começou em 2013, como adjunto da Seleção de Angola. Seguiu-se Libolo, de Angola, e Desportivo da Huíla. Agora treina escolinhas do Águias de Canarate, nos arredores de Lisboa, no âmbito do estágio do curso UEFA C que está a tirar em Portugal.
Mesmo lesionado, Manuel José convocou Macanga para CAN-2010
Macanga seria uma das figuras de Angola na Taça das Nações Africanas de 2010, que o pais organizou. Mas lesionou-se e foi baixa para a competição. Ainda assim, Manuel José, o então selecionador dos Palancas, decidiu convoca-lo. Não para a lista dos 23 inscritos, mas para integrar a comitiva. Esteve concentrado, enquanto os companheiros treinavam, Macanga fazia tratamento, mas tudo o mais era como se mais um jogador de tratasse. Razão? Ser a voz da experiência e de motivação para todos.
Impagável Cândido Costa
André Macanga e Cândido Costa cruzaram-se no Salgueiros e foram juntos para o FC Porto, embora o angolano para ser emprestado. Mas ficou uma amizade entre os dois. «O que hoje todos vêm em termos de comunicação e contar histórias, o Cândido já era assim quando era novo… Muito engraçado… Gosto muito dele», comenta André Macanga.
Foi poupado, investiu, agora é.. livre
André Macanga sempre foi muito ciente das responsabilidade e conseguiu amealhar bom dinheiro em Portugal e, essencialmente, médio oriente. «Investi muito, hoje tenho esses investimentos, em especial imobiliário, a dar um rendimento fixo. Tive juízo e agora não tenho de andar a pedir batatinhas a alguns dirigentes. Ser financeiramente independente torna-me livre em tudo o resto. Só obedeço à minhas consciência» disse.
O Florentino ainda não percebeu que não o querem na selecção portuguesa. Quando perceber, nós é que não o vamos querer nos Palancas Negras, como aconteceu com o Pedro Emanuel que sempre nos recusou.