Retirada da Camisola a Grande Homenagem no Desporto (artigo de Eduardo Monteiro, 85)

Espaço Universidade Retirada da Camisola a Grande Homenagem no Desporto (artigo de Eduardo Monteiro, 85)

ESPAÇO UNIVERSIDADE30.12.189923:23

A ORIGEM HISTÓRICA DA RETIRADA DA CAMISOLA

A retirada da camisola no desporto profissional norte americano teve a sua origem na National Hockey League (NHL), liga profissional norte americana de Hóquei no Gelo. Em 1933, durante um jogo disputado entre as equipas dos Boston Bruins e dos Maple Leafs de Toronto, no antigo e famoso  pavilhão desportivo denominado “Boston Garden”, o jogador Irvine Bailey, uma das estrelas da Liga, mais conhecido por “Ace Bailey”, da equipa canadiana, sofreu um forte encontrão do jogador Eddie Shore da formação dos Bruins (mais pesado 30 Kg) que lhe causou fractura do crâneo e derrame cerebral. Duas intervenções cirúrgicas salvaram-lhe a vida, mas nunca mais conseguiu jogar hóquei no gelo. Este infeliz acidente, teve um grande impacto na comunicação social norte americana. Assim, no ano seguinte, a equipa dos Maple Leafs organizou em Toronto, um jogo de homenagem ao atleta, angariação de fundos para a sua família e procedeu à retirada da sua camisola (número 6), a primeira a ser retirada no desporto profissional norte americano. O encontro foi efectuado entre a equipa canadiana e uma equipa de “All Stars” da National Hockey League. Ao longo da história do desporto profissional norte americano a equipa que mais camisolas retirou (22) foi a dos Boston Celtics (NBA). Em segundo lugar surge a equipa dos Canadiens (18) da Liga de Hóquei no Gelo (NHL), a mais antiga equipa profissional norte americana, com 24 títulos conquistados. Depois aparece a formação dos Yankees (15 camisolas) da Liga de Basebol (MLB) e os Bears de Chicago (14 camisolas) da liga de futebol americamo (NFL).

A PRIMEIRA CAMISOLA RETIRADA NA NBA

Na National Basketball Association (NBA), a primeira camisola retirada (número 7), aconteceu com Billy “A Bala” Gabor (1954), jogador dos Nationals de Syracuse que, mais tarde, deram origem aos Philadelphia 76ers. As principais qualidades de  “A Bala” eram visíveis em todos os encontros: a alta  velocidade que imprimia ao jogo, a defesa agressiva em todo o campo e a capacidade de sofrimento, que fez com que tivesse jogado imensas vezes lesionado. Durante a 2ª guerra mundial foi piloto de aviões bombardeiros. Após a guerra, regressou à NBA, tendo sido o primeiro basquetebolista profissional a jogar com uns óculos de  proteção após uma lesão ocular. Um verdadeiro herói nacional.

EQUIPAS QUE MAIS CAMISOLAS RETIRARAM

Na National Basketball Association (NBA), a equipa que mais camisolas retirou (22), foram os Boston Celtics. Os números das camisolas  pendurados no tecto do novo pavilhão “TD Garden” na cidade de Boston, pertenceram aos consagrados atletas Bob Cousy, Bill Russel, Larry Bird, Kevin McHale, Kevin Garnett, entre outros,  que conquistaram mais títulos da NBA. Para além das camisolas dos jogadores, foram retiradas (camisola 1) em homenagem a Walter Brown (fundador dos Celtics e criador da NBA) e (camisola 2) a Red Auerbach ( treinador e director geral) que, em 29 anos de carreira, venceu 9 campeonatos como treinador e 7 como executivo. Também, foram retiradas as camisolas (35) do jogador Reggie Lewis, que faleceu de ataque cardíaco durante um jogo e a camisola (22) de Ed Macauley, que foi transferido para a equipa de St. Louis, para dar entrada a Bill Russel, que se tornaria no mais consagrado atleta da história dos Boston Celtics e da NBA. A segunda equipa da NBA que mais títulos conquistou foram os Los Angeles Lakers, que ao longo dos anos, homenagearam 10 dos seus atletas com a retirada das respectivas camisolas. Por ordem cronológica temos George Mikan, (camisola 99) o primeiro gigante e grande estrela da NBA. De seguida surge Elgin Baylor (22), Wilt Chamberlain (13), Jerry West (44) e Gail Goodrich (25), grandes estrelas dos anos 60 e início da década de 70. Depois, aparecem Jamal Wilkes (52), Magic Johnson (32), Abdul-Jabbar (33) e James Worthy (42), campeões nos anos 80 e grandes intérpretes do (Showtime). A dupla Kobe Bryant (camisolas 8 e 24) e Shaquille O´Neal (34) são os novos campeões na primeira década deste século.

SITUAÇÕES DIVERSAS DE HOMENAGEM

A NBA foi sempre uma liga profissional inovadora e, quando se trata de prestar homenagem a alguém que deu largo contributo  na valorização do basquetebol profissional, actua de imediato. A equipa dos Atlanta Hawks retiraram a camisola (17) em homenagem a Ted Turner fundador da CNN e proprietário da equipa entre 1977 e 2004. Inicialmente a CNN estava sintonizada no canal 17 na televisão por cabo. A equipa dos Denver Nuggets tem uma bandeira pendurada com o número (432) que corresponde ao número de jogos orientados pelo treinador Doug Moe, um conceituado jogador e treinador da NBA. Shaquille O´Neal tem duas camisolas retiradas, a camisola (34) pelos Los Angeles Lakers e a camisola (32) pelos Miami Heat; Oscar Robertson também tem duas camisolas retiradas, a camisola (44) pelos Sacramento Kings e a camisola (1) pelos Milwaukee Bucks; Pete Maravich tem 3 camisolas retiradas, a camisola (44) pelos Atlanta Hawks, e duas camisolas ( número 7)  uma pelos New Orleans Pelicans e outra pelos Utah Jazz; os Miami Heat retiraram a camisola (23) de Michael Jordan que jogou nos Chicago Bulls; Wilt Chamberlain, o maior recordista da NBA, tem 3 camisolas (número 13) retiradas nas equipas em que jogou, Warriors, Sixers e Lakers. Bill Russel, foi o jogador mais emblemático da história da NBA e que mais títulos conquistou (11),  sempre em representação da equipa dos Boston Celtics. Após o seu falecimento (31 Julho de 2022) a NBA decidiu, por unanimidade, que a camisola (6) fosse retirada em todas as 30 equipas. No entanto, os jogadores que já utilizavam a camisola (6) podem continuar a fazê-lo.

JOGADORES EUROPEUS COM CAMISOLAS RETIRADAS

Ao longo da história da NBA, são muito poucos os jogadores europeus que tenham merecido esta distinção. O primeiro europeu a receber esta homenagem foi o croata Drazen Petrovic, camisola (3), vítima de um acidente automóvel na Alemanha, então jogador da equipa dos New Jersey Nets. Posteriormente, os jogadores sérvios Vlade Divac (21) e Peja Stojakovic (16) viram as suas camisolas serem retiradas pelos Sacramento Kings. O lituano Zidrunas Ilgauskas, camisola (11), foi retirada pelos Cleveland Cavaliers. Os San Antonio Spurs retiraram a camisola (9) ao francês Tony Parker e o alemão Dirk Nowitzki viu a sua camisola (41) ser pendurada no Dallas Mavericks Arena.

PAU GASOL PRIMEIRO  ESPANHOL COM A CAMISOLA RETIRADA

No dia 8 de Março de 2023, no “Crypto.com Arena” da cidade de Los Angeles (California), a equipa dos Lakers retirou a camisola (16), utilizada pelo jogador espanhol. A actual proprietária dos Los Angeles Lakers, Jeanie Buss, justificou a homenagem dizendo que a chegada de Pau Gasol  provocou um grande impacto na equipa num período em que os resultados eram fracos e alterou o nosso destino por completo. A sua relação com Kobe Bryant, dentro e fora do campo, alterou totalmente o comportamento da equipa. Nessa altura, a dupla Pau Gasol-Kobe Bryant, apoiada pela enorme comunidade hispânica de Los Angeles, conduziu os Lakers a 3 finais da NBA, tendo sido campeões em duas delas. Não nos esqueçamos que Pau Gasol participou em (6) NBA All Star Games (2006, 2009, 2010, 2014, 2015 e 2016). Nas competições internacionais, em representação da seleção de Espanha, foi vencedor dos campeonatos  europeus efectuados na Polónia-2009, Lituânia-2011 e França-2015. Nos Jogos Olímpicos foi medalha de prata em Pequim-2008 e Londres-2012 e medalha de bronze no Rio Janeiro-2016. Conquistou o título mundial no Japão (Tóquio-2006). É o primeiro jogador espanhol e sétimo  europeu a receber esta homenagem. Pau Gasol, ficará para sempre ligado às grandes estrelas que fazem parte da história do basquetebol mundial e da NBA.

ATRIBUIÇÃO DA “ÁGUIA DO BENFICA” A JÚLIO CAMPOS E RETIRADA DAS CAMISOLAS A CARLOS LISBOA E HENRIQUE VIEIRA

No Sport Lisboa e Benfica, homenagear os desportistas que contribuíram para a valorização e prestígio do Clube faz parte do ADN da própria instituição. Em 1972, colaborei na festa de homenagem a um grande atleta do Benfica, Júlio Campos, jogador internacional e capitão da equipa de basquetebol (8 títulos nacionais e 9 Taças de Portugal). Naquele tempo era tradicional a atribuição ao desportista homenageado a “Águia do Benfica” o que sucedeu com  Júlio Campos. A complicada tarefa que me foi atribuída foi a de orientar  a Seleção “All Star”, constituída pelos melhores jogadores nacionais e estrangeiros que actuavam em Portugal (Kit Jones, Dale Dover, Jim Jones) que defrontou a equipa senior do Benfica: Júlio Campos, José Alberto, Joaquim Carlos, Artur Coelho, Armando Simões, Luis Esteves, Abel Nascimento, Jay Griffin, Armindo Teixeira, Alberto Arouca e o reforço  Mahlon Sanders, que actuava no Benfica de Lourenço Marques. Ainda me recordo do lançamento de longa distância do Armando Simões, aquando do apito final, que deu a vitória ao Benfica.

Em 6 de Dezembro de 2014, foi introduzido no âmbito das homenagens, a retirada da camisola como é usual no desporto norte americano. Aconteceu com o consagrado jogador e treinador Carlos Lisboa com a camisola número 7. Tive a oportunidade de trabalhar inúmeras vezes com o Carlos nas seleções nacionais em competições europeias e na digressão aos USA, pelo que conheço perfeitamente as suas excelentes qualidades técnico-desportivas e a sua total entrega ao jogo em benefício do colectivo. Um atleta extraordinário com provas dadas nas mais diversas competições nacionais e internacionais. Posteriormente, assumiu as funções de treinador tendo alcançado resultados significativos na história do basquetebol do SLBenfica (4 Campeonatos Nacionais, 4 Taças de Portugal, 5 Supertaças, 4 Taças Hugo dos Santos e 4 Troféus António Pratas). Uma carreira desportiva para recordar.

Entretanto, passados quase 20 anos, a actual Direção liderada por Rui Costa entendeu, e muito bem, prestar uma merecida e justa homenagem ao Henrique Vieira, uma grande referência do SLB e do basquetebol nacional, retirando a camisola que envergou, a número 5. Henrique Vieira foi um apaixonado pelo basquetebol como demonstrou ao longo do seu percurso como jogador e carreira profissional de treinador. Nascido em Quelimane (Moçambique), terra de excelentes praticantes de basquetebol, o Henrique Vieira não fugiu à regra. Ele e o Rui Miranda fizeram a sua iniciação ao basquetebol no Clube Real Sociedade na cidade de Lourenço Marques (actual Maputo). Também jogou no Sporting da capital moçambicana, por onde passaram alguns dos melhores jogadores portugueses; Mário Albuquerque, Nelson Serra, Rui Pinheiro, entre muitos outros. Ainda muito jovem, veio viver para o continente europeu e continuou a jogar. Primeiro em Coimbra (AAC), depois no Ginásio Figueirense, onde actuavam os internacionais Eustácio Dias, Samuel Carvalho e António Almeida e, mais tarde, no Atlético Clube de Portugal. Quando ingressou no Benfica as suas qualidades técnico desportivas evoluíram ao ponto de se tornar um jogador fundamental da equipa e da seleção nacional. Os títulos alcançados naquele período pelo SLB falam por si. Quando deixou de jogar enveredou pela carreira de treinador tendo orientado as equipas do Atlético, Estoril Praia, Oliveirense, Ovarense e finalmente Benfica, com o qual conquistou os campeonatos nacionais nas épocas de 2008/09 e 2009/10 e as Supertaças de 2009/10 e 2010/11. Uma vida dedicada ao basquetebol.

Até sempre Amigo Henrique Vieira.