Entrevista «Divertíamo-nos muito, chamavam-nos os brasileiros da Europa»
Ricardo Sá Pinto marcou o primeiro golo de Portugal no Euro 1996. Em entrevista a A BOLA, o antigo avançado conta como foi jogar pela seleção, como esteve próximo do Real Madrid e como se recorda de Schmeichel na baliza dinamarquesa
Venha comigo até Inglaterra 96. Pela primeira vez, 16 equipas jogam a fase final de um Campeonato da Europa. Portugal é treinado por António Oliveira. Chegou aos quartos de final, foi eliminado pela Chéquia. Sonhos, muitos sonhos, relatados na primeira pessoa por Ricardo Sá Pinto. Foi titular nos quatro jogos de Portugal, nessa Inglaterra 96, com a camisola 9 da Seleção das Quinas vestida, e recebeu-nos na sala de troféus que tem em casa.
Neste maravilhoso espaço de recordações, qual é melhor recordação que tens desse Euro 96?
É o primeiro jogo da fase de grupos e que é a minha estreia num Europeu, frente à Dinamarca. Nós estávamos a perder e eu marquei o golo do empate. Fazer o golo do empate, numa Dinamarca com os irmãos Laudrup, o Michael e o Brian, com o Peter, o monstro Peter [Schmeichel] que na altura nem eu sonhava que ele iria jogar comigo mais tarde no Sporting. Lembro-me perfeitamente que aquele golo para mim foi algo inesquecível, pela importância que teve, por ser o primeiro jogo, por dar o empate a Portugal. É muito importante nestas competições começar bem, começar com uma vitória, e nós sabíamos. Foi importante aquele primeiro resultado. Tínhamos uma geração fantástica, criámos muitas expectativas. Praticávamos um futebol muito bonito, foi pena realmente termos perdido, inesperadamente com a República Checa, porque não merecíamos. Mas aconteceu aquele golo muito bom do Poborsky, que nos surpreendeu.
Tens este espaço cheio de camisolas. Esta camisola 9 autografada pelos jogadores daquela Seleção de 96 que contigo sonhou em Inglaterra. Esta camisola, com o 9 nas costas, foi desse jogo com a Dinamarca em que marcaste o golo?
Não consigo precisar, mas com certeza que foi desse ou de outro (Risos) Nós tínhamos direito a estas camisolas no final do jogo. Houve umas que eu troquei com outros jogadores e tenho-as guardadas, mas esta reservei-a com a assinatura de todos os meus colegas. É sem dúvida uma recordação inesquecível. Tínhamos uma geração muito boa, de grandes jogadores. Éramos um grupo muito bom, muito unido e amigo. A nossa geração criou uma afinidade muito grande.
E jogavam quase todos em Portugal. Só cinco jogadores jogavam no estrangeiro: Figo no Barcelona, Rui Costa na Fiorentina, Paulo Sousa na Juventus e Cadete no Celtic.
Sim, havia só alguns que jogavam fora e eu neste ano acabei por ir para a Real Sociedad. Mas, é verdade, a maior parte de nós jogava em Portugal. Foi a nossa geração que começou a abrir portas para o jogador português começar a ser visto com outros olhos no estrangeiro. E nomeadamente o Figo foi o primeiro.
Que Seleção era esta, de 96, que nos fez a todos sonhar?
Era uma Seleção de jovens jogadores com muito talento, com uma grande união entre todos, com um grande espírito de equipa, que se conhecia há muitos anos, desde jovens da chamada geração de ouro, e muito ambiciosa. Era uma Seleção que acreditava muito nela própria e que queria muito ganhar. Divertíamos muito a jogar futebol. Divertíamos mesmo muito a jogar futebol. Nós na altura, não sei se tu te lembras, mas nós nem jogávamos praticamente com avançado. Era eu e o João [Vieira Pinto] na frente. Chamavam-nos os brasileiros da Europa, porque jogávamos um futebol de posse, apoiado, curto, bonito, rendilhado, como se diz muitas vezes na televisão. Divertíamo-nos muito a jogar. Claro, com responsabilidade, mas tínhamos esta alegria. Hoje, em dia, o futebol é cada vez é mais tático, mais exigente, e mais estratégico, mas naquela altura ainda não tínhamos chegado tão longe.
Até porque tu jogavas com 9, mas muitas vezes também foste 10. E hoje já nem se joga quase com 10.
Sim, sim. O próprio futebol é diferente. Há uns que jogam, outros que não jogam. As dinâmicas das equipas vão sendo alteradas. Hoje o futebol está a evoluir a uma velocidade louca. Cada vez mais o lado estratégico faz a diferença. Cada vez se conhecem melhor os adversários. Mas sim, eu podia jogar nos corredores, como aula, podia jogar como segundo avançado, como 10. Nunca fui aquele típico 9 de área, Não era a minha característica, mas na Seleção cheguei a jogar muitas vezes como 9.
«Lembro-me de ir cabecear e ver o Schmeichel, se ele já era grande…»
Vamos então só recordar esse primeiro jogo com a Dinamarca. Portugal estava a perder desde os 22 minutos com o golo do Brian Laudrup. Tu empatas aos 53. Lembras-te como é que foi esse jogo?
Lembro perfeitamente. Muitas vezes o aspeto do jogador que joga a alto nível não é só o aspeto técnico, é também a leitura do jogo, da perceção, do timing de atacar a bola, de procurar aquele espaço. E, eu tive a perceção na altura, quando o Folha ia cruzar, escondi-me atrás do lateral, e vi que ele não me viu. E, quando eu arrancasse, e ele reagisse, já era tarde. Eu fazia muito isso, escondia-me e depois ou ia por dentro ou por fora na altura certa. E com o lateral foi a mesma coisa. Quando eu arranco, ele quis tentar parar, mas eu percebi que o Folha ia cruzar e foi para aquela zona. O momento de cabecear foi incrível porque lembro-me perfeitamente de olhar para a baliza e ver o Peter, o Schmeichel, com as mãos abertas. Se ele já era grande, por ser alto e entroncado, imagina vê-lo de braços abertos. Ele impunha um grande respeito. Agora, quando abria os braços, não se conseguia ver onde é que se podia pôr a bola. Lembro-me de pensar que tinha de rematar com muita força e convicção para baixo porque se fosse no ar, ele teria capacidade de defesa. Senti que tinha de ser uma cabeçada para o chão, para o canto, longe dele e tive essa felicidade. O Peter Schmeichel foi um símbolo na baliza e depois encontrei-o em 2000, quando voltei ao Sporting. Foi provavelmente o melhor guarda-redes que tive oportunidade de ver defender. Para mim continua a ser um dos melhores de sempre na história de todo o futebol. Sem dúvida um grande guarda-redes que tive a felicidade de ter como adversário e também como colega. Depois o Vítor Baía foi um grande guarda-redes que nós tivemos na Seleção, passou também no Barcelona e todos tínhamos muita confiança nele.
Nesse Euro 96, fizeste os quatro jogos de Portugal, fizeste um golo e também uma assistência. Lembras-te dessa assistência?
Lembro-me, foi para o João [Vieira Pinto]. À meia-volta, de bicicleta ao segundo poste e o João fez golo. Ganhámos 3-0 à Croácia. Nós fizemos bons resultados e boas exibições. Tudo o que não correu bem foi apenas o jogo da República Checa, em que eu saio ao intervalo e entra Domingos para o meu lugar. Estava ainda 0-0, não é
Sim, sofremos o golo do Poborsky aos 53 minutos.
Pois… Mas, o jogo estava controlado. Eles não tinham criado oportunidades e estavam na expectativa de tentar jogar no nosso erro. Nós, claramente, com mais bola. Apesar de eles terem aquela geração da República Checa, muito boa, desconhecida, mas que depois daquele Europeu tornou-se conhecida. O Poborsky era um deles. Nós conhecíamos os adversários, mas não havia nenhuma referência ainda na Europa que se pudesse dizer que faria a grande diferença. Mas eram um conjunto sólido, com bons jogadores e trabalhavam muito. Depois, aconteceu aquele golo de uma forma inesperada. Nunca mais conseguimos dar a volta, porque eles organizaram-se bem defensivamente, jogaram no nosso erro e depois foi difícil entrar lá. Enfim, foi uma pena. Perdemos uma grande oportunidade… Acho que no mínimo nós íamos conseguir ir ao pódio nesse Europeu. Merecíamos, mas o futebol é exatamente isto, nunca se sabe bem o que é que vai acontecer. Infelizmente não veio para o nosso lado. Ficámos em terceiro a seguir, no Euro 2000.
E também estiveste no Euro 2000, fizeste três jogos nesse Europeu. Que diferenças encontras entre 96 e 2000, o teu primeiro e o teu segundo Europeus na carreira?
2000 foi um Europeu se calhar mais difícil. Havia uma Inglaterra forte, uma Alemanha não tão forte naquela altura, havia ali uma mudança de geração, e nós ganhámos 3-0 a essa Alemanha. Uma Roménia também forte, com bons jogadores na altura, com Popescu e outros. Em 96 a Dinamarca tinha os Laudrup [Michael e Brian], tinha o Peter [Schemeichel, mas não era uma seleção de referência. A Croácia, tinha bons jogadores também. Prosinecki na altura bom, e Boban também. Em 96 a Croácia era uma boa seleção de jogadores, não era uma boa equipa. E depois tivemos uma Turquia, que não era muito forte no meu ponto de vista. Tinha o Hakan Sukur, o ponta de lança, mais um ou outro, mas não era uma seleção de referência. Enfim, por isto que te digo que em 2000 havia melhores seleções. A Inglaterra muito forte, com Beckham, Alan Shearer e por aí fora. É engraçado, porque nesse Euro 2000 eu ia jogar contra a Inglaterra e lesiono-me. Ainda bem, entre aspas, porque acabou por ser o Europeu do Nuno [Gomes] que fez um grande Euro e fiquei muito orgulhoso por ele. Mas senti-me muito bem, estava no melhor momento de forma da minha carreira e 24 ou 48 horas antes lesionei-me no joelho. Num treino o Humberto Coelho chamou-me num exercício para fazer número e eu que estava cheio de energia acabei por me lesionar. Uma estupidez. Fiz um estiramento do ligamento lateral interno. Normalmente se aquilo fosse bem feito eu tinha de me vir embora e dar lugar a outro. Mas, mesmo assim continuei, com a ajuda do departamento médico que foi excecional. Recorri a tudo o que era terapias e medicamentos para aguentar as dores.
«Estive muito perto de ir para o Real Madrid, mas a seleção seria sempre o ponto alto»
E ainda fizeste três jogos.
Ainda fiz três jogos com muitas limitações, mas muita garra.
Mas, para além dos adversários serem diferentes, a Seleção de Portugal em 96 era também diferente da de 2000.
Sim. Em 2000 entrou uma segunda geração, do Serginho [Conceição], do Nuno Gomes e outros. Começou ali a entrada de outros jovens jogadores na Seleção.
O que é essa história do orgulho de jogar com as quinas ao peito que vocês enquanto jogadores falam com tanto orgulho?
Para mim foi o ponto máximo da minha carreira enquanto jogador de futebol. Eu estive muito próximo de ir para o Real Madrid. Se tivesse ido continuaria a dizer que para mim o ponto alto da minha carreira seria jogar pela minha Seleção. É muito mais que um jogo. É algo que transcende o jogo. Representar a pátria, defender o nosso país num jogo de futebol passa um bocadinho o desporto. É um sentimento muito mais de pertença, de orgulho. Eu senti muito isso. Eu gosto muito do meu país e sempre fui um grande defensor. Muitas vezes perguntam-me porque é que não vou treinar uma seleção e o que digo é que isso iria custar-me muito. Eu até posso treinar uma seleção de outro país, num contexto diferente, mas contra o meu país eu não consigo treinar. Não sei porquê, não consigo treinar. Portanto, se algum dia eu for treinar uma seleção, e tiver de jogar contra Portugal, acho que não vou ter a capacidade de fazer esse jogo [Risos] Respeito quem o consegue fazer mas para mim é algo que transcende o desporto. Através do desporto defendemos o nosso país. Tinha como meta enquanto jogador de futebol defender as cores do meu país e defendi mais de 50 vezes. Foi um orgulho enorme.
É essa vivência por Portugal e esse orgulho de representar o país que faz toda essa união que vocês se gabam de ter durante a carreira de jogadores?
Sim, é um sentimento único. Só quem representa o país é que sabe o que é. Claro que temos o compromisso e a responsabilidade de jogar por um clube e dar o máximo, sendo profissional, mas nós chegamos onde chegamos por paixão. Quando se fala de dinheiro, o dinheiro é uma consequência que nos ajuda a ter um nível de vida melhor, porque não se consegue estar a jogar futebol a este nível e ter outro trabalho. É impossível. Mas, o que nos leva a jogar futebol é a paixão. Não há nada acima disso e, portanto, paixão primeiro pelo jogo e depois o orgulho enorme de poder representar a Seleção Nacional através do jogo pelo qual nós temos uma grande paixão. Esse sentimento é único.
Esse Inglaterra 96 teve 16 equipas pela primeira vez. Sentiste aquele apoio dos emigrantes que sempre se fala cada vez que há um jogo de Portugal?
Sim, muitos emigrantes em Inglaterra e muitos portugueses que foram de Portugal a esse Europeu para nos apoiar, durante as semanas nos treinos e nos jogos. Depois de 84, ainda não tinha havido uma geração que voltasse a ter a relevância que nós tivemos. Portugal voltou a uma fase final e houve ali um sentimento de grande orgulho de todos os portugueses de voltarmos a estar nestas competições mais importantes, neste caso o Europeu.
Doze anos depois. Vocês sentiram-se orgulhosamente apoiados por esse feito que conseguiram?
Claro, foi incrível. Esse feito para nós no início foi espetacular porque há 12 anos que não íamos, e a nossa geração sentiu isso. E depois passado quatro anos lá estivemos outra vez, e isso foi muito bom. O jogador de futebol a partir daí começou a ser visto com outros olhos e começou a ser um jogador a contratar pela Europa fora. A nossa geração ajudou que isso acontecesse. Hoje já é normal em qualquer país, mas antigamente não. Por exemplo, na minha geração subia um jogador dos juniores para a equipa sénior. Era muito difícil subir. A nossa geração foi uma geração que obrigou os clubes e os treinadores a olharem para os miúdos. E, sinto-me orgulhoso de fazer parte dessa geração também por isso.
«Chateei-me muitas vezes com amigos e rivais, mas sempre tive boa relação com todos»
Para quem não viu o Ricardo Sá Pinto jogador da Seleção com o 9 nas costas gostava que descrevessem que é que ele era.
Era um bocadinho aquilo que era no clube. Eu fui um jogador muito de equipa. Eu era um avançado, mas era um avançado com umas características especiais. Claro que tinha qualidade técnica, velocidade explosão, remate de cabeça e de pés. Tinha aqueles skills [habilidades] que um jogador tem de ter para chegar a um nível de seleção. Mas, tinha uma particularidade enorme: eu era muito dedicado ao jogo. Eu nunca desistia de um lance. Se eu perdia a bola, ia atrás do adversário. Se eu via um colega meu no chão, ia fazer a posição dele. Desgastava-me muito fisicamente na luta pela conquista novamente da bola, pela defesa da bola, da equipa e por nós podermos manter o resultado. Estava sempre a ler um bocadinho o jogo como é que eu podia pressionar o adversário e roubar-lhe a bola. Se eu perdesse a bola tinha de ser o primeiro a corrigir o meu erro. Sempre fui muito dedicado, mais dado à equipa do que a pensar naquilo que eu podia dar individualmente. Eu era muito um jogador de equipa e perdi muitas vezes o individual por me dedicar demasiado.
Essa tua garra nunca te impediu de ser amigo do outro, mesmo que eles sejam rivais nos clubes?
Nunca. Chateei-me muitas vezes nos treinos com os meus amigos, porque eu era muito exigente, primeiro comigo e depois com os outros, mas acabava o treino e as coisas estavam resolvidas. Às vezes excedia-me e no final pedia desculpa. Com adversários também me chateei muitas vezes, porque queria muito ganhar e às vezes excedemo-nos pois este é um mundo competitivo. Mas, sempre tive uma relação muito boa com 90 e tal por cento dos meus adversários. A posteriori sempre tive uma boa relação com toda a gente. Às vezes não nos conseguimos abstrair, e há coisas que também vão além dos limites e que é difícil de perdoar.
Arrumaste tudo o que era difícil de perdoar na tua vida?
Sim e não! Tudo o que eu acho que tinha de fazer fiz. Tudo o que acho que tinha de pôr o orgulho de parte, assumir as minhas responsabilidades fiz e estou de consciência tranquila. Sempre.
Humberto Coelho e António Oliveira dois selecionadores e dois europeus diferentes. E também dois homens diferentes?
Sim. Ambos bons treinadores, bons líderes. Um muito mais comunicativo, António Oliveira, e outro menos comunicativo e mais silencioso, mas observador. Ambos tinham boas características de liderança e conseguiram sempre manter os grupos focados e unidos.
Hoje quando vês o jogo da Seleção sentes saudades de estar lá dentro?
Claro, essas saudades serão sempre eternas. É uma pena alguém que tem talento para fazer alguma coisa ter um limite para desempenhar esse talento. Por exemplo um médico será médico toda a vida e poderá exercer até se reformar e outras profissões também. No caso do desporto é difícil enquanto jogador de futebol. A minha grande paixão era jogar o jogo e terminar de jogar futebol para mim foi muito difícil. Eu como tive seis operações ao joelho isso ajudou-me a começar a pensar no futuro. Por isso nas últimas comecei a pensar no que iria fazer pós-carreira de jogador. Licenciei-me, tirei um mestrado em Marketing e Gestão do Desporto. Quis ganhar novas ferramentas para no pós-futebol o Sá Pinto que iria arranjar um trabalho não o arranjasse porque foi o Sá Pinto. Gostava de ter oportunidades porque as criei.
Uma segunda vida?
Sim e eu tive a felicidade de viver uma segunda vida. eu costumo dizer às vezes em inglês I have the chance to live twice. É difícil descobrir uma segunda paixão dentro do próprio jogo. Eu gostava de continuar a fazer parte do jogo, que é a minha grande paixão, e criei ferramentas para isso. Fiz vários cursos em Direção Desportiva, fiz os cursos todos de treinador de futebol, tive experiências como adjunto na formação e criei uma nova paixão. Gostei daquilo que senti e, portanto, criei uma segunda paixão que é de ser treinador de futebol, o que é uma grande chatice porque a minha mulher não gosta nada (Risos). Sou muito feliz a fazer o que faço, mas exige muito mais do que ser jogador de futebol. Quando jogava preocupava-me somente comigo nas diversas áreas e a minha vida estava estável. Agora sou eu que tenho de gerir 25 ou 26 jogadores, mais departamento médico, departamento de scouting, departamento de comunicação. Temos de dominar várias áreas e gerir não sei quantas pessoas. Isto desgasta muito. Acho que o mais difícil na vida é gerir pessoas.
Quando se joga não se tem essa noção?
Não. Começa-se a ter mais essa ideia, mas o jogador de futebol é muito egoísta, só pensa nele. E quando o treinador não o mete a jogar arranja desculpas próprias da imaturidade da idade. Todos nós passamos por isso. Depois com a maturidade, ao longo dos anos, começas a ser mais velho e ter outras noções. Mas só se consegue perceber verdadeiramente quando se é treinador e se percebe realmente o quão difícil é gerir os egos, as ideias, as vontades de cada jogador. É um conjunto de situações que nos obriga diariamente a tomar decisões e a sermos avaliados, o que exige muito nós. Tenho um amigo meu que perguntava como é que eu podia ir para uma profissão onde sabia que ia ser despedido (Risos) Mas ainda bem que descobri esta segunda paixão dentro do jogo e felizmente o que eu gosto é treinar ao mais alto nível. Não sou um treinador para treinar os miúdos de 12, 13, 14 anos. Treinei os sub-19, já homens, e fomos campeões nacionais pelo Sporting, juntamente com o Abel, e isso era o mínimo que eu podia. É uma questão de competitividade e de exigência da minha parte. Se um dia não encontrar essa oportunidade de voltar a treinar sempre ao mais alto nível com certeza não irei ser feliz e eu preciso ser feliz. Tive a sorte de ter andado sempre a um bom nível e tenho tido bons resultados. Ainda este este ano ganhei a Liga do Chipre pelo Apoel. que já não ganhavam há muitos anos, E estou realizado.
És orgulhosamente treinador hoje, mas foste orgulhosamente internacional por Portugal?
Muito, muito, muito mesmo é algo que me irá acompanhar a vida toda. Foi um momento alto da minha carreira e foi mesmo um prazer enorme uma honra representar o meu país.