São cerca das 18 horas, ainda há pessoas que trabalham nos edifícios dos principais bancos da cidade, mas que não resistem à parada na rua, desde a praça em frente à ópera até à estação central de comboios. É um trajeto de um quilómetro a pé feito numa espécie de caixa de segurança que se assiste na deslocação das claques dos clubes nas horas que antecedem dérbis e clássicos, mas sem aquele ambiente de hostilidade e tensão. Os polícias de intervenção que servem de último contorno sorriem e têm os capacetes ao peito. Com os capuccinos na mão, administrativos e executivos descem à rua para assistir a um cortejo formado por mais de três mil pessoas, que cantam Portugal eu Sou até lhe doerem as gargantas. Aqui e ali ouve-se um petardo, mas as forças de segurança alemãs, que caminham lado a lado com polícias portugueses, apenas pedem para parar com o uso de artefactos pirotécnicos, numa mensagem em inglês no altifalante num tom muito tranquilo, quase professoral. Mas resulta: nunca mais se vai ouvir rebentamentos. Para trás ficara um arraial na Opernplatzfest, local aberto da cidade que convida à fusão de culturas. Nesta cidade vivem pessoas de 180 nacionalidades, mas no Euro são ainda mais. Asiáticos, sul-americanos, europeus de todo o tipo vão ouvindo clássicos da música popular portuguesa intervalados com atividades que já se viram nos outros jogos da Seleção em Gelsenkirschen, Dortmund e Leipzig: os saltos para imitar a altura máxima que Cristiano Ronaldo atinge (e que ninguém o consegue imitar, por muito que tente) ou as fotos com bonecos em tamanho real de Dalot ou João Cancelo. É_o arraial com selo da Federação Portuguesa de Futebol num registo saudável, nada comparado com eventos do género a que fomos assistindo no mesmo local, por exemplo, com adeptos alemães, ingleses ou dinamarqueses. É uma típica festa portuguesa, ainda que adaptada aos comes e bebes locais: a salsicha é a rainha, a cerveja bávara também assume o seu destaque, mas tudo fica bem quando a fome de bola e de convívio convergem. Chegados ao fim do percurso pedestre é hora da multidão invadir o metro de superfície. Um alemão vestido de fato executivo, provavelmente saído de um daqueles arranha-céus que ficaram para trás, prepara-se para apanhar o transporte rumo a casa e fica aturdido. «Isto é tudo nosso», grita-se em bom português.