Sporting-FC Porto: há Supertaças e clássicos que vêm por bem
Exposição de um novo FC Porto a um clássico pode ser precoce, mas dar-nos-á o real momento da equipa de Vítor Bruno, perante um adversário que mantém aparente solidez
Apesar de tantos exemplos de competitividade no passado, incluindo a recente conquista da Taça de Portugal, ainda que em superioridade numérica desde a meia-hora devido à expulsão de St. Juste, da resiliência já ser alelo constante do seu ADN mesmo com as naturais mutações em cada época, ninguém pode colocar o FC Porto como favorito para novo embate com o Sporting, agora em Aveiro, para a Supertaça. A pré-temporada correu sem sobressaltos, embora com um nível acessível de exigência nos vários exames, o que pode esconder problemas, mas, ao mesmo tempo, camuflar a equipa debaixo dessa desculpa e criar efeito surpresa para o adversário.
É um sprint, não uma maratona e tudo pode acontecer. O confronto dará ideias mais concretas do real estado do dragão, todavia ainda será cedo para embarcar em qualquer tipo de conclusão, dada a especificidade do momento.
O mercado, para já, nada trouxe a Vítor Bruno, e roubou-lhe ainda Pepe e Taremi. O adeus do iraniano era inevitável. Em final de contrato e com uma oferta bem superior de um campeão de uma Big 5, nada havia a fazer. Já o veterano, emocionalmente muito ligado à anterior direção e treinador principal, oferecia ainda cada vez menos garantias de presença na maior parte dos encontros, mesmo que as semanas do Euro 2024 tenham sublinhado o que, a espaços, ainda consegue entregar em campo.
Os particulares mostraram um futebol progressivo, em vez de excessivamente direto ou de passe longo e ataque às segundas bolas, e nos últimos testes acentuou-se também a capacidade de pressão no último terço. Há aí um falso-10 multifuncional, capaz de se juntar à teia montada, mas também de ligar diretamente com colegas mais rápidos e explosivos no assalto à baliza e de surgir ele próprio em momentos de finalização. Com Nico González nessa posição e ainda com as derivações de Iván Jaime para o miolo, forma-se um quadrado que muitas vezes poderá garantir superioridade numérica. O FC Porto aparentemente mantém a capacidade de ferir o rival e tapa as brechas que antes surgiram pelo corredor central, visíveis no embate com o Áustria Viena, por exemplo.
Será suficiente para Aveiro? Essa é a grande dúvida. Aparenta, contudo, ser alicerce sólido para o resto da época.
Perante os condicionalismos de mercado, que até apontavam para o reforço do setor com mais um argentino, Ezequiel Fernández, nome que encaixaria na ideia de ter Nico mais à frente, é Grujic quem vive nova vida no Dragão. Há que proteger uma defesa que estabilizou na dupla Zé Pedro-Otávio, porém mantém João Mário como um dos desequilibradores do ataque e tem na esquerda uma solução de recurso, embora com total confiança de Vítor Bruno, em Martim Fernandes.
O técnico libertou finalmente Gonçalo Borges dos rótulos de ser, primeiro, suplente para agitar o jogo e, segundo, extremo de linha, e o jovem retribuiu, ao tornar-se o avançado mais transversal, em termos de rendimento, a todo o defeso. Com João Mário por perto, quando está sobre a direita, é por aí que se desbrava o caminho mais reto para o golo, criando volume para as finalizações de Nico González ou Namaso, o ponta de lança em que Bruno confiará mais nesta altura.
Na esquerda, não havendo esquerdinos, a largura não é tão profunda. O ex-proscrito Iván Jaime ainda aparenta estar a habituar-se a vir da esquerda para o meio, ele que prefere ser o 10 que hoje em dia cada vez menos espaço encontra um pouco por todo o lado. Mesmo intermitente, terá ganho a corrida a Galeno, que talvez já só espere por notícias de Turim.
Do lado do Sporting, os processos estão mais maturados e o favoritismo é quase natural. Perdeu-se liderança (a de Coates), ganhou-se fiabilidade. Debast, Diomande e Inácio podem garantir, em teoria, uma construção mais limpa – em passe ou em transporte – do que acontecia na época passada e até um posicionamento mais adiantado no terreno, dado que há mais velocidade para defender a profundidade. Também os alas poderão projetar-se um pouco mais e a equipa aumentar a coesão no controlo dos encontros e até nos momentos de pressão alta e reação à perda, apesar de, paradoxalmente, jogadores como Trincão, Pedro Gonçalves e, sobretudo, Gyokeres beneficiarem da estratégia de atração dos leões das linhas contrárias para recuperar a bola e lançar ataques rápidos, muitas vezes letais. E há ainda Kovacevic, um guarda-redes que não se sente confortável em duelos longe da baliza.
A novidade Quenda, face à sua velocidade, capacidade técnica e de drible, ainda parece reforçar a resistência ao que os rivais FC Porto e Sporting têm afinado: a pressão alta. Com cinco unidades capazes de passar a bola de forma progressiva, transportá-la ou mantê-la, atraindo o pressing, até libertá-la no momento certo, os leões aumentam a capacidade para servir os homens da frente no contexto de que realmente gostam: correr para a baliza e marcar. Trincão está a ligar este reinício à forma e rendimento com que terminou a época passada, tal como Pedro Gonçalves e já se sabe que Gyokeres – se o assédio do exterior não aumentar e há um ou outro sinal que aponta para que isso aconteça – afinará rapidamente o que tem para afinar. Faltará alguma profundidade ainda, no lado extremo, como opção a Pote, e o tal ponta de lança, já que Paulinho já foi e Ioannidis, o mais desejado, não veio ainda. Rodrigo Ribeiro e Rafael Nel são jovens, têm talento, mas há risco quando não há continuidade no rendimento. E a amostra é curta.
Já na sala de máquinas, tudo pronto. Morita, Hjulmand, que terá que dialogar com os árbitros rapidamente em português por ser o único que o pode fazer, Bragança e Mateus Fernandes garantem soluções variadas. Sair por fora para ligar por dentro e sprintar, ou sair por fora para esticar na frente. Com variáveis. O caminho é visível para todos. Conseguirá Vítor Bruno fazer o que poucos têm conseguido nos últimos meses?