Simplesmente Aurélio...
Além do especial talento para a deteção de talentos, Aurélio Pereira nunca descurou o enquadramento familiar, e o desenvolvimento pessoal, como bom pedagogo que sempre foi...
A formação do Sporting não começou com Aurélio Pereira, nem acaba com o desaparecimento de Aurélio Pereira. Mas ninguém duvidará de que quando se fala em Sporting e em formação, o primeiro nome que nos ocorre é o de Aurélio Pereira. Porquê? Essencialmente porque associava duas características difíceis de encontrar na mesma pessoa: tinha uma especial vocação para detetar talentos, um ‘feeling’ apurado que lhe permitia ver com profundidade aquilo que o comum dos mortais apenas olhava superficialmente; e preocupava-se com a pessoa, com o jovem, neste caso, para além do jogador, procurava conhecer o enquadramento familiar e a forma de melhor enquadrar o novo atleta do Sporting, nas duas valências, de futebolista e de alguém que era apanhado num turbilhão de ilusões, numa altura essencial para a formação do caráter.
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Conheci Aurélio Pereira durante meio século, primeiro nos corredores de Alvalade, que sem ter cargo oficial no Sporting frequentava quando fui junior no clube, e depois, em múltiplos encontros, proporcionados pela amizade fraternal que me une há décadas ao irmão, Carlos Pereira, com quem partilhei balneário durante quatro anos no CF «Os Beleneneses». Provavelmente, a maior parte das pessoas que, com autoridade, se pronunciarão sobre Aurélio Pereira, irá fazê-lo circunscrevendo-se à importância histórica que teve no desenvolvimento do futebol em Portugal. Se me permitem, prefiro outra abordagem, a do homem sempre bem disposto, para quem cada circunstância era motivo de uma comparação jocosa, dono e senhor de um manancial de anedotas que estava sempre pronto a debitar, como se não houvesse amanhã. É essa imagem jovial, fresca e alegre, que guardo, neste momento de recolhimento, do Aurélio.
Porém, não quero terminar este testemunho sem deixar sem uma palavra aqueles que lhe fizeram a vida negra, num determinado período de conturbação no Sporting, e que muito contribuíram para que a sua saúde fosse abalada. Quando comparados com Aurélio Pereira, a História encarregar-se-á de colocá-los na nota de rodapé que merecem, pelas piores razões, aliás, enquanto que o capítulo dedicado à figura que acaba de nos deixar será escrito a letras de ouro, ou não fosse ele um garimpeiro de talentos.