Sem título!...

OPINIÃO12.11.202205:30

Fernando Santos só não é previsível para quem não o conhece. Acertar nos 26 da Seleção para o Mundial do Catar não era uma tarefa difícil

MAIS fácil que preencher o Totobola à segunda-feira, como era hábito dizer quando não havia jogos nesse dia, só mesmo acertar nos jogadores a convocar por  Fernando Santos para o Mundial do Catar, pese embora tratar-se de 26 prognósticos, ou seja, precisamente o dobro daquele concurso que já teve melhores dias.

Para aqueles que já se esqueceram que o Totobola ainda existe, recordo que este jogo da Santa Casa tem por objectivo acertar, relativamente aos 13 jogos de futebol que compõem o boletim a preencher, no que respeita ao resultado final - vitória do visitado, empate ou vitória do visitante. O famoso 1X2, que há muitos, muitos anos mesmo, que não jogo, e só por uma vez acertei na chave. E foram tantos os que acertaram que já nem me lembro quantos escudos (e não euros) recebi de prémio, recordando-me apenas que esse recebido não deu para a despesa.

Se tivesse havido agora concurso semelhante sobre a convocatória para a selecção nacional, muitos milhares, porventura milhões, teriam acertado no resultado, tal a sua previsibilidade. Fernando Santos só não é previsível para quem o não conhece de todo, característica aliás que é boa, como pode ser má. Os jogos de futebol em si são mais imprevisíveis, e, consequentemente, os seus resultados. Quando há um ou dois resultados que escapam à lógica, a tendência é para haver só um ou nenhum que acerta e, normalmente, ou não percebe, ou percebe pouco de futebol.

Olhando, de resto, para a convocatória, a única aposta que vale- ria a pena fazer, antes e depois, é quem sairia para entrar Rafa, que, diga-se de passagem, teve mais dignidade e carácter, do que aqueles que admitiam que, se ele recuasse e fizesse um telefonema, seria convocado. Felizmente, Rafa não fez o tal telefonema, assim não colocando a FPF e o seleccionador nacional em posição a raiar o ridículo.

Fernando Santos pode assim estar tranquilo para já, quanto à consensualidade dentro dos seus critérios e assim estará até existirem resultados. Não acontecerá o mesmo no caso de um qualquer resultado negativo, perante o qual serão criticadas não só as opções to- madas como a táctica seguida. É a vida!...
 

Fernando Santos durante o anúncio dos 26 convocados para representarem Portugal no Mundial. Sem jogadores do Sporting nos eleitos...


Eu não assisti à conferência de Imprensa dada por Fernando Santos e, portanto, não posso dizer se gostei ou não, se foi uma conferência de Imprensa na acepção verdadeira do conceito ou se foi apenas uma daquelas conferências que vão sendo cada vez mais habituais em que alguém fala, mas ninguém lhe pode fazer perguntas. Na minha opinião, esta prática é muito mais grave do que usar o velho lápis azul da censura. Na verdade, como hoje a comunicação é em directo, torna-se difícil cortar a resposta e, portanto, mais fácil é não deixar fazer a pergunta. A liberdade de expressão tem a ver com a pergunta e a resposta, mas há quem não queira perceber isto, porque a verdadeira liberdade de Imprensa é cada vez mais estreita.

Vi, pelo menos, num jornal da especialidade, comentá-la negativamente, porque Fernando Santos não deu explicações para as suas escolhas. Mas dar explicações para quê, se há tanta coincidência nas escolhas de Fernando Santos com as escolhas da opi- nião pública e da opinião publicada? Relativamente a esta, fez escolhas antes da convocatória, num exercício de pressão sobre o seleccionador, que não deixa de ser ridículo querer saber por que é que convocou um certo jogador. E todos sabemos a quem me estou a referir, pois não é preciso ler os jornais todos, bastando olhar para a primeira página. Acresce que as explicações de Fernando Santos não têm assim tanta importância num país onde ninguém explica nada e existe tanta coisa mais importante para explicar. E no futebol, então, há mesmo tanta coisa por explicar, mas também se não pede para explicar, porque isso não dá audiência. Em Portugal, em geral, e no futebol, em particular, evita-se o debate sobre o fundo das questões, ficando-se pela espuma dos acontecimentos, o ruído e a fofoca!...

A cultura da exigência vive-se lá fora, no estrangeiro, e os melhores portugueses vão lá para fora, para viverem nessa cultura de exigência e assim verem compensados materialmente os seus méritos, que são tão bons como os dos que lá vivem. Cá dentro nivela-se tudo por baixo e a exigência é coisa que não se exige. E o futebol caminha nessa via, sendo cada vez mais raro o debate sério, conseguindo-se falar horas a fio sobre a mesma coisa ou a mesma pessoa, sem qualquer profundidade, antes se abor- dando os temas sobre os aspectos mais sórdidos, «porque é disto que o meu povo gosta». Hoje, diria eu, é mesmo o dinheiro que comanda tudo, assim se condicionando a liberdade.

À mistura com a convocatória para o Mundial do Qatar que mereceu a aceitação generalizada da comunicação social, veio a indignação pelas declarações de Blatter, assumindo o erro, sem explicar a razão que o levou a cometer esse erro, e a carta infantil (de Infantino...) do Presidente da FIFA, dizendo que o futebol não pode ser um veículo de mensagens políticas. Pode e deve, e, seguramente, não é a FIFA que tem autoridade moral para o criticar, porque, nos tempos que correm, a política e o futebol cruzam-se muitas vezes no caminho, e num mau caminho - o da corrupção!

Mas, voltando à convocatória, há quem lamente a ausência de jogadores do Sporting nesta selecção da Federação Portuguesa de Futebol e outros, que, negando a evidência, acham que não há presença sportinguista na equipa que vai discutir o Mundial do Catar.

Contudo, acho que devíamos notar antes que, dos vinte e seis convocados, apenas cinco jogadores, de nacionalidade originária portuguesa e formados em Portugal jogam a Liga Portuguesa. Este número não dá que pensar?

Por outro lado, se é certo que o Sporting Clube de Portugal não tem jogadores da sua equipa na Selecção da FPF, tem dois na selecção do Uruguai ou da Federação do Uruguai - Coates e Ugarte, além de uma forte presença de jogadores que fizeram a sua formação em Alvalade. Não será a mesma quantidade que ganhou o Europeu em 2016 - dez na selecção portuguesa (e outro na selecção inglesa...) -, mas em todo o caso continua a ser um bom número: 7. Isto para não falar em jogadores que completaram a sua formação no Sporting ou se projectaram no Sporting: Matheus Nunes e Bruno Fer- nandes. Se isto não é presença leonina na selecção da FPF, sem qualquer pressão da comunicação social ou de outra origem, então não sei o que é preciso mais para se estar grato a um clube cuja formação muito tem contribuído para o prestigio do futebol português, desig- nadamente, com dois dos melhores jogadores do mundo, como Ronaldo e Figo. Eu sei que custa a engolir, e é por isso que eu falo em se- lecção da FPF,  para quem a selecção nacional também não é a selecção de Portugal!
 
Por isso não estou preocupado. O que me deixa preocupado e triste é que tantos jogadores sportinguistas da selecção joguem no estrangeiro e não no Sporting. Isso sim preocupa-me, entristece-me! E não me conformo!

E termino, por hoje, com uma justificação: quando no computador abrimos uma nova pasta ou um novo ficheiro, antes de lhe dar um nome, ele apresenta-se sempre «sem título». Foi o que resolvi fazer com a minha crónica desta semana - sem título!...