Por uma questão de estatuto
O único que tinha mesmo estatuto de insubstituível era Ronaldo. Mas esse Martínez sempre assumiu. Apesar de, como se viu, estar errado
Portugal foi eliminado do Europeu. A primeira conclusão a tirar é a de que Roberto Martínez não teve razão e a sua teoria estava manifestamente errada. Pode parecer brutal esta maneira tão nua e tão crua de analisar a presença portuguesa no Euro da Alemanha, mas a verdade é que não conheço outra mais concreta, mais real, mais objetiva.
Fernando Santos tinha toda a razão e todos os seus críticos, que o acusavam de ser demasiado defensivo e nada arriscar, não tinham. Porque a seleção de Fernando Santos, que não tinha a mesma constelação de estrelas desta seleção de Martínez, foi campeã da Europa e a de Martínez ficou-se pelos quartos de final. E Martínez também não teve razão nas substituições que fez e, sobretudo, nas substituições que não fez. Basta lembrar que meteu o João Félix de propósito para marcar penáltis e ele, de tantos escolhidos, foi o único que falhou.
A verdade é que analisar o futebol fica mais simples se apenas considerarmos a questão do resultado final. É o que a maioria dos comentadores faz e, assim, não corre riscos. Ninguém se lembra daquilo que um comentador encartado diz na televisão antes dos jogos. Pode não acertar uma, que a memória dos espectadores não se lembrará de nada. E por isso pode-se sempre brilhar depois dos jogos, dizendo o que está certo e o que está errado.
Em voga, nas críticas a esta seleção, sempre esteve a questão do estatuto. Martínez tinha jogadores intocáveis. Um deles era Bruno Fernandes. Pois bem. Se o médio do Man. United fosse mesmo intocável tinha continuado até ao fim do prolongamento e marcado o penálti que Félix desperdiçou.
Julgo, para ser sincero, que Martínez apenas sentia uma única obrigação nesta equipa de Portugal. Quando fazia o onze, partia do princípio de que era o Cristiano e mais dez. Podemos discordar, e eu discordo, de ter um jogador, mesmo que seja Cristiano, absolutamente intocável. Porém, Martínez desde a primeira hora que deixou muito claro que no capitão não se mexe.
É aceitável pensar que se Cristiano esteve longe de ser Cristiano em todos os jogos da primeira fase, dificilmente haveria de ressuscitar nos jogos decisivos e frente a seleções do top mundial, como a França. Era confiável nos penáltis, admite-se, mas para uma seleção que adotou como estratégia libertar Rafael Leão de funções mais defensivas, para o aproveitar melhor no contra ataque, tornava-se perigoso ter Cristiano Ronaldo como ponta de lança inamovível durante duas horas de um jogo de futebol ao mais alto nível competitivo. Certo, que tivemos Pepe e sem razões de queixa, mas central não é ponta de lança.
Perdemos, então, o nosso lugar no Euro por causa da teimosia em manter Cristiano Ronaldo, fizesse chuva ou sol, jogássemos com a famigerada Chéquia ou com a França? Não, necessariamente. Poderemos apenas conjeturar e especular que, a dada altura do impasse atacante, talvez Gonçalo Ramos ajudasse a criar mais espaços, fosse mais ativo a atacar a bola jogável nas linhas atrasadas francesas, pudesse, até, acertar um pontapé à Éder e dar mais uma alegria aos portugueses. Não se sabe, nem nunca se saberá.
Cada português terá a sua legítima opinião sobre esta Seleção Nacional. A minha opinião é a de que enquanto não tivermos uma equipa que jogue com altos índices de personalidade, enquanto não tivermos uma equipa capaz de impor o seu ADN competitivo, enquanto não tivermos uma equipa que entre em campo e se imponha ao adversário sem recorrer ao jogo do gato e do rato nunca seremos, de facto, um candidato.