A lei do fora-de-jogo dá inteligência ao futebol. FOTO A BOLA
A lei do fora-de-jogo dá inteligência ao futebol. FOTO A BOLA

Opinião Oiçam por favor o sr. Wenger sobre os fora de jogo

OPINIÃO09:20

A lei do fora de jogo dá inteligência ao futebol. Acabar com ela seria como voltar a comer sem talheres. Mas pode e deve ser melhorada, em nome do próprio espírito da lei

José Couceiro, um dos pensadores de futebol que tive a felicidade de conhecer, disse-me um dia que «a lei 11 do futebol é o que dá inteligência ao jogo». Felizmente não é o único a afirmá-lo, e só por manifesta má vontade ou desilusão alguém pode achar que o futebol poderia voltar aos tempos do chuto para a frente em busca do avançado que — peço desculpa pelo calão mas ainda não encontrei melhor definição — fica à mama à espera da bola para marcar.

É por causa da lei do fora de jogo que existem os 4x3x3 e os 4x4x2 e os 3x4x3 e todos os seus primos e afilhados. É por ela que os treinadores têm de organizar as suas equipas defensiva e ofensivamente. É por ela que se joga com defesas mais arriscadas, subidas, ou mais contidas, acantonadas perto da área. É por ela que os treinadores estudam os fundamentos do jogo e não podem ser apenas bons psicólogos com skills de liderança.

Acabar com o fora de jogo no futebol seria pior do que acabar com os talheres para comer e quase tão catastrófico como, sei lá, deixar de viver com eletricidade.

No espírito da lei, porém, existe algo que dispensa ser medido em centímetros. A ideia é que o jogador atacante tenha de ter pelo menos dois adversários entre ele a linha de baliza no momento do passe de um colega. E porquê? Para não tirar vantagem da tal mama de que falávamos há pouco e torna o futebol mais feio, como bem sabemos pelo exemplo de algumas gloriosas jornadas da nossa infância e juventude lá na rua.

Sejamos então realistas: que jogador tira vantagem por estar dois, três, 20 ou 30 centímetros adiantado em relação à ponta do pé do adversário? Nenhum. As intervenções do VAR nestes casos são legítimas (embora saibamos que já houve erros e possamos sempre achar complicado encontrar o frame exato para cada caso), mas além do anticlímax que representam, porque um golo será sempre um golo melhor quando acontece, expõem ao ridículo discussões de centímetros que nada têm a ver com espírito do jogo.

A ideia de Arsène Wenger, de considerar-se um jogador fora de jogo apenas quando este tiver todo o corpo adiantado em relação ao penúltimo adversário, parece a forma mais inteligente de resolver a questão. Obviamente, no limite, continuaremos a discutir centímetros, mas já temos margem para deixar o futebol fluir. E quanto a discussões de centímetros sabemos também que serão eternas, uns mais preocupados que outros com esses detalhes.