O túnel do Dragão, as rescisões e o ano 2024
Direito ao golo é o espaço de opinião quinzenal de João Caiado Guerreiro, jurista
No final do jogo com o Estrela da Amadora, que o FC Porto venceu por 2-0, houve altercações no túnel do Dragão. O presidente do FC Porto, André Villas Boas, protestou com o delegado ao jogo e com o árbitro. Terá mesmo dito, repetidamente, «saiam daqui que esta não é a p... da vossa casa» e/ou «ide para vossa casa». Consta que terá havido ainda uns encontrões e empurrões entre várias pessoas. Há razões para intervenção das autoridades? Comecemos pelas autoridades penais. Deve o Ministério Publico investigar? Não parece.
Explico: Villas Boas tem sempre tido um comportamento correto e os antecedentes também contam. Uma coisa é ofender e ameaçar repetidamente, outra é ter um momento menos feliz! Vejamos o art.º 181 do Código Penal: «Quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos (...) ou dirigindo-lhe palavras ofensivos da sua honra e consideração (...)». Ora Villas Boas não imputa nada a ninguém: limita-se a dizer que o Dragão não é a p... da casa do Estrela da Amadora. E a dizer-lhes, aliás na terceira pessoa «ide para vossa casa». Declarações desagradáveis, sem dúvida, com vernáculo à mistura, mas apenas isso. Como os alegados empurrões, aquela coisa muito máscula do por favor agarrem-me ou bato a todos, mas no fundo não quero fazer isso. É ou não verdade que o Ministério Publico e os tribunais têm coisas mais importantes onde gastar o dinheiro dos contribuintes?
Mas não haverá sanção disciplinar desportiva? Aqui a questão é diferente. As regras da UEFA e da FPF, no que respeita a Liga Portugal, são mais exigentes. E como é natural também o é o Conselho de Disciplina. Uma infração disciplinar é «(...) o facto voluntário (...) que viole os deveres gerais ou especiais previstos nos regulamentos desportivos (...)». Art.º 17 do Regulamento Disciplinar da Liga Portugal. Mais, o Art.º 19, nº 1, «as pessoas sujeitas (...) às normas previstas neste regulamento devem manter conduta em conformidade com os princípios desportivos da lealdade, probidade, verdade e retidão (...)». Ou seja, tudo indica que o Conselho de Disciplina não deverá ir além de uma palmada na mão. Aguardemos!
Termina o ano de 2024 e discutimos muitos assuntos durante estes 365 dias, mas há um que se destaca: a cláusula de rescisão. No caso de Amorim o Sporting recebeu pouco mais €10 M. O Vitória Sport Clube recebe agora €4 M por Rui Borges, novo treinador do Sporting! Sabemos que a cláusula de rescisão é hoje um elemento importante no financiamento dos clubes, mas estes parecem esquecer a Lei. Esta exige proporcionalidade entre o valor da cláusula de rescisão e o que ganha o jogador ou treinador. É proporcional a cláusula do Gyokeres de €100 M? António Silva, €100 M? Diogo Costa, €75 M? É importante entender, definitivamente: os jogadores são trabalhadores como todos nós e também têm direito a proteção. E uma cláusula de rescisão tão elevada protege-os?
O Direito ao Golo é do Sporting, campeão Nacional, com inteira justiça. Mas também os quatro treinadores portuguesas na Premier League — fantástico — e para o crescimento exponencial do futebol feminino em Portugal. E para nós, leitores do jornal que foi, é, e será sempre uma referência em Portugal, a A BOLA.