O rendimento puro e o pensamento futuro
Portugal venceu, em 2019, a edição inaugural da Liga das Nações (Foto: A BOLA)

O rendimento puro e o pensamento futuro

Livre e Direto é o espaço de opinião semanal de Rui Almeida, jornalista

Nos últimos tempos, adensa-se a discussão em torno dos calendários competitivos do futebol internacional, considerando a densidade de jogos e de torneios domésticos e fora de portas a que jogadores e equipas estão sujeitos.

É uma discussão pertinente, que assenta no mais básico valor em causa: a capacidade para disputar, por inteiro e de forma assertiva, todos os momentos de competição, todos os desafios impostos pela atividade profissional.

Haverá sempre os mais puritanos a defender que, em face das verbas envolvidas, dos proventos recolhidos, da fama e da carreira de curta duração, é absolutamente justificado o número de jogos por época à espera de um jogador de alto rendimento. É uma forma de ver a situação.

Mas há também que defender a perspetiva da qualidade do espetáculo, e não apenas a vertente comercial adstrita ao aumento exponencial de apresentações dos principais atletas e dos mais significativos emblemas. É outra forma de analisar a questão.

Vejamos o surgimento da Liga das Nações. Esta prova bienal para seleções nacionais, nascida da mente de um dirigente português, vem adensar o calendário, uma vez que as representações de cada país acumulam agora qualificações (e, e eventualmente, fases finais…) de Europeus e Mundiais, com a disputa desta competição.

Porém, é a mais democrática prova, o mais transversal momento para nivelar jogos e aumentar a imprevisibilidade entre equipas do mesmo quilate.

O sistema de divisões implementado com a UEFA Nations League vem comprovar que nem sempre o aumento de compromissos corresponde a um tiro no escuro e a uma disseminação de recursos. Pelo contrário, vem demonstrar que é possível criar uma prova competitiva, em que as diferentes escalas de valor são respeitadas e as equipas são efetivamente recompensadas, quer através do sistema de promoções e despromoções a cada dois anos, quer, indiretamente, pelas mais-valias que podem ser geradas em sede de apuramento para os Europeus de futebol, a cada quadriénio.

Se é verdade que as formações com menor cotação no cotejo do futebol europeu nada têm a perder e tudo têm a ganhar com o sistema de disputa da Liga das Nações, não é menos verdade que a prova pode — e deve — ser encarada pelas federações de referência no velho continente como uma possibilidade extraordinária de renovação, de concessão de oportunidades, de implementação de uma estratégia de médio ou longo prazo para o surgimento de novos valores nas equipas A, aproveitando as capacidades do momento (entenda-se, o momento de forma evidenciado nos clubes e que, em última instância, justifica a convocatória à seleção mais representativa), ou as virtudes do crescimento, surgindo neste patamar a capacidade de despistar talentos com espírito de seleção, que tenham feito percurso nos escalões de formação e que possam ser cooptados pela equipa principal como estímulo para a continuidade das suas carreiras e como reconhecimento do seu engajamento com o sistema seletivo das seleções do seu país.

Estes são os essenciais vetores que presidiram à criação de mais uma competição para seleções A sob a égide da UEFA, e que Portugal, França e Espanha já venceram, nas três primeiras edições.

E é necessário (diria mesmo fundamental), que os selecionadores nacionais entendam este espírito e esta mecânica, até porque, em última análise, ela potencia a capacidade competitiva dos seus conjuntos e garante latitude temporal para projetos a la longue que a emergência dos resultados exigidos numa fase qualificativa para um Europeu ou para um Mundial dificilmente permitirá.

Se olharmos para nações emergentes ou de pequena dimensão futebolística, é evidente que a prova obriga a uma determinação permanente e a um recurso a todos os seus melhores valores, justamente para tentar cumprir a perspetiva de competição igualitária que, recorde-se, é uma das matrizes da Liga das Nações.

Mas para um país como Portugal, que, apesar da sua exiguidade territorial, é tendencialmente exportador de valor individual e consegue ter, proporcionalmente, um amplo leque de opções e escolhas, a Liga das Nações deveria (deverá) sempre assumir um papel charneira no desenvolvimento sustentado da sua máxima representação nacional, equilibrando a necessidade de se apresentar num patamar competitivo elevado (entenda-se, a lutar sempre pela presença nos jogos finais), com a possibilidade de integrar novos elementos no combinado nacional, em função dos picos de rendimento nos clubes de origem ou do histórico garantido por uma seleção de sub-21 muito bem orientada estrategicamente e sempre pronta a servir a equipa de topo com gente que, para além das suas inquestionáveis qualidades futebolísticas, representa engajamento com o espírito e a genética das representações da Federação Portuguesa de Futebol.

Estes deverão ser sempre os objetivos finais de um torneio com as características da Liga das Nações que, muito embora contribua, no preenchimento das datas FIFA, para adensar o calendário competitivo, permite uma transversalidade interessante e uma abrangência importante na conjugação da sua vertente de rendimento puro com a sua componente de pensamento futuro.

Cartão branco

Quando lançámos o Canal 11 (tive o privilégio de integrar a equipa inicial e lá permanecer um ano e meio), o grande objetivo era que o projeto fosse pioneiro. Porque a FPF é a única federação mundial a dispor de um canal de televisão em sinal aberto, e porque a motivação dos jovens e das jovens para a prática de futebol, futsal e futebol de praia decerto cresceria exponencialmente. A televisão cria emoções e envolvimentos como nenhum outro media. E tem protagonistas. Cândido Costa é um deles no Canal 11, e soube não apenas ganhar o seu espaço como cumprir a preceito todas as premissas do canal.É um apresentador extraordinário porque é, acima de tudo, uma pessoa extraordinária. Mais do que um Globo de Ouro, é um diamante no ecrã. E fora dele.

Cartão amarelo

Pedro Proença pensa candidatar-se à Presidência da FPF. Não é novidade para ninguém, no mundo do futebol português, que o antigo árbitro internacional tem esse objetivo, absolutamente legítimo, aliás. Por isso, não necessita de dizer que os clubes das ligas profissionais o instaram a fazê-lo. E por duas razões: porque, independentemente disso, todos sabemos que ele o quer fazer; e porque a FPF é muito mais do que os clubes da liga profissional. Integra 22 associações que são, verdadeiramente, a alma do futebol português, além de todas as outras representações de classe com assento na sua Assembleia Geral.