O que Rui Costa não quer perceber
Rui Costa, presidente do Benfica (Foto Miguel Nunes)

Mercado de Valores O que Rui Costa não quer perceber

OPINIÃO23.06.202414:10

No Benfica, quem estava a gerir anteriormente são praticamente os mesmos que estão a gerir agora

As últimas assembleias do Benfica ficaram marcadas por muita contestação dos sócios presentes. Todos percebem que, internamente, o clube está a atravessar uma fase atribulada. A demissão de Luís Mendes, o número dois da estrutura, a poucos dias das assembleias de 15 de junho, demonstra na perfeição o estado em que se encontra a atual administração: pressionada e desunida.

Os critérios de uma boa gestão

SER dirigente ou administrador de um clube/SAD, de uma Liga ou FPF implica uma grande responsabilidade. A responsabilidade traz consigo exigência. Ninguém pense que gerir um clube é fácil, bem pelo contrário. Um clube é uma empresa especial. Os clientes dos clubes são muito apaixonados, são pessoas de todas as áreas e tanto podem estar eufóricos como deprimidos. O desporto traz ao de cima a irracionalidade na grande maioria dos adeptos, independentemente da sua profissão ou extrato social. Este contexto faz com que a missão de quem gere seja ainda mais complexa. Contudo, parece-me que é no ponto de partida que se deve clarificar tudo. Em primeiro lugar, tem de existir a perceção de que quem gere está ao serviço da instituição e não o que (muitas vezes) parece passar-se em Portugal, ou seja, que a instituição está ao serviço de quem gere. Para que isto aconteça é fundamental que existam seis critérios bem definidos: transparência, responsabilidade, fiscalização, qualificações profissionais, independência e idoneidade.

Critérios ‘vs.’ contexto Benfica

SE analisarmos a gestão do Benfica, na última década, percebemos que a maior parte destes critérios não esteve presente. Começando pela transparência, percebemos que muitas das decisões que foram tomadas em várias áreas, dentro do universo Benfica, foram pouco transparentes. A suposta auditoria apresentada demonstra isso mesmo. Jogadores contratados sem lógica, comissões milionárias pagas a agentes e a empresas, cujos beneficiários efetivos não estão identificados. No meio de tudo isto, percebemos que ninguém tem a responsabilidade das decisões e que, como é norma em Portugal, os responsáveis foram os que estavam a gerir anteriormente. No caso do Benfica, o cenário é mais complexo. Porquê? Porque quem estava a gerir anteriormente são praticamente os mesmos que estão a gerir agora!! Então como é que uma administração se pode ausentar de responsabilidade quando muitos dos seus elementos sempre estiveram presentes? Podem alegar que não sabiam o que se passava, mas se não sabiam o que estavam lá a fazer? É aqui que entra o critério de fiscalização. Os membros de uma administração devem ser os primeiros a fazerem a fiscalização uns dos outros. É um dos princípios de uma organização saudável. Todos remam para o mesmo lado, mas todos se fiscalizam uns aos outros para evitar que o poder fique desvirtuado. É ainda fundamental existirem mecanismos internos de controlo. A independência é outro dos critérios essenciais. Quando refiro independência, estou a mencionar a ausência de conflitos de interesse. A pergunta que muitos adeptos colocam é se existe e tem existido independência total dos quadros de gestão do Benfica.

Neste ponto, não é preciso procurar muito, uma vez que saiu publicamente um exemplo de um possível conflito de interesse que nunca foi investigado internamente e que não fez soar as campainhas à administração do Benfica. Estou a referir-me à empresa ATM de manutenção geral das instalações do Benfica. Foi escolhida através de um concurso interno. O mais estranho é que, como foi noticiado, o ex-administrador Miguel Moreira, passados alguns meses de ter saído do Benfica com uma indemnização, foi nomeado presidente da empresa em questão. Este simples facto não é por si só estranho? Será que existiu conflito de interesses por parte de um membro da administração encarnada? O processo de seleção foi devidamente analisado? Ninguém sabia desta questão? Alguém pretendeu esclarecer os adeptos sobre esta tema?

Críticas ‘vs.’ contexto Benfica

AS críticas são fundamentais para todas as organizações evoluírem. Admito que quem está há muito tempo no poder não tem a mesma ideia, porque o tempo pode criar vícios, pode reduzir os mecanismos de controlo (se é que alguma vez existiram), e pode dar a ilusão de que se está acima da lei. Quando as administrações que estão há muito tempo no poder são criticadas, acabam por criar narrativas que lhes interessam e que lhes permitem perpetuar-se no poder. Assim, as críticas são combatidas, não com esclarecimentos, mas com a retórica de que quem critica quer fazer um assalto ao poder, tem uma agenda ou apenas quer destabilizar e só quer o mal do clube. Para os mais distraídos, esta foi a estratégia seguida por Jorge Nuno Pinto da Costa no FC Porto na última década e, mais vincadamente, nas últimas eleições. Todas as críticas foram combatidas com este discurso populista. Voltando ao Benfica, este também é o caminho que tem vindo a ser seguido. O que me parece é que a administração de Rui Costa não está preocupada em esclarecer os adeptos em muitas questões fundamentais: o saco azul (faturas falsas?), as inúmeras transferências ou comissões, os conflitos de interesse que existem dentro do clube, o real orçamento de cada modalidade, e não um orçamento global sem distinção, para os adeptos perceberem qual o real investimento/custos/receitas associados a cada modalidade e poderem avaliar a gestão, entre outras coisas. A ideia que passa é que, ao contrário do que referiu recentemente Frederico Varandas, que gere para o clube e não para as eleições, no caso do Benfica parece que o caminho que está a ser seguido é outro.

Os exemplos de Sporting e FC Porto

Rui Costa enfrenta ainda outro obstáculo que no passado não existia. Com os recentes acontecimentos e renovações das administrações no Sporting e Porto, os adeptos do Benfica não querem ficar para trás. O exemplo mais recente do FC Porto acaba por fazer com que muita gente tenha receio do que se passa dentro do Benfica e tema que o caminho que está a ser seguido possa levar a uma situação final como a do rival azul e branco. A ascensão de Salgado Zenha é um exemplo de que no futebol podem surgir pessoas responsáveis, dedicadas e confiáveis. Muitas vezes a mensagem que nos querem passar é que no futebol é um risco muito grande apostar em pessoas que nunca estiveram dentro do meio, deixando a mensagem que existem apenas um conjunto de iluminados que têm as competências para gerir. Analisando o caso do FC Porto e os receios que Pinto da Costa e as suas equipas diretivas sempre criaram nos adeptos, relativamente aos possíveis concorrentes internos, percebemos onde estas mensagens nos podem levar e o motivo pelo qual nos são transmitidas.

A valorizar

Roberto Martínez. 12 jogos oficiais e, contas feitas, 12 vitórias e a máquina de calcular fica no bolso!

A desvalorizar

Pinto da Costa. Deveria ter sabido sair da presidência do FC Porto. A forma como deixou as contas é inexplicável. O cheque sem cobertura à Câmara da Maia é apenas mais um exemplo.

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