O jovem mais valioso da Seleção é… Ronaldo

OPINIÃO06.06.201904:00

Se me mostraram dez mil vezes a jogada do penálti que deu o golo à Suíça, sou capaz de confessar, por exaustão, que sim, que foi penálti. Até lá, apenas confesso que foi das trapalhadas maiores que vi num jogo. Depois do árbitro não assinalar nada na área portuguesa (perante protestos dos adversários) e o jogo ter continuado, existe uma grande penalidade contra a Suíça, cometida sobre Bernardo Silva, que o árbitro assinalou prontamente. Porém, chamado pelo VAR, o juiz acabou por marcar o livre de 11 metros contra Portugal e anular a jogada subsequente. E assim os helvéticos chegaram ao empate a um. Se, ao contrário, Portugal aos 55 minutos tem chegado aos 2-0, como tudo dava a entender, o jogo teria sido, acho eu, pior. Faltariam duas das três obras de arte com que Ronaldo nos presenteou:


Primeiro, o 1-0. Livre cometido sobre o próprio Ronaldo cuja velocidade, ângulo e direção parecem uma conjugação impossível;
Segundo, um golo fenomenal a passe atrasado de Bernardo Silva com a bola metida no meio metro disponível entre o guarda-redes e a trave.
Terceiro, o hat-trick. O capitão tira um defesa da frente e quando outro vem na sua direção remata com um arco perfeito, daqueles que os professores de geometria ensinam.


De resto, Portugal não jogou grande coisa. Destaque, além de Ronaldo, para William Carvalho e Rúben Neves; apagamento total de Félix, Bruno Fernandes abaixo do que nos habituou. A defesa e o guarda-redes estiveram regulares. A Suíça jogou bem e só tem de se queixar daquele jovem que desde 2003 tem andado com o país às costas.


Os milhões da época

Não há como o defeso para se falar em milhões. A acreditar nos clubes e seus arautos, assim como nos diversos títulos dos jornais, não há quem não queira praticamente todos os jogadores dos clubes portugueses. Seja o benfiquista João Félix, seja o sportinguista Bruno Fernandes (que ontem certamente não se valorizaram), seja o portista Mangala e muitos outros nomes, uns mais conhecidos do que outros, o dinheiro é tal que junto chega ao orçamento do Ministério da Cultura.


Poucas coisas me interessam menos do que esta espécie de jogo em que agentes, clubes e, por vezes, jogadores se envolvem. Todos sabemos que boa parte dos números são falsos, grande parte das vendas são bluff e que os nomes anunciados para a troca - todos geniais ou, pelo menos, promissores - são piores do que aqueles que nos deixam. A prova de que os melhores se vão embora é a nossa Seleção Nacional. Quem diria há 20 anos que apenas um punhado de jogadores da equipa nacional joga em Portugal (e esta formação nem é das mais notórias)?
Claro que, como todos os sportinguistas, adorava que Bruno Fernandes fizesse mais uma época, ou duas, ou três no Sporting. O problema é que pelo que se apresenta é difícil resistir a números, mesmo que eles não cubram a cláusula de rescisão, ou o façam com artifícios de troca de jogadores. Mas a verdade é que a Liga portuguesa tem de se contentar em ser uma das menos apetecíveis, pese o valor dos nossos treinadores e jogadores, como se vê pelo número deles que está espalhado pelo mundo. A reforma do número de clubes, para bastante menos e o próprio desenho do campeonato - e talvez como se faz noutras paragens uma distribuição das receitas da Liga de forma mais equitativa - contribuiriam, a meu ver, para uma mais acesa competição, com mais público nas bancadas, mais espetadores nas televisões e mais gente no resto da Europa e do mundo a olhar para nós.


Mas os interesses instalados na Liga e na FPF parecem ser avessos à competição. São da escola do mote da Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente, que é «mais vale asno que me leve que cavalo que me derrube». Não arriscam, não entendem. Nem sequer com o exemplo que o Belenenses (o verdadeiro) ou o Casa Pia deram nesta época. O interesse e as assistências de um jogo têm mais a ver com a forma como os clubes se relacionam com os adeptos e com o equilíbrio de forças dos adversários, do que com o facto de se estar numa divisão ou noutra. E, quando vemos escassas centenas de pessoas num jogo do Belenenses (o falso), sabemos que esses são clubes sem alma, sem gente, que vivem para o negócio e para o que lhes cai da televisão.
Novas regras

Mas o futebol é, por definição, conservador. Basta ver o atraso com que chegaram inovações tecnológicas que há muitos anos já podiam fazer parte do jogo. Desde a linha de baliza, para acabar com as dúvidas sobre se uma bola entrou ou não, até ao VAR, que começa a tornar-se uma normalidade, teremos de reconhecer que num desporto que movimenta milhões são pequenos investimentos que podiam há muito estar feitos.
As novidades para esta época, tal como as li e me foram explicadas, parecem-me bastante positivas, o que a somar às regras definidas pelo International Board, podem tornar o espetáculo melhor e mais dinâmico.
Entre o que me parece positivo conta-se, desde logo, o maior número de jogos de dia e o fim, salvo casos excecionais (como a participação na Liga Europa) dos encontros à segunda-feira à noite. As linhas de fora de jogo proporcionadas ao VAR também são bem-vindas, claramente. Poderemos até considerar que se evolui num sentido positivo, sobretudo se, a juntar a isto, existam dois pontos em que a Liga e a FPF devem ser inflexíveis:


- Arbitragens justas, com menos casos (claro que haverá erros, mas que não sejam daqueles erros que todos percebemos serem para o mesmo lado, a favor dos do costume, etc.)
- Controlo, rigor penalização séria das claques quando estas cometam desacatos ou distúrbios no campo ou fora dele. Clubes que dizem não ter claques (falo mesmo do caso do Benfica) têm de ser claramente confrontados acerca desse truque que todos sabem ser absolutamente mentiroso.


Se estes pontos forem cumpridos, se os clubes diminuírem a tensão existente no futebol e se todos os treinadores tiveram a atitude de um Bruno Lage ou de um Marcel Keizer, para dar dois exemplos, e os dirigentes a boa educação de Frederico Varandas; se cada um no seu lugar cumprir o seu dever de modo a transformar o futebol num divertimento sadio e simultaneamente competitivo, podemos augurar uma nova época melhor do que esta que terminou.