O futebol distrital

OPINIÃO07.09.202107:00

Dos benjamins aos veteranos, sem esquecer os adolescentes ou aspirantes a profissionais

N ÃO tem frenesim mediático nem vende jornais. Não movimenta milhões nem atrai multinacionais. O futebol distrital, aquele que se joga regularmente de lés a lés do País, chama menos mas brilha mais. Muito mais. São milhares de jogos num mundo gigante de escalões, séries e categorias. De Norte a Sul e em todas as ilhas, lá está ele, ano após ano, época após época. Sempre anónimo, sempre discreto, sempre resistente.
Dos pequeninos benjamins aos maturados veteranos, sem esquecer os adolescentes e os aspirantes a profissionais. Tudo organizado na perfeição, apesar da escassez de meios e da dificuldade de recursos. São meninos e meninas, mais novos e mais velhos, que se dividem de manhã à noite, em campos distintos, adaptados às suas idades.
Futsal, Futebol de 7, de 9 ou de 11. Há de tudo, para todos os gostos. O futebol distrital, humilde e raçudo, é o ponto de partida. É onde tudo começa. É a rampa de lançamento. Eles sonham e o céu aparece.
É ali, no clube do bairro, que nasceram muitos dos craques de hoje e é ali, no rival do lado, que nascerão muitos dos ídolos de amanhã.  Andorinha (Madeira), Os Pastilhas, Académico de Leça ou Damaia Ginásio Clube. O que têm em comum? Provavelmente apenas o facto de terem dado à luz, para o futebol, Cristiano Ronaldo, Luís Figo, Vítor Baía e Rui Costa.
Como esses tantos outros passaram pela base, desfilando vontade de jogar, defender e marcar. Jogando com brilho nos olhos, alegria genuína e amor à camisola.  Ali os euros também se contam, mas aos tostões, e até esses são poucos. Ali troca-se dinheiro a sério por carolice e salários altos por paixão. Ali o único valor que existe é o do prazer de jogar. Jogar sem medo, com punhos fechados e dentes cerrados.
Muitos ordenados nos distritais não param nas contas dos jogadores. Param nos estômagos e, deixem-me que vos diga, param muito bem. O pagamento tem quase sempre a forma de uma bifana bem aviada ou de um belo de um courato acompanhado com bagaço. Não digam que não gostam até provarem.
Mas no futebol distrital não há apenas raça, genuinidade e amadorismo. Nos distritais não se formam apenas jogadores bestiais. O melhor que ali se faz é educar gente, formar homens e mulheres fenomenais. Enquanto estão ali, muitas crianças desprotegidas passam ao lado de um mundo desviante. Enquanto correm, treinam e jogam não estão a asneirar. Não estão a fugir por caminhos perigosos. O risco de caírem num mundo feio é trocado pelo esforço físico, pelo compromisso coletivo, pela entrega a um só objetivo.
E o papel dos clubes é aí absolutamente essencial. É elogioso. É insuperável. É admirável. É por isto que o futebol dos regionais tem que ser sempre protegido, acarinhado e valorizado. É por isto que têm que ser sempre apoiados e incentivados.
O futebol distrital não é apenas importante, é fundamental. É a base de toda a boa formação e a única rampa de lançamento de talentos do futebol em Portugal.