O exemplo do futebol feminino
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Opinião O exemplo do futebol feminino

OPINIÃO17.09.202309:00

Pensar futebol, o texto de opinião de Diogo Luís

No rescaldo do Thinking Football, onde se abordaram vários temas fundamentais para o futuro do futebol em Portugal, voltámos a confirmar que o melhor do nosso futebol está dentro dos relvados. Em primeiro lugar, uma excelente exibição da nossa Seleção masculina frente ao Luxemburgo, que culminou com um resultado histórico. Posteriormente, um grande espetáculo na Supertaça de futebol feminino. Conforme irei abordar, a clarividência dentro do relvado é muito superior à que existe (ou deveria existir) fora dele!

Thinking football – um evento diferente

O evento organizado pela LPFP foi mais uma oportunidade para debater temas, confrontar ideias e procurar soluções. Com painéis de grande qualidade, percebemos que, em Portugal, existe gente muito capaz, com qualidade, competência, capacidade e motivação para fazer com que a nossa liga de futebol profissional dê um passo em frente. Deste debate positivo para o nosso futebol ficam duas grandes conclusões. A primeira é que temos de inverter o caminho que estamos a seguir. A nossa liga não corresponde à qualidade dos nossos jogadores e treinadores. Isto significa que há algo que não bate certo. 

Não devemos ter medo de pôr o dedo na ferida e exigir alterações. Perceber que os clubes não podem mandar na competição é fundamental para que possamos evoluir. É imprescindível ter uma entidade independente que crie regras, que defina comportamentos, que seja rigorosa, independente e que tenha a capacidade de colocar os interesses do coletivo acima do individual, fazendo com que, sem perceberem, todos saiam beneficiados no médio/longo prazo. 

A segunda conclusão a que chegamos é que os nossos dirigentes vivem num mundo diferente do nosso. Referem que não falam de mesquinhez, mas conseguem dizer que o nosso futebol está muito melhor e no caminho certo. Não percebem o que se passa à sua volta, a toxicidade que existe na nossa competição interna. Não tocam no tema de termos perdido as transmissões para Inglaterra, França e Brasil. Talvez não percebam que o problema de estarmos a perder mercado em vez de o potenciarmos, tem a ver com a reduzida qualidade do nosso produto. Se queremos evoluir, devemos, em primeiro lugar, perceber as nossas fraquezas. Fazer um diagnóstico sobre o nosso estado. Falar abertamente sobre os nossos problemas é fundamental para nos podermos consciencializar e perceber qual o caminho que devemos seguir. 

Por outro lado, evitar falar dos problemas e tentar passar uma mensagem diferente daquela que todos nós vemos com os nossos próprios olhos, apenas fará com que os investidores e patrocinadores ideais se afastem e nos deixem cada vez mais isolados. O futebol é e sempre será um exemplo para a sociedade. No futebol não chega parecer, é determinante ser. Realidade acima da ilusão. Por exemplo, dizer que o futebol português está muito melhor é a mesma coisa que um treinador de uma equipa que está em último lugar no campeonato com 33 jornadas disputadas (a uma do final do campeonato) e que tem apenas 5 pontos, dizer que a sua equipa está a jogar muito bem, que está a perder nos pormenores ou referir que a culpa da sua posição é do formato da competição ou dos árbitros. Alguém iria acreditar?

A culpa é da comunicação social?

A última imagem é aquela que fica. Depois de vários dias de conteúdos de excelência, a conclusão de um dos principais presidentes da nossa liga é que a comunicação social é o problema do futebol português! Sim, a mesma comunicação social que potencia o Thinking Football, que promove jogadores e que os destaca no panorama nacional e internacional. A mesma comunicação social que tem de falar dos muitos temas que os dirigentes e as suas equipas de guerrilha colocam na agenda mediática. Pior mesmo que estas declarações em si, foi ver na primeira fila dirigentes com um enorme grau de responsabilidade, com o presidente da Liga à cabeça, a rirem e a aplaudirem estas declarações sem sentido algum. Este comportamento deixou-me algumas questões: será que os restantes dirigentes concordam com o que disse o presidente do F.C. Porto? É a comunicação social que emite constantemente comunicados a “atacar” os rivais ou a arbitragem, desviando o foco do essencial? É a comunicação social que promove a paixão pelo ódio aos rivais? É a comunicação social que nunca dá os parabéns aos adversários quando estes têm sucesso? É a comunicação social que gere as contas do F.C. Porto? 

É a comunicação que define as regras, os castigos e as multas que são aplicadas na liga? Para finalizar, é fundamental desmistificar que os clubes não são uma pessoa. Pinto da Costa não é o F.C. Porto. É o seu presidente há muitos anos e, quando sair, o clube irá continuar. Querer passar a mensagem de que criticar o presidente do F.C. Porto é criticar e atacar o clube é inacreditável. Em Portugal, tivemos alguns casos em que determinadas pessoas pensavam que estavam acima das instituições, como foi o caso do BES ou da PT. A realidade, é que ninguém está imune à crítica e que a crítica é importante para que as organizações evoluam…

Apoiem o futebol feminino

A Supertaça de futebol feminino foi um grande espetáculo de futebol. Pena não ter sido acompanhada por uma organização diferente, que permitisse ter um estádio cheio como o jogo merecia. De igual forma, não se percebe como é que a atribuição do 3.º e 4.º lugares foi marcada para a manhã da final, numa quarta-feira em Aveiro. Como resultado, o estádio estava vazio! 

O futebol feminino está a evoluir muito dentro do relvado. Fora dos relvados o apoio não tem sido o mesmo, ou melhor, tem mais destaque, mais palavras, mas, no limite, o resultado ainda não está ao nível do que se passa nos relvados. Não basta dizer que se apoia, é fundamental darem-se condições. Parece-me que criar uma liga de futebol feminino é o passo a seguir. Desde logo, definir regras, objetivos, caminhos, formas de financiamento, perceber as dificuldades e enfrentá-las. Perceber que, para evoluirmos, o apoio terá de ser efetivo. Que teremos de tentar ter equilíbrio nos jogos da Liga, de forma a que o interesse dos adeptos seja cada vez maior. 

Uma coisa é certa: as intervenientes têm contribuído e muito para a evolução da modalidade. Digo isto não só pelo que fazem dentro dos relvados, pela magia que apresentam, pela garra, pela determinação, pela união e compromisso mas também porque, a juntar a tudo isto, demonstram respeito pelas rivais. O exemplo da Supertaça é paradigmático. Tivemos um excelente jogo de futebol, com emoção até à marcação das grandes penalidades. A cereja no topo do bolo veio a seguir, quando as duas equipas, rivais desde sempre, fizeram a guarda de honra uma à outra. O futebol é isto, é fair-play, é saber ganhar e saber perder. Estes dois clubes são geridos pelas mesmas pessoas, mas no futebol feminino fez-se algo que ainda não foi feito no futebol masculino. As intervenientes tomaram as rédeas e deram um exemplo fantástico que espero que possa vir a ser seguido por outros intervenientes, mesmo que contra a vontade de muitos dirigentes. Parabéns às treinadoras e jogadoras de Benfica e Sporting pelo exemplo que deram a todos os que gostam de futebol. 

A valorizar:

João Palhinha

Palhinha é a prova de que os jogadores podem e devem ter respeito pela sua entidade patronal. Na situação de Palhinha, quantos tinham forçado para sair? Mitrovic na mesma situação forçou a saída. Palhinha é um exemplo dentro e fora do relvado. A renovação foi merecida. Se continuar a sua evolução, em Janeiro poderá ter nova oportunidade de dar um passo em frente na sua carreira.

A desvalorizar:

FPF

O futebol feminino merecia uma organização diferente. Merecia um 3.º e 4.º lugares com espetadores no estádio. A final merecia um estádio cheio. Fazer um jogo desta dimensão num dia de semana às 19h45 em Aveiro (sendo duas equipas de Lisboa), acaba por não potenciar o grande espetáculo dentro das quatro linhas.