Cinco pessoas a gritar à noite na rua podem fazer muito barulho, dependendo da zona em questão. Cinquenta pessoas a gritar à noite no meio da rua farão certamente muito barulho seja qual for a circunstância. Mal iria uma instituição da grandeza do FC Porto, porém, se confundisse — ou sequer comparasse — o barulho de 50 pessoas a gritar na rua à noite (várias noites) com a expressiva vontade manifestada pelos sócios nas últimas eleições. Lenços brancos após maus resultados e contestação ao treinador haverá sempre, em todos os clubes, nomeadamente e de forma muito peculiar em Portugal. Não devem confundir-se essas manifestações de desagrado com os pequenos comícios que têm acontecido no regresso da equipa à cidade ou ao estádio quando não vence, ou às tarjas que são colocadas durante a noite (lá está, sempre a noite) e removidas de manhã. André Villas-Boas, que há precisamente um ano anunciava a candidatura para as disruptivas eleições do FC Porto, não está a salvo de despedir treinadores, como nenhum presidente de clube/SAD estará. Mas mostra saber distinguir os alhos dos bugalhos e segue, resoluto, na afirmação de uma nova era azul e branca. A transparência com que as conclusões da auditoria forense às contas da SAD dos últimos anos foram divulgadas deve servir de exemplo. É certo que não foi o primeiro dirigente a encomendar auditorias externas a entidades absolutamente insuspeitas. Frederico Varandas fê-lo pouco depois de ter chegado à presidência do Sporting e Rui Costa, no Benfica, também. Nenhuma delas, porém, teve a abrangência da que esta semana foi conhecida. Quer no âmbito (a do Benfica, por exemplo, restringiu-se a processos de transferências) quer, sobretudo, nas conclusões. O Sporting de Bruno de Carvalho apresentava desconformidades de milhares de euros, o FC Porto de Pinto da Costa apresenta eventuais perdas de milhões. A auditoria do FC Porto foi apresentada publicamente (embora os sócios tenham tido acesso a mais detalhes), a do Sporting foi conhecida por fuga de informação, a do Benfica mostrada aos associados em Assembleia Geral com as conclusões mais simpáticas divulgadas antes. Villas-Boas pode ter de despedir treinadores enquanto for presidente, repete-se. Mas tem demonstrado real capacidade de transformar um clube que se cristalizou demasiados anos em torno de uma figura. E no que respeita a contas... haja maior controlo em toda a parte.
