Não há bem que sempre dure (nem mal que nunca acabe)

OPINIÃO18.11.202106:00

Ai, Portugal, quantas esperanças tivemos que nunca se realizaram; quantas oportunidades perdidas, quantos erros cometidos. O destino político parece ter transbordado para o futebol

C OMO escreveu o diretor deste jornal, Vítor Serpa, os dias seguintes à derrota de Portugal frente à Sérvia, no Estádio da Luz - uma derrota miserável, como titulou o jornal -, esses dias foram dedicados à crucificação de Fernando Santos. Por mim, não o crucifiquei nem o crucifico; há vários aspetos que temos de considerar, porque não se deve condenar ninguém antes de um julgamento, como decorre do Estado de Direito e do senso comum.
O primeiro ponto para ter em análise é este: Portugal não falha uma grande final desde 1998, ano em que esteve ausente do Mundial, apesar dos grandes jogadores que congregava. Num jogo decisivo com a Alemanha, ao empatarmos, depois de Pedro Barbosa (o falso lento) fazer o 1-0, permitimos que, somando apenas um ponto, a Ucrânia nos ultrapassasse no segundo lugar e ocupasse o nosso posto no play-off. De pouco serviu aos ucranianos, afastados pelos croatas que ironicamente derrotaram a Alemanha nos quartos-de-final, sendo apenas batidos pela França, nas meias-finais. Serviu de consolação o terceiro lugar da Croácia, num campeonato ganho pela França.
Este jogo com a Alemanha que nos afastou, ficou célebre pelo  primeiro e único cartão vermelho que Rui Costa (sim, o atual presidente do Benfica) viu. Foi expulso por demorar a sair do campo quando era substituído por Sérgio Conceição (sim, o treinador do Porto). O árbitro era Marc Batta, francês a decidir quem era apurado para o Mundial de França, honestamente (hum…) ganho pela França.
Foi nessa altura que Artur Jorge deixou de ser selecionador, dando o lugar a Humberto Coelho. Este conseguiu o apuramento para o Euro-2000, organizado em parceria por Bélgica e Holanda. Memorável o jogo contra a Inglaterra em que estávamos a perder por dois a zero e Figo, com um remate do meio da rua, reduziu; João Pinto empatou e Nuno Gomes selou a vitória por 3-2. Memorável, igualmente o hat-trick de Sérgio Conceição (sim, esse) contra a Alemanha, depois de já estarmos apurados (vencêramos, entretanto a Roménia por 1-0). Nas meias finais caímos com um penálti manhoso, por mão (que estava no chão a amparar uma queda) de Abel Xavier. O sururu foi enorme e vários portugueses suspensos, entre os quais Paulo Bento,  o próprio Abel, e Nuno Gomes.
Humberto colocou o lugar à disposição e voltou, quatro anos depois, António Oliveira (atual cronista destas páginas). A fase final de 2002 era na Coreia e no Japão, e o estágio foi em Macau. Não correu bem: perdemos com os EUA 3-2; ganhámos à Polónia 4-0 (hat-trick de Pauleta) e voltámos a perder com o anfitrião Coreia do Sul… num jogo estranho cheio de erros de arbitragem, ou, pelo menos, assim nos pareceu.
Foi então que entrou Scolari. E foi então que Scolari, com toda a sua capacidade de mobilização, fez da equipa nacional… uma equipa nacional. Como ele é brasileiro era mais simples. Mas começou logo por perder o Euro-2004, em casa, em Portugal, contra a Grécia. Na Luz, o golo de Charisteas, que nos afastou do primeiro título, foi emocional e psicologicamente pior do que o da Sérvia no domingo passado. Era, de qualquer modo, a primeira final de Portugal. Scolari aguentou até 2008, mas ainda hoje há uma parte dele na nossa seleção.


A SAGA DAS QUINAS

C HEGOU Carlos Queiroz a selecionador. Os resultados foram à Carlos Queiroz… medíocres, embora com algumas façanhas (7-0 à Coreia do Norte, na fase final do Mundial 2010, que é recorde da seleção). Seguiu-se Paulo Bento que, com tranquilidade, num jogo amigável espetou quatro golos à Espanha, vingando anos de humilhação. Em 2014 fomos ao play-off e à fase final. Mas não fizemos história.
Honestamente Paulo Bento, e sem colocar em causa a sua qualidade, apenas conseguiu fazer história ao perder em Aveiro com a Albânia, por 1-0, na fase de qualificação (primeira vitória dos albaneses fora de casa). Foi por isso que a Federação decidiu voltar-se para outro treinador; a 23 de setembro de 2014 contratou Fernando Santos, que está firme no seu posto há sete anos, algo nunca visto.
O engenheiro que já dera o pentacampeonato ao FC Porto conseguiu pegar na equipa e, beneficiando de bons jogadores, os que vinham de trás e os que ele convocou, fez uma boa campanha para o Euro-2016, em França. A equipa foi progredindo, mas sem grandes brilhos… à Fernando Santos. O certo é que ganhava, sendo simultaneamente os anos gloriosos de Ronaldo que encantava multidões. Na Final do Euro, à qual chegávamos pela segunda vez (na primeira perdêramos em casa) jogámos contra a França, a anfitriã. Depois de Ronaldo se lesionar, tudo parecia perdido, até que um herói acidental, Éder, já no prolongamento, com um pontapé que levava as asas da fortuna, o sopro dos deuses e o que mais foi preciso, Portugal ganhou! E Fernando Santos também.
Na Liga das Nações, entretanto inventada, Portugal voltou a vencer, e no Mundial de 2018 só saiu frente ao Uruguai, nos oitavos-de final, depois de jogos épicos, como o 3-3 contra a Espanha.  
No Euro-2020, uma coisa esquisita jogada este ano, foi Hazard, da Bélgica que correu connosco da fase final, depois de termos terminado o grupo em terceiro lugar, atrás da França e da Alemanha.
Finalmente, chegamos ao apuramento do Mundial de 2022. O do Catar, o célebre mundial dos milhões. Andávamos a jogar mal e toda a gente sabia. Vi partidas do Sacavenenses e até do Ponte de Frielas que me pareceram mais emotivos do que Portugal face à Irlanda. Mas não fazia mal, porque um empate servia. Servia a nós, mas não à Sérvia, e eles mereceram ganhar. Somos recambiados para play-off uma vez mais, e dia 26 deste mês saberemos com quem vamos jogar, podendo ser menos difícil, ou muito difícil.
 

BALANÇO FINAL

P OR mim manteria Fernando Santos até ao fim da nossa participação no Mundial, que pode ser no play-off ou já no Catar. Só depois disso faria uma avaliação. No meio deste bruaá, é preciso uma certa calma; é necessário um certo distanciamento dos factos que nos afetaram neste malfadado jogo.
Vejamos: Fernando Santos não comandou as piores exibições da Seleção; pode ser que o top das melhores também não sejam dele, mas devemos sempre ter presente a dicotomia exibição/resultado e saber o que queremos.
Fernando Santos foi o único selecionador português - repete-se o único mesmo - a ganhar títulos para Portugal: o Europeu e a Liga das Nações; o facto de sermos obrigados a jogar um play-off para irmos a uma fase final está longe de ser inédito.
A diferença entre os jogadores que estão à disposição de Fernando Santos - agora, neste momento - e os que estiveram às mãos de muitos outros não é substancialmente diferente, nem lhe é, provavelmente, favorável.
O que se passa, então? Porquê esta agitação? Não sei, nem a partilho. Concordo muito com a posição que aqui deixou Vítor Serpa (se fosse uma personagem de Eça diria «abundo muito nela»): estamos a chegar ao fim de um ciclo. Ronaldo já não é o que era, embora ainda seja muito; Pepe está à beira da reforma; João Moutinho vai nos 35 anos… Ou seja, há um eixo da equipa portuguesa que nos deu tanto, que ainda vai dar alguma coisa, mas cujo ciclo está a terminar. Assim como o do selecionador. Nada disto é trágico e o que interessa é que Portugal continua a formar bons talentos: Diogo Jota, Bernardo Silva, Bruno Fernandes, João Palhinha, Matheus Nunes, Rafa, Renato Sanches, João Félix e, como canta o Sérgio Godinho, «perdoem-me as pessoas que ficaram esquecidas».
Assim sendo, caro engenheiro, deixe-se estar. Se o primeiro golo não tem entrado, o segundo nem mossa fazia. E toda a gente acharia normal que continuasse à frente da equipa. É óbvio que a frase «não se pode ganhar sempre» é verdadeira. Porém, ao contrário do que já se diz, Portugal é, como seleção, uma potência do futebol. É certo que não é a Alemanha, a Inglaterra, a Itália… mas, por acaso, a Itália também tem que disputar o play-off.
 

Henrique Monteiro não crucifica Fernando Santos e aponta o fim de ciclo de alguns jogadores


VARZIM 

Este jogar fora, é esta semana em casa, onde o Sporting recebe hoje o Varzim, para a Taça de Portugal. Já se sabe que Rúben Amorim vai dar muitas oportunidades, umas por que quer, como será o caso de João Virgínia na baliza, outras porque não tem outra hipótese, como o caso da lesão de Coates. Importante é vencer, e que estejam todos bem para o jogo de 4.ª-feira contra o Dortmund.


CENTRAL

Parece que está prometido mais um central para o plantel do SCP. Parece-me bem; os que lá estão são bons, mas são manifestamente poucos, face ao desgaste que a época promete.


E JÁ AGORA

Um ponta-de-lança, um striker, um homem com faro de golo não era mau…