Marítimo e a sentença de um divórcio

OPINIÃO28.09.202206:30

Na maioria dos clubes o presidente do clube e o presidente da SAD são a mesma pessoa. Não era assim no Marítimo

OClub Sport Marítimo prepara-se para terminar a sua relação com o presidente da Sociedade Anónima Desportiva (SAD) do clube. Um divórcio inesperado porque nesta relação, clube vs SAD, os dois presidentes não se entendem. Será litigioso?
Em Portugal temos vários exemplos de tensão entre os clubes e as SAD. De um lado sócios e adeptos, que querem golos, ganhar jogos, festejar. Do outro os acionistas das sociedades que querem ganhar dinheiro, é para isso que investem. Bem sei que alguns são adeptos e não estão preocupados em ter rendimento, mas nem todos.
Esta situação - clube/SAD - é obrigatória em Portugal. O DL 10/213, nos seus artigos 1 e 30, assim exige. Hoje, se clubes como Marítimo, Casa Pia, ou quaisquer outros, quiserem voltar a ser donos do futebol profissional não podem. Podem sim ter a maioria da SAD, mas não podem ser como o Real Madrid ou o Barcelona que permanecem associações desportivas.
Na maioria dos clubes o presidente do clube e o presidente da SAD são a mesma pessoa. Não era assim no Marítimo: o presidente do clube, Rui Fontes, era apenas presidente da Assembleia Geral da SAD. Mas o apenas permitiu a destituição de João Luís, responsável da sociedade desportiva, porque o clube tem a maioria do seu capital. Outro exemplo? Todos recordamos que Bruno de Carvalho foi destituído de presidente da SAD do Sporting pelo próprio clube.
Estas normas do direito desportivo foram naturalmente feitas a pedido dos clubes e evidenciam algumas das carências do futebol português. A SAD serve aos clubes para angariar fundos, ter contas mais transparentes e conseguir mais investidores. No papel tudo parece perfeito. Mas como se viu no caso do Benfica com John Textor, investidores profissionais têm objetivos muito diferentes.
Repare-se no Manchester United onde a família Glazer é frequentemente acusada de não investir o suficiente. E de desnatar o clube! É que os fãs querem ganhar jogos e campeonatos, os Glazer querem, também, ganhar dinheiro.
Alguns analistas consideram que foi a venda em bolsa do United, em 1991, e o dinheiro conseguido, que permitiram a era dourada de Alex Ferguson, em que o United ganhava quase tudo na Premier League, com relevantes conquistas também nas competições europeias. A razão? Tinha mais dinheiro porque deixara de ser um clube e era uma sociedade anónima desportiva com investidores.
Em Inglaterra os clubes são verdadeiras empresas. E assim podem ser compradas por investidores, como aconteceu com o Chelsea, por quatro mil milhões de euros, ou por Estados, como no caso do Manchester City, que pertence a um fundo dos Emirados Árabes Unidos. Um fundo sem fim onde há dinheiro para tudo! Resumindo: a Premier League é a mais vista e mais rica competição de futebol do mundo.
Em Portugal o modelo híbrido é resiliente, como mostra o caso do Marítimo e do Belenenses, mas as SAD não conseguem - ou não querem - investidores profissionais e sobrevivem, simplesmente, com a venda dos melhores jogadores. E sem os melhores, o direito ao golo reduz-se substancialmente.