Incrível!

OPINIÃO01.06.201805:03

Que mais há para dizer ou escrever sobre a mais inacreditável, patética, absurda, incompreensível, inaceitável e surpreendente crise que alguma vez assolou um dos maiores e mais importantes clubes da história do desporto português? O principal responsável do Sporting originou uma tal montanha de problemas, fraturas, polémicas, feridas e divisões que fez com que um projeto que parecia ter tudo para só engrandecer o Sporting se transformasse, afinal, numa caricatura.

O orgulho, a convicção, a fé renovada, o espírito fortalecido, a nova ambição e a estratégia de um Sporting que, sobretudo a partir de 2015, parecia capaz de um novo e intenso rugido, deu lugar a um poço de dúvidas, perguntas e incertezas. Acredito que muitos se interrogarão: como foi possível chegar-se a isto?

O presidente deixará ou não o Sporting? Jorge Jesus continuará ou não como treinador principal? Sá Pinto vai ou não vai regressar? Augusto Inácio será ou não reserva para o comando técnico? Vai ou não vai haver a tão propalada assembleia geral para destituir o grande líder? Perguntas não faltam. E teorias também não. Mais ou menos conspirativas, mais ou menos sustentadas, mais ou menos argumentativas.

Como vai o Sporting resolver os problemas que criou, as feridas que abriu, as fraturas que provocou é, para os sportinguistas, evidentemente, a principal questão, e, por ironia, essa é a questão principal a que só os sportinguistas podem dar resposta, porque o Sporting será sempre, em qualquer circunstância, aquilo que os sócios do Sporting, e só os sócios, quiserem que seja.

Do ponto de vista analítico, essa questão principal leva-nos, como não podia deixar de ser, à figura do atual presidente, o centro de toda a convulsão para a larga maioria dos que, publica e notoriamente, se têm pronunciado sobre o assunto. E levando-nos à figura do presidente, leva-nos também, parece-me, à conclusão de que será tudo menos fácil derrubá-lo do trono que legitimamente conquistou pela força do voto.

Como observador, naturalmente distanciado dos meios leoninos de discussão, parece-me, também, que muito provavelmente só vai ser possível conseguir o tão equacionado afastamento (ou a continuidade reforçada) de Bruno de Carvalho num futuro ato eleitoral, a não ser, assim à primeira vista, que mais demissões levassem, por exemplo, à eventual queda do Conselho Diretivo pela imperativa falta de quórum.

Pelo andar da carruagem, o que parece também é que não haverá sequer lugar à anunciada assembleia geral para destituir o presidente quanto mais a destituição do presidente. O jogo passará para o plano jurídico e promete arrastar-se à força de mais ou menos providências cautelares.

Arrastar o processo será, em última análise, tudo o que fará correr a situação a favor do presidente do Sporting, que desse modo se manterá em funções e poderá continuar a tomar decisões, mais ou menos estruturais, mais ou menos convenientes, mais ou menos interessantes para o futuro do clube, mais ou menos branqueadoras de tudo o que sucedeu e de tudo o que fez estalar esta tão absurda, patética, inqualificável e surpreendente crise num clube que parecia ter tantas razões para continuar a convencer-se e vê agora tanta expectativa a desfazer-se.

Quanto a Jesus, queira-se ou não o homem que devolveu ao Sporting a mais autêntica das almas competitivas, o que se trata de saber não é se tem ou não condições para continuar treinador do Sporting, porque obviamente tem, mas sim se tem ou não condições para continuar a trabalhar com este presidente do Sporting, que obviamente não tem.

Qual é a solução?, é a pergunta do milhão de dólares, para a qual gostava mas não tenho resposta... Apenas uma previsão e um palpite: o presidente tentará fazer a vida negra ao treinador; e o treinador acabará por ganhar. Nem que seja na dignidade!

É verdade que não gostei de ver Cristiano Ronaldo fazer aquela figura logo após a final da Champions. Não ficou bem ao melhor jogador do mundo substituir a celebração da vitória pelo descuidado anúncio de problemas com o clube, que poderiam levá-lo até a deixar Madrid. A maneira como Cristiano falou voltou a colocar sobre a mesa toda a insatisfação, sobretudo desde há um ano para cá, sensivelmente desde que no último verão A BOLA noticiou a vontade de CR7 abandonar Espanha.

Mas a quinta final da Champions ganha por Ronaldo não merecia, realmente, acabar com aquela declaração, que o próprio Cristiano reconheceu, já fora do relvado, não ter escolhido bem o momento de a fazer.

É verdade, pois, que não gostei do que vi e ouvi, mas, acreditem, como eu compreendo Cristiano Ronaldo, melhor jogador do mundo pela quinta vez em 2018, melhor goleador de sempre da Champions (105 golos em 100 jogos na maior competição de clubes do futebol), vencedor pela quinta vez do maior troféu da UEFA, e mesmo assim sempre tão discutido, tão questionado, tão menos reconhecido do que merecia, como se a importância de Cristiano no futebol, e muito em particular em Madrid, pudesse, de repente, ver-se no mesmo prato da balança de, por exemplo, um Bale ou mesmo um Salah.

Não sei como é que vai acabar o problema de Cristiano com o fisco espanhol, mas imagino que o próprio Real tenha na matéria muitas responsabilidades por assumir - por pagamentos feitos em paraísos fiscais a Ronaldo, e a todos os outros, por via de direitos de imagem, como forma de os próprios clubes, eles sim, pagarem menos impostos… -, e não sei se Cristiano Ronaldo vai ou não acabar por deixar aquele que é, realmente, o maior clube do mundo.

Se o fizer, não posso deixar de o lamentar, porque Cristiano e o Real foram feitos um para o outro e será, ou seria, no Real que o maior goleador da história deve, ou deveria, terminar a carreira, como ele, aliás, lá bem no fundo, sempre desejou.

Mas lamento mais ainda que o próprio Real Madrid não seja verdadeiramente capaz de reconhecer, com a humildade proporcional à sua própria grandeza, que Cristiano Ronaldo é já a maior legenda da história do clube e a estrela madridista de maior impacto de sempre à escala mundial. Com todo o respeito por figuras lendárias como Alfredo Di Stéfano ou Paco Gento, por jogadores absolutamente simbólicos como Santillana ou Raúl Gonzalez, a verdade é que vencer mundialmente hoje, quanto tantos são tão fantásticos, é incomparavelmente mais difícil, exigente e magnífico do que era há duas, quatro ou seis décadas.

É preciso relembrar - é sempre preciso relembrar - que Cristiano Ronaldo conseguiu no Real só quatro Taças dos Campeões (!!!) no tempo em que Messi - o outro mais extraordinário jogador de sempre - liderou aquela que ficará, por agora, como a melhor equipa de futebol da história, num clube que até pelas circunstâncias sociais e políticas sempre teve a cultura de reconhecer os seus como os melhores e os mais importantes de todos, ao contrário de um Real que passou os últimos anos a silenciar a grandeza de símbolos como Casillas ou Raúl, para citar apenas exemplos mais recentes, ou a desproteger o mais marcante de todos os jogadores do clube como é, pura simplesmente, Cristiano, um Real Madrid que apenas teve de engolir Alfredo Di Stéfano porque, nesse caso, a história acabou por ter muito mais peso do que toda a filosofia política da elite que dominou o Real nos últimos  vinte ou trinta anos.

Podem acusar Cristiano de muita coisa, de ter as suas birras e a sua vaidade pessoal, o que não lhe fica, necessariamente, nada mal, porque quem é tão grande, quem está tão exposto, que é tão seguido, que tem tanto impacto, quem toca tanta gente, tem, evidentemente, direito a ter as suas birras, os seus deslizes, as suas fraquezas, sinal também da sua própria dimensão humana.

O que não podem - jamais - é acusá-lo de misturar as coisas, de confundir insatisfação ou desolação com menor empenho, mais fraca ambição ou menos profissionalismo. É evidente que Cristiano não vive no Real um clima estimulante, motivador, empolgante, isso parece evidente e nem precisaria o capitão de Portugal de dizer o que disse ainda em pleno relvado da final da Champions, no último sábado. Mas nem por isso Cristiano deixou alguma vez de ser o maior num clube que, pelo menos de forma autêntica ou genuína, verdadeiramente nunca o reconheceu.

Cristiano voltou este ano a ser Bola de Ouro; voltou a ganhar a Champions; voltou a ser o melhor marcador da competição que inegavelmente mais prestígio e dinheiro traz aos grandes clubes; voltou a marcar golos inesquecíveis; voltou a ser decisivo e marcante em quase todas etapas da prova e só não foi na final porque não foi capaz de ser tão eficaz como é habitual, porque o Liverpool caiu implacavelmente em cima dele, porque o companheiro e deslumbrado Bale foi muito egoísta num momento preciso do jogo, e porque, a segundos do final da partida, quando Cristiano se preparava para finalizar boa situação de golo, um adepto resolveu invadir o relvado ali bem perto de Ronaldo e trazer atrás de si alguns desesperados seguranças.

Com ele é assim; é tudo incrível!