Futebol atípico
Em Portugal (como nos outros países europeus) o futebol tem de ser pensado com rigor, com previsões, com análises cuidadas
C OM o Mundial do Catar, tão do agrado do ex-presidente francês Sarkozy e do presidente da FIFA, os campeonatos de futebol vão tornar-se originais. Claro que, em função da importância do jogo, poder-se-iam criar experimentalmente campeonatos de escalões mais jovens, como prática que contribua para um crescimento da qualidade interna do futebol e não apenas por um Mundial, cujas alterações podem penalizar os melhores jogadores do mundo e as competições mais avançadas e qualificadas. Decidir um Mundial que vai obrigar a parar os campeonatos em cerca de um terço das competições europeias, pode ser inovação, empenho, mas também um descuido com extremos com que obrigam os jogadores a participar. Se a época europeia já é competição intensa, imaginemos agora o risco de lesões e de sobrecarga da densidade competitiva, com condições atmosféricas adversas para muitas equipas.
Claro que quem pode manda, mas as confederações continentais, em função de quadros competitivos de excelência, poderão criar riscos a muito jogadores. Parar campeonatos de meados de novembro a meados de dezembro, espaço do Mundial, certamente permitirá conclusões e justificações para que a transparência seja um facto indispensável e não uma coincidência forçada. Estamos todos expectantes para analisar criteriosamente a qualidade do jogo, as eventuais lesões, bem como as consequências que vão ultrapassar essa janela temporal e as conclusões das fases seguintes dos campeonatos, a todos os níveis. Para já fica a impressão de que os críticos mais duros não desperdiçarão a oportunidade de identificar as consequências e a partilha das responsabilidades, perante a ligeireza da análise do reforço dos Clubes-Estados.
O planeta não é um espaço idêntico mas um conjunto de realidades culturais, climáticas e desportivas, totalmente diversas, logo é imprescindível escolher os locais mais adequados em função das realidades do momento. O futebol é tesouro intemporal (e também negócio brutal porque imparável, envolvendo muitos milhões) que tem de ser acautelado e pensado com inteligência e pragmatismo. Caso contrário, imaginem que a FIFA propunha um Mundial nos países nórdicos, com dias e noites prolongadas e temperaturas rigorosas e extremas, independentemente da admiração e prestígio do seu esforço e valorização do jogo.
Em Portugal (como nos outros países europeus) o futebol tem de ser pensado com rigor, com previsões, com análises cuidadas das consequências e do fator de desenvolvimento sustentado. Muitas vezes, a questão, seja no futebol, nos governos ou grandes empresas, é a possibilidade de um grupo restrito decidir o que a maioria não concorda, porque considera uma desvalorização do jogo unicamente por receitas fantásticas e eventuais benefícios mútuos. Nas reuniões continentais e intercontinentais (UEFA, FIFA, etc.) os delegados dos diversos países estarão a defender o jogo ou a proteger a sua permanência? Com tantas competições, em vários escalões, masculinos e femininos, talvez fosse mais útil começar por aí. Porém, poderá haver poderes que o poder desconhece. Não é preciso recordar a investigação com consequências (incluindo prisões de quem se julgava intocável) e manter uma vigilância muito atenta.
A invasão da Ucrânia pela Rússia é um facto que continuamos a viver, que revela também a falta de solidariedade e respeito pelo outro, por ganância, egocentrismo ou até por memórias passadas que nunca voltarão, ao contrário dos pesadelos que são potenciados. Com tantas instituições, com inúmeros eleitos, os fóruns globais acabam, muitas vezes, por ser decididos por um grupo restrito que concentra o poder. E esses são os que decidem sem que todos os cidadãos lhes confiram esse poder. Logo, há uma ilusão que é apresentada como decisiva, sem que especialistas do jogo sejam ouvidos. É também isso que se passa na escolha deste Mundial-2022. Por isso, os cargos são assumidos por quem se consegue manter no cadeirão mais importante, com força para decidir e na saída, com um futuro eventualmente agradável. Havia presidente da FIFA que quando se deslocava aos diversos países exigia condições únicas, incluindo piscina exclusiva: a noção do poder pode fazer perder a razão…
Por vezes, as imagens criadas das personagens são estratégias muito apoiadas pela comunicação social e pelos líderes de países que, na maior parte dos casos, não corresponde ao ciclo conjuntural real. As imagens podem ser construídas de forma mais ou menos inteligente mas duradoura, dependente de quem é colocado no topo da pirâmide. Por isso falam pouco, apontam metas como se fossem oráculos infalíveis, embora o reverso possa ser uma enorme contradição. Isso passa-se no futebol mas também na política e noutros setores da nossa vida coletiva. Todas as escolhas revelam as tendências de quem as faz. A não indicação de um único árbitro português para o Mundial do Catar certamente tem aspetos que seguem uma linha objetiva: surpreende que portugueses na FIFA, em lugares de destaque, nunca se manifestem na defesa do nosso futebol e seus diversos agentes, porque não pretendem regressar à base nacional, agora que estão tão próximos do sol: cuidado porque podem derreter-se com as temperaturas elevadas. Um sinal de perplexidade surge quando alguém é selecionado para funções de responsabilidade e nunca comenta, nem pratica o diálogo. Portugal, qual enigma indecifrável no futebol, poderia ter mais importância a partir do momento em que, nos casos onde as nossas seleções são prejudicadas, soubessem denunciar as falhas decisivas e intoleráveis.
Além do Mundial, ainda a época está a dar os primeiros passos, com o regresso dos jogadores, nesta enchente de notícias que inundam os noticiários e jornais, aos estádios, para apoiar os nossos jogadores, num futebol onde os dirigentes consigam relacionar-se institucionalmente e sem provocações, porque têm de saber ser e de dar o exemplo. A verdade desportiva não é posse de ninguém em particular, mas unicamente da capacidade de imparcialidade e do respeito. O entendimento e relacionamento cordial e desportivo criam uma atmosfera que acaba por diluir a violência e potenciar o apoio constante sem conflitos. As polémicas com riscos imprevisíveis nunca serão o caminho para a vitória. Por isso, os clubes e os seus dirigentes máximos têm de manter ambiente cordial. Mais do que queixas sistemáticas de arbitragem (cada um só vê uma parte) é urgente que se consiga evitar a escalada de violência, como já existe em países próximos. E isso só se consegue respeitando os intervenientes, puxando pela sua equipa, mas acabado o jogo, evitando confrontos e estar sempre ao lado dos seus jogadores: ninguém como eles quer vencer todos os jogos.
A contradição que permanece é que o preço dos bilhetes no Catar atinge valor elevado, com condições desumanas impostas aos trabalhadores que construíram os estádios. Lá dentro está quem pode pagar esses preços, os outros poderão ver na televisão: para já foram vendidos 1,2 milhões de bilhetes! O mundo continua um mosaico de contradições e o futebol ainda se mantém como momento de sonho e de unidade. O jogo é um tempo/espaço de situações únicas, de inteligência em movimento, de cooperação e unidade, de honrar a camisola de um país que os escolheu para sentirem que atrás deles estão os seus compatriotas. O Mundial-2022 pode não ser do meu agrado, por diversas situações que não deveriam ter existido, mas enquanto durar, todos vamos torcer pela bandeira que nos une e pela qual sentimos o que é a nossa pátria. Independentemente do resultado, as cores diluem-se e os sonhos podem transformar-se em momentos únicos e emocionantes.
REMATE FINAL
O treinador neerlandês Co Adriaanse visitou a cidade do Porto e, logicamente, foi visitar o Olival e o Estádio do Dragão, num reencontro com o presidente do FC Porto. Em 2005/2006 conquistou a dobradinha e deixou comentário preciso e verdadeiro: «O FC Porto não é um clube, é uma família.»
Sérgio Conceição afirmou. «Aqui não há onze titulares, há 26 que lutam pelo lugar», assim iniciou a sexta época consecutiva.
O FC Porto continua num destino de títulos, em várias modalidades: o mais recente campeão europeu de bilhar às três tabelas.
O diretor executivo da Associação das Ligas Europeias pretende mudança estrutural na distribuição das receitas das provas da UEFA. Defendeu uma contribuição maior, destinada aos clubes não participantes.
A GNR vai utilizar drones para vigiar os estádios. Contudo, a captação de imagens só será feita na vertical, sem permitir a identificação das pessoas. Não se poderia legislar mais além, nos casos mais violentos?