Football Talks e Thinking Football

OPINIÃO22.11.202205:30

Futebol só tem a ganhar quando perceber que as instituições estão acima das pessoas, egos e motivações

SÃO nomes de alcance internacional aqueles que, estrategicamente, deram lugar a dois grandes eventos realizados em Portugal nos últimos tempos. O Football Talks, que decorreu em setembro com a chancela de qualidade da FPF, deu voz a um conjunto de personalidades que partilharam a sua visão sobre temas tão abrangentes como a infância e o crescimento, a qualidade do jogo, a introdução da tecnologia, a sustentabilidade do ecossistema. O Thinking Football Summit, no fim de semana, foi organizado de forma superior pela Liga Portugal e contou também com dezenas de oradores das mais diferentes áreas, que refletiram sobre assuntos relevantes do futebol profissional em Portugal.

O nível qualitativo dos dois eventos foi de tal forma elevado que se configurasse um jogo de meninos, daqueles em que se quer perceber quem fez mais e melhor, o resultado seria um empate técnico.
Tive o privilégio de ser convidado para os dois na qualidade de membro do Conselho Nacional do Desporto e garanto-vos que ambos foram experiências muito enriquecedoras e didáticas: num e noutro surgiram testemunhos de pessoas que dominam, com mestria, a sua arte, sendo que essa girou quase sempre em torno daquela que é a nossa maior paixão: o fantástico mundo do futebol.

No evento realizado na Cidade do Futebol tive a oportunidade de assistir a um debate muito interessante em que, para além de Rui Vitória (treinador), João Cartaxana (jornalista) e Tarantini (ex-jogador profissional), participou também o árbitro internacional Luís Godinho. Foi muito bom perceber o que tem para dizer quem está na linha da frente de uma atividade permanentemente criticada e sob forte suspeita. As pessoas gostam de ouvir falar os árbitros que estão no ativo. Identificam-se com eles, com as suas histórias e perspetivas, ainda que uns dias depois, num qualquer estádio, os chamem de ladrões ou corruptos. Mas quando eles falam, elas escutam e isso garantidamente humaniza-os.

Infelizmente não tive a mesma felicidade no certame organizado pela Liga Portugal.
O Conselho de Arbitragem da FPF entendeu declinar o convite oficial dirigido pelo futebol profissional, no caso para assistir e até integrar painéis onde se refletiria sobre temas relevantes e atuais. Essa indisponibilidade estendeu-se também aos árbitros que foram convidados como oradores. Ainda assim, não foi tudo mau: houve quem aparecesse como espetador e assistisse a algumas sessões, como aquela em que foi prestada homenagem a um presidente de uma sociedade desportiva. Mas, na verdade, esperava-se outro tipo de presença da estrutura e dos seus mais ativos representantes.

A arbitragem portuguesa de topo não pode desperdiçar a oportunidade de mostrar a sua face em momentos destes, onde a sua integridade jamais seria beliscada ou melindrada. Este summit, tal como o Football Talks, seria perfeito para o fazer, porque ninguém ali queria saber de penáltis polémicos, expulsões controversas ou intervenções do VAR. Quem lá estava queria apenas perceber, aprender e ouvir a opinião de quem sabe. Vejam o exemplo do râguebi, que enviou ao evento o melhor árbitro português da atualidade, por entender que aquele era o palco ideal para explicar a tecnologia que é utilizada na modalidade. A verdade é que toda a gente ficou encantada com a intervenção do internacional Paulo Duarte.

Tal como a disciplina, a arbitragem é um órgão autónomo e independente, que tem capacidade para decidir quais os passos que deve dar no sentido de se credibilizar, de mostrar que tudo o que acontece na sua casa é claro e transparente. Todas as opções são legítimas, mas aquelas que se tornam recorrentes e sistemáticas abrem margem para especulações que todos dispensamos. O futebol tem tudo a ganhar quando perceber que as instituições estão acima das pessoas, dos seus egos e motivações.