Falta plantel a Schmidt
Basta mudar um peça para haver ruídos na eficiente e harmoniosa laboração da máquina de bom futebol que o Benfica tem exibido
E MPATAR em Moreira de Cónegos e falhar o primeiro título da época foi motivo para encher o espaço do comentário futebolístico com opiniões premonitórias de fortes tempestades no voo da águia, até agora tranquilo e seguro.
Tratou-se de um percalço, embora nada surpreendente em função da história de um jogo que foi interessante e rijamente discutido. Roger Schmidt não gostou do resultado, mas não culpou os seus jogadores. Esforçaram-se, é certo, mas deparou-se-lhes um Moreirense organizado, lúcido e naturalmente motivado por defrontar o Benfica. Foi admirável a resposta que o pessoal de Paulo Alves deu. Um treinador do qual guardo a melhor das impressões, por ver nele alguém que não tem por hábito pôr-se em bicos de pés para se insinuar. Está a fazer bem o seu trabalho, não se estranhando, por isso, que lidere a classificação da Liga 2 e com legítimas ambições de rápido regresso ao campeonato principal.
O Benfica ainda não perdeu em jogos oficiais, mas não é invencível, porque não existem equipas invencíveis, e mais tarde ou mais cedo alguém irá desfrutar do privilégio de lhe infligir a primeira derrota. É por ter a perfeita noção dessa realidade, aliada a outros fatores, que o treinador alemão, com inteligência e sabedoria, aproveitou o bom momento dos seus jogadores para amealhar o máximo pecúlio possível e erguer uma barreira de segurança que lhe permita resistir com o mínimo de conforto a eventuais quebras de rendimento do seu plantel no futuro próximo. Que podem verificar-se ou não. Portanto, os exercícios de retórica que sentenciam uma aterragem forçada da águia, para já, não passam de conversas de chacha. Ou será que depois da paragem por causa do Mundial no Catar só o Benfica estará condenado a descer de rendimento e todos os outros a subir?
O empate em Moreira de Cónegos pode não ter agradado à família encarnada, mas não foi consequência de menor aplicação dos jogadores. As coisas são como são e quando se avança para um compromisso decisivo, como este, com plantel ainda deficitário na relação qualidade/quantidade e sem quatro titulares indiscutíveis (Otamendi, Enzo Fernández, João Mário e David Neres), abre-se a porta a uma corrente de ar inconveniente, como se viu. Em concreto, os substitutos chamados à titularidade não fizeram esquecer os ausentes. Nem Morato, demasiado inquieto, nem Draxler, com vontade mas desenquadrado, nem Chiquinho, claramente de menos se comparado com o argentino eleito no domingo como melhor jogador jovem do Mundial.
Não digo que jogaram mal, mas apenas acrescentaram banalidade ao coletivo e talvez devido isso não seja estranho o facto de, por mais de uma vez, Roger Schmidt se ter referido à necessidade de enriquecer o plantel com outras soluções. Porque equipa ele já tem, mas basta mudar-lhe um peça para haver ruídos na eficiente e harmoniosa laboração da máquina de bom futebol que o Benfica tem exibido.
A uma boa equipa deve corresponder um bom plantel, mas não é esse o retrato que se pode tirar. Foi feito intenso trabalho para reduzir o orçamento e libertar o clube de contratações que apenas acrescentavam despesa. A casa estava desarrumada na área do futebol profissional, como se percebe, e reconstruir uma equipa não se resolve com golpes de magia.
ESTE jogo com o Moreirense foi importante por ter denunciado fraquezas ainda mal assumidas na organização encarnada e, como tal, deve ser acolhido como oportuno instrumento de análise, tal como sugere o diretor de A BOLA, João Bonzinho, em editorial, na edição do último domingo:
«O Benfica voltou a deixar o preocupante sinal já tantas vezes dado esta época - desperdiça muito para o tanto que cria. Pode a águia lamentar a tremenda exibição de Mateus Pasinato, o guarda-redes do Moreirense? Claro que sim. Mas não deve, igualmente, meter a cabeça na areia e achar que foi por falta de sorte que não bateu o determinado, lutador e muito competente Moreirense.»
O Benfica saiu da Taça da Liga e cada qual atribuir-lhe-á o significado que quiser. É um título que se esvai, mas, para quem está nos oitavos de final da Liga dos Campeões com legítimas aspirações de chegar mais longe e lidera o Campeonato com apreciável vantagem pontual que lhe permite o mínimo de segurança para se proteger de eventuais sobressaltos, não me parece que este afastamento tire o sono ao treinador alemão.
Em matéria de problemas, como alvitrou o mister Vítor Manuel, anteontem, nas agradáveis noites de A BOLA TV, a prioridade da administração da águia é segurar Enzo Fernández no mercado de janeiro.
Caso contrário, corre o risco de sujeitar-se ao aborrecimento de receber 120 milhões de euros, o valor da cláusula. Que belo problema…