Exemplo a seguir
Em Inglaterra houve coragem para dar murro na mesa, houve avaliação, estratégia e ação
NO Newcastle- Tottenham um adepto sentiu-me mal nas bancadas e precisou de assistência médica urgente.
A gravidade da situação foi evidente e chegou aos jogadores, que de imediato pediram ao árbitro para parar o jogo.
As duas equipas concordaram, Andre Marriner acedeu e a partida esteve interrompida o tempo necessário para agilizar o tratamento ao espectador. A equipa médica atravessou o relvado (porque podia) e, de desfibrilhador na mão, chegou ao local o mais depressa possível. Esse pormenor pode ter sido suficiente para salvar a vida àquela pessoa.
O estádio estava cheio, os novos donos do Newcastle estavam nas bancadas, a equipa da casa perdia por 1-2 e o jogo estava a ser transmitido em direto para dezenas de países em todo o mundo. Nada disso impediu todos os intervenientes de fazerem a escolha certa. A escolha ética e moralmente correta.
Não é o primeiro, o segundo ou o quinquagésimo exemplo fantástico que vemos acontecer na Premier League.
Esta cultura desportiva, agora de classe superior, não existiu sempre. Nos anos 80, o futebol inglês era o pior do mundo no que diz respeito a violência e qualidade de jogo. Quem não se lembra do jogo direto, com bola pelo ar e canela até ao pescoço? E quem se pode esquecer da tragédia de Hillsborough, que matou 97 adeptos e feriu quase 800 pessoas?
O que se passava no futebol inglês era tão mau e escabroso, que toda a gente o chamava de English disease.
Depois de muita pancadaria, muitas invasões de campo, muitas vedações à volta dos relvados e muita barbárie dentro e fora dos estádios, o governo inglês decidiu colocar um ponto final no assunto. A Sra. Thatcher utilizou o grave incidente de Sheffield como forma de executar o plano que traçara há muito tempo e que visava uma reformulação profunda do futebol: mais profissionalismo de todos os agentes desportivos, menos gente aglomerada nas bancadas, lugares sentados e em segurança, abertura total ao marketing, preços mais caros com pacotes de entretenimento familiar, etc, etc.
A resistência que encontrou por parte de alguns clubes foi enorme: a venda maciça de bilhetes era uma receita tremenda, mas a verdade é que com mais ou menos rigor, com mais ou menos equilíbrio, o futebol inglês tornou-se na indústria mais completa, segura e profissional do planeta. Na mais rentável também. É por isso que hoje todos lhe prestam homenagem, ainda que sabendo que o Relatório Taylor possa ter encoberto a atuação das forças policiais, responsabilizando injustamente os adeptos do Liverpool pelas mortes ocorridas naquele dia fatídico.
Houve coragem para dar o murro na mesa, houve avaliação, estratégia e ação. A verdade é é a mesa ficou melhor do que estava.
Lembrei-me desta história a propósito das cenas de faroeste que aconteceram, este domingo, no Montijo.
Não importa se a culpa foi do árbitro, dos jogadores, treinadores, adeptos ou até da polícia. Não importa sequer porque aconteceu. Quem de direito que o analise e responsabilize com justiça e celeridade.
O que importa é que aconteceu. Aquilo que todos vimos aconteceu mesmo, num jogo de futebol, em Portugal. Num jogo que tinha famílias com crianças nas bancadas.
Aconteceu num jogo de futebol.
E agora?