Abril de 2011. O FC Porto jogava a 2.ª mão dos ‘quartos’ da Liga Europa contra o Spartak. Por lapso, reservaram-nos hotel perto do Estádio do Lokomotiv quando devíamos estar nas cercanias do Luzhniki, no lado oposto de Moscovo. Precavidos, o Carlos P. Santos, eu e o Paulo Esteves saímos de táxi para a conferência de imprensa de Villas-Boas com sólidas três horas de antecedência. Por coincidência, naquele dia, todos os moscovitas saíram de onde estavam também com três sólidas horas de antecedência. Ao cabo de duas horas no táxi, o Carlos e atira-me a ordem:- Isto está um caos. Vê nesse mapa manhoso do hotel onde estamos.- Sei lá, está em cirílico...- Não me falas assim! Oh, tu (para o taxista), Luzhniki, longe, perto, far, very far, très loin? Como se diz rápido em russo? – pergunta-me.(Ia dizer Perestroika, para o picar, mas calei-me bem caladinho).- Olha lá, táxi. Luzhniki, estás a ver? Niet, niet, niet, já, já, já!!- Mas niet é não em russo – retorqui.- Que se lixe! Niet, niet, niet! Certo é que a partir daquele momento já não ia um russo ao volante. Era o Ayrton Senna. Tantos vermelhos queimados. Coitadas das velhinhas nas passadeiras. Chegámos a meio da conferência de Villas-Boas. Os camaradas passaram-nos as gravações sem termos de as pedir. Aviada a reportagem, soltei a língua:- Oh Carlos? Niet?- Era isso ou vodka. Ou sabes mais alguma coisa em russo? Divertimo-nos muito nessa noite. Divertimo-nos sempre. O Paulo partiu deste mundo em 2016, uma dor que subsiste. O Carlos, meu mestre e padrinho, nome grande do jornalismo, deixou-nos órfãos da sua escrita criativa e refinado humor na segunda-feira. Ficam as histórias para nos abrir o sorriso e aquecer o coração. E são tantas.
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