Começar a segunda volta com o pé direito

OPINIÃO19.01.202205:55

Além da vitória em Vizela e do regresso de ‘pote’ aos golos, o Sporting prepara as eleições com tranquilidade e com um vencedor antecipado

Avitória por 2-0 no estádio do Vizela teve apenas um senão: a confusão final. É certo que, como Rúben disse, Nuno Santos não pode atuar daquela maneira. Menos certo não é, como disseram todos os especialistas em arbitragem, que a reação de Guzzo ao que ele fez merecia cartão vermelho. Mas adiante: o Sporting voltou a distanciar-se do terceiro, o Benfica, e mantém a perseguição ao FC Porto. Neste sábado, em casa e frente ao SC Braga, volta a jogar-se muito. É que apesar de os bracarenses andarem em tempos menos bons são uma das grandes equipas do campeonato, e é preciso não perder isso de vista. O Benfica, que visita o Arouca, e o FC Porto que recebe o Famalicão, têm jogos, à partida, mais fáceis.
Na frente interna, a entrevista de Frederico Varandas à CNN a anunciar o que já sabíamos - que se recandidata - foi relativamente pacífica. Separou o Sporting dos rivais no que toca a procedimentos e práticas menos compreensíveis, prometeu continuar a diminuir o autêntico fosso que parecia instalado entre Alvalade, Luz e Dragão. Se tem mais dificuldade em defender algumas opções antes da chegada de Rúben Amorim, daí para a frente a vida de Varandas, se não foi um mar de rosas, foi, seguramente, melhor do que ele próprio imaginaria. Esse mérito é também dele, pelo que é justo que o partilhe.
As críticas duras a Pinto da Costa e o facto de não se dizer surpreendido com o que aconteceu a Vieira e ao Benfica parecem-me corresponder ao pensamento de larga margem dos sportinguistas. E até o apelo a que não se ridicularizem mais as figuras patéticas de Bruno de Carvalho, em nome do Sporting, me pareceu avisado.
Lamento, mas compreendo, a saída de Rogério Alves e a ascensão de João Palma a PMAG. A substituição de Baltazar Pinto no CFD por João Teives, o seu número dois naquele órgão, parece-me normal, e uma solução de continuidade. Gostaria, no entanto, que Teives, já com a casa mais arrumada e os ânimos mais serenados, pudesse ser um ator fundamental na mudança estatutária e organizacional de que o Sporting necessita. Certamente terá oportunidade de pensar nisto depois das eleições, com quatro anos muito menos turbulentos pela frente, e com a necessidade de modernizar vários aspetos da vida associativa.
Sobre isso tenho escrito por diversas vezes, e volto já hoje ao assunto, a respeito do que, ainda na semana passada escrevi.
 

Confusão no final do Vizela-Sporting, que acabou com vitória dos leões


VOTO E ELEIÇÕES 

HÁ oito dias manifestei-me contra a ideia de existir «um homem, um voto» no Sporting, como defende a lista de Nuno Sousa, que se opõe a Varandas. Como seria de esperar, tive direito aos habituais insultos nas redes sociais; felizmente cada vez menos, e com menos ameaças. O que mais me motivou a responder foi um tweet de um senhor, aparentemente adepto do FC Porto, que diz o seguinte: «Quando a noção acaba sobra a estupidez, mesquinhice, burrice ou a (vou omitir a favor da minha mãe)… e temos os Henrique Monteiro desta vida! A verdadeira democracia não é um sócio = 1 voto, é um sócio = 10, 20, 30 votos» Na linha seguinte indaga: «FC Porto quando processam estas cavalgaduras?»
O senhor teve uns aplausos, pessoas a dizer-lhes que sou um boi disfarçado de jornalista ou outros a acrescentar que eu não «vou lá» com processos, é mesmo para dar cabo dos meus celebrados cornos.
Pois estes senhores, avisados, cultos e abertos à discussão, não sabem grande coisa. Não lhes respondo; mas porque pode haver gente bem intencionada que não entende a razão de num clube um sócio poder ter mais de um voto, vou colocar as coisas o melhor que posso, nos seus devidos termos.
Parece muito democrático cada sócio ter seu voto. Parece mesmo indiscutível. A democracia, porém, é uma forma de escolher quem governa uma cidade, uma região, um Estado. Por algum motivo, que não está em causa, cidadãos com menos de uma determinada idade não votam. Acresce que numa democracia política (que não é o caso dos clubes, das associações, das empresas, dos prédios, etc.), não há, nem pode haver, discriminações em nome dos investimentos, impostos pagos ou fortuna arrecadada.
Aliás, ninguém escolhe o local onde nasce, embora possa naturalizar-se e tornar-se votante. Para que tal ocorra, porém, também há tempos a respeitar, mesmo que essa pessoa seja honesta, séria e irrepreensível. De outro modo, uma invasão de estrangeiros poderia tomar conta de uma cidade ou de um país.
Já num clube, uma pessoa investe. Paga para ser sócio. E nas sociedades e empresas, ou mesmo nos condomínios, o número de votos está em relação direta com o investimento feito. Vejamos, de acordo com o Código Civil pagam-se as áreas comuns de um prédio de acordo com as chamadas permilagens; ou seja, que área/investimento cada condómino fez.
Como todos sabem, assim é nas empresas: mais ações, mais votos. Ora, numa associação, além do período de carência em que o sócio não pode votar (normalmente um ano) é prudente que a antiguidade reforce o poder dos sócios nas AGs. Porquê? Porque, por um lado, um sócio que investiu 20, 30 ou 50 anos num clube, até pode estar menos apaixonado, mas colocou lá muito mais dinheiro. Por outro, porque tende a identificar-se muito mais com os fundamentais do clube - a sua história, a sua idiossincrasia, a fidelidade a princípios. O sócio antigo não é arrebatado por uma direção, um presidente, uma boa época. Passou por muito - por alegrias, tristezas, azedumes, guerras. Pretender que ele deve ter apenas o mesmo poder de quem tem um ano de sociedade, e pode ter ido para lá arrastado por uma conjuntura (líder, vitórias, o que seja) que não marcam várias décadas de uma associação, parece democrático, mas não é. 
Também não me escapa o ataque partir de portistas, que têm o sistema um sócio = um voto. Isto, porque no texto da semana passada ressaltei que com esse método tão democrático têm o mesmo presidente há 40 anos. 


DISCUTÍVEL? 

TUDO o que acabo de escrever é, naturalmente, discutível. Mas não nos termos obscenos e ofensivos como saiu à praça. Penso ter deixado o meu pensamento claro, e aceito todas as objeções que entendam aqueles que discutem com argumentos.
Aliás, outros pontos há nos estatutos que já referi diversas vezes, e que me parece ter o Sporting o dever de ser pioneiro na sua aprovação.
A começar pela classe dos sócios comissionados, ou seja, os que representam o conjunto do clube na AG: entre eles deveriam existir, na proporção dos votos que representam, sócios com antiguidades diversas, podendo depois essa AG decorrer, aí sim, no sistema um sócio = um voto. 
A ideia de haver sócios comissionados, ou representantes de outros, eleitos por método de Hondt, com votos diferentes consoante a antiguidade, não impede que a AG que daí resulte não tenha uma maioria de sócios recentes… aliás o mesmo se passa nas direções. Porém, foram escolhidos de acordo com uma regra democrática; não da democracia política, mas democracia associativa, que é semelhante à da vizinhança ou das empresas.
Outro ponto, além da separação da eleição da Comissão Fiscal e da Comissão Disciplinar, que deveriam ser duas, ambas eleitas por método de Hondt, para poderem controlar os atos da direção, será uma segunda volta para a decisão de quem dirige o clube. Muitas vezes um candidato terá mais de 50 por cento e o assunto fica arrumado; mas outras tem havido, e haverá, em que ganha quem não teve a simpatia (à partida) da maioria do clube.  
 

JOGAR FORA 

Benfica – Quem sou eu para escrever sobre um clube que nunca foi o meu, contra o qual quase sempre torci, mas onde tenho bons amigos? De qualquer modo, aqui vai: talvez os encarnados se tenham precipitado ao querer resolver demasiado rápido a substituição de Luís Filipe Vieira; talvez um pouco mais de calma lhes desse mais frutos no futuro, e não menos no presente.

Lewandowski – Ganhou, pela segunda vez o ‘The Best FIFA’, o prémio do melhor jogador do mundo - que neste momento parece ser. Messi, que tinha injustamente ganho ao polaco a Bola de Ouro, organizada pelo ‘France Football’, ficou desta vez em segundo. Não há dúvida de que, apesar de ainda serem fenómenos, o tempo de Ronaldo e Messi está a passar. Mbappé e Haaland já se perfilam na sucessão.

Aplauso – Uma vez mais para o comentador de arbitragem Duarte Gomes, por afirmar que o excesso (sublinhe-se o termo) de silêncio dos árbitros e seus organismos permite que as perceções se sobreponham às leis e regras a que os juízes estão sujeitos. E concordo com ele: por muito irritados que fiquemos, a maioria dos árbitros não é desleal, nem corrupta, nem incompetente.