OPINIÃO Amorim acumula milhas
Se é para ter um treinador com as malas feitas, então mais vale assim
Não existem campeões injustos em maratonas de agosto a maio, mas o Sporting fez questão de afastar dúvidas com passada firme e constante. Nem a proximidade temporal das derrotas na Luz e em Guimarães fez abrandar o leão, muito menos o adiamento do jogo em Famalicão, que só disfarçou o prejuízo do rival Benfica. É incontornável a influência de Gyokeres na evolução de uma equipa que ficou em quarto lugar na Liga 2022/23, mas a caminhada verde e branca jamais se resumiria a um nome. Pelo menos do plantel.
É impossível minimizar os méritos da administração liderada por Frederico Varandas e também da direção desportiva de Hugo Viana, mas a grande figura do campeão é, incontornavelmente, Rúben Amorim. Na quarta época completa no banco leonino consegue festejar o segundo título de campeão nacional, para além de ter duas Taças da Liga e uma Supertaça.
Amorim encontrou um clube dividido e foi recebido com desconfiança pelos adeptos leoninos, até pela ligação sentimental ao Benfica, que nunca renegou, dentro de uma postura de abertura e frontalidade que ajudou a reunir apoio, embora o mais importante tenha sido o crédito dado pelos resultados positivos.
Quatro anos depois, só mesmo uma visão distorcida da rivalidade pode fazer com que Amorim não seja devidamente reconhecido como leão de mérito. Ou isso ou uma perspetiva mais ressentida das movimentações que, há algumas semanas, deixaram a indicação de que o técnico estava de saída de Alvalade. Uma intenção revelada pelo próprio, que ainda antes de assegurado o título cedeu à tentação de uma viagem rápida a Inglaterra que não teve o desenvolvimento desejado.
Consumado o regresso da equipa leonina à Praça Marquês de Pombal, até os jogadores aderiram à manifestação dos adeptos em prol da permanência do treinador. Amorim não ficou pela piada, arriscou um compromisso, e ao largar o microfone deu um enquadramento mais afirmativo à declaração final. O plano é ficar em Alvalade e atacar o bicampeonato que o Sporting não conquista desde que foi tetra nos anos 50.
As leis do mercado obrigam a encarar o discurso como uma declaração de intenções, e não mais do que isso, mas Amorim estará convencido de que já não consegue bilhete para um daqueles destinos de sonho, e por isso mais vale continuar a acumular milhas em Alvalade, à espera que o avião volte a passar. A tendência é pensar que tem mais a perder do que a ganhar, tão alta está a fasquia, mas parecem existir condições para dar continuidade ao projeto, por mais que seja preciso acautelar eventuais saídas, inclusive de jogadores no núcleo duro em fim de ciclo.
A viagem a Londres não passou ao lado dos adeptos, apesar do clima de festa, mas a permanência de Amorim só pode reforçar a ambição deste Sporting. Se é para ter um treinador com as malas prontas, antes assim.