Alcançar o Porto e manter o Benfica à distância
Paira no mundo a incerteza e as aves agoirentas da guerra. Tudo o resto se submete, ainda que se tente manter a normalidade
RARAS vezes fiquei entusiasmado com o que se passa na Luz, salvo se o Sporting lá ganhar, o que não tem sido comum. Mas perante a homenagem que o Estádio - os benfiquistas, nas sua maioria - fizeram à Ucrânia por intermédio do seu jogador Roman Yaremchuk senti-me em comunhão com todos os que estavam naquelas bancadas. Sim, o futebol desperta paixões e irracionalidades, mas temos de saber mantê-lo no seu devido lugar. Muito mais nos une do que nos separa e, perante a barbárie, aplaudimos aqueles que a ela resistem.
Voltarei, mais à frente, ao tema, para agora falar de resultados e de jogos. Desde logo, o desta noite contra o Porto, na primeira mão das meias-finais da Taça de Portugal. Primeiro ponto: não entendo por que razão uma eliminatória a duas mãos tem tal intervalo no tempo - de hoje, data da primeira mão em Alvalade, até 20 de abril, quando se jogará a segunda mão, no Dragão. A ideia de uma competição a eliminar ou é feita a uma mão, ou, se a duas, num espaço de tempo relativamente curto: duas a três semanas, como na Champions. Fazer mediar sete semanas entre as duas mãos, como na Taça de Portugal, pode ser obrigatório, devido aos calendários complicados, mas retira o espírito da competição. Em sete semanas as equipas, que entretanto jogaram diversas vezes, podem estar completamente diferentes, seja por lesões castigos, ou outros acontecimentos. Talvez só uma mão em campo neutro pudesse resolver o problema…
De qualquer modo, o Sporting, que muitos deram por acabado depois de um empate com o Marítimo (as Regiões Autónomas foram madrastas para o meu clube, perdendo nos Açores e empatando na Madeira), reviveu quando viu o FC Porto empatar em casa com o Gil Vicente, depois de 90 minutos a jogar contra 10. O treinador portista disse que o pior que lhe aconteceu foi jogar contra 10 mas os factos, salientados aliás por Miguel Braga, diretor de comunicação do SCP, demonstram que no Dragão também o Porto acabou a jogar contra 10 quando lá foram Benfica, Sporting e Guimarães.
Ao contrário, o Sporting, que jogou contra 11, teve um azar terrível, quando o remate de Porro pareceu bater em tudo quanto era preciso bater para não entrar na baliza, e quando nem o árbitro nem o VAR viram, ou consideraram, um penálti contra o Marítimo, no fim do jogo. Não digo que perdemos pontos por isso, porque temos de jogar melhor; mas também perdemos pontos por isso.
UMA JORNADA PARA O BENFICA
EST jornada 24 foi, assim, claramente benfiquista. Talvez quem comanda os desígnios (não me refiro ao Conselho de Arbitragem, nem nada disso, mas a algo mais próximo dos deuses do Olimpo) tivesse determinado que todos os adversários diretos da equipa da Luz perdessem pontos. E assim foi: ao ganhar 3-0 ao Guimarães, no tal jogo em que se homenageou Yaremchuk, os encarnados ganharam dois pontos ao Porto, que empatou com o Gil; dois pontos ao Gil, que vai em quinto; dois pontos ao Braga, que empatou em casa com o Santa Clara, e dois pontos ao Sporting, que empatou com o Marítimo. Ou seja, dos cinco primeiros foi o único que não empatou; assim sendo, diminuiu a distância para o primeiro (10 pontos), para o segundo (quatro pontos) e aumentou a distância para o quarto (nove pontos) e para o quinto (13 pontos). Quando há 30 pontos em jogo no campeonato, ainda lhe é possível sonhar… Mas ganhar o campeonato é uma miragem, porque além de apanhar o Porto, fazendo-o perder 10 pontos, tinha que levar o Sporting a perder quatro. Mas a situação para o Sporting não é muito melhor. O FC Porto vai a seis e o Benfica persegue a quatro. A minha equipa está assim na situação do célebre polícia da revista O 31, de onde vem o célebre fado com o mesmo nome. Dizia o protagonista qualquer coisa como isto: «Para se ser polícia em Lisboa, há que ter um olho à frente e outro atrás.» Ora o Sporting, enquanto põe os olhos no Porto e nos seus desaires, tem de olhar o Benfica que vem atrás, sob pena de perder o segundo grande objetivo da época: o lugar na Champions. Claro que ganhar o campeonato pelo segundo ano consecutivo, depois de 67 anos sem o conseguir, é glorioso. Mas para efeitos de dinheiro ir diretamente para a fase de grupos da Champions é magnífico.
A próxima jornada, em que o Sporting recebe o Arouca e o Benfica vai a Portimão, no sábado, e o Porto, no domingo, se desloca a Paços de Ferreira, é já um teste. As apostas normais diriam que todos vencem as partidas. Mas o Arouca está à beira dos lugares de despromoção; o Portimonense venceu o Benfica na Luz e o Paços de Ferreira começou a ganhar no Dragão, e não foi com facilidade que o Porto deu a volta. Nas últimas 10 jornadas nada é fácil.
Remate de Pedro Porro na Madeira bateu na trave e no poste. Faltou estrelinha ao Sporting
O QUE É UM CLUBE DE FUTEBOL?
A S eleições no Sporting, já no sábado que vem, têm levantado assuntos interessantes. Como já afirmei, do meu ponto de vista o atual presidente Frederico Varandas tem condições para as ganhar facilmente e - se me é permitida uma opinião pessoal - merece ganhá-las.
Posto isto, não entendo que os outros candidatos não tenham legitimidade e que as suas propostas não sejam interessantes. De Ricardo Oliveira (de quem na semana passada me enganei no nome do meio, chamando-lhe Ricardo Soares Oliveira e não, como deveria ser, Ricardo da Silva Oliveira) já aqui referi pontos com os quais concordo. De Nuno Sousa ainda não referi nenhum. Nem o farei. Aliás, basta-me saber quem é o sócio (membro da lista recusada de Bruno de Carvalho, em 2018) e quem com ele está, como o ex-deputado Hélder Amaral, que até ao fim defendeu num canal de televisão (CMTV) o malfadado ex-presidente, para não desperdiçar tempo e espaço neste jornal com tais personagens.
Porém, há algo que José Dias Ferreira (apoiante de Ricardo Oliveira, salvo erro) aqui escreveu há uns dias cuja ideia apoio com entusiasmo. Mesmo nestes tempos sombrios em que sabemos que o português (salvo seja!) Abramovich teve de largar o Chelsea, há que entender o que é um clube de futebol. Ora, a ideia de o clube ter de ser dos adeptos é algo antiquado como bem argumentou Dias Ferreira. Na Inglaterra, as grandes equipas são de entidades estranhas ao país, e o apoio e entusiasmo mantém-se. Basta ver os estádios cheios, a qualidade das equipas. Em Portugal, o Sporting a jogar contra o Manchester City (que é de um multimilionário, Mansour bin Zayed Al Nahyan, da família real do Abu Dhabi) perdeu 0-5. E perdeu por vários motivos, o principal dos quais é que eles são melhores. O sheik Mansour é dono de vários clubes e não parece que os apoios tenham diminuído. Em boa verdade, clubes como os nossos e mais alguns, sobretudo em Espanha, apenas votam em quem vai neles mandar. Só que, no geral (e neste momento o Sporting é exceção, quero crer), votam não em quem vai colocar dinheiro no team, mas em quem vai tirar de lá vantagens.
É por isso que a conversa de um clube de sócios (e eu tenho mais de 50 anos de associado) não me comove. Prefiro um Sporting ganhador e que seja capaz de vender a maioria da SAD não a qualquer um, mas a alguém que apresente garantias. É pena que no debate dos candidatos, há oito dias, aos três concorrentes, ou pelo menos aos dois sérios (excluo Nuno Sousa), lhes faltasse um pouco de coragem para falar nisto a sério e se mantivessem com a história dos VMOC (valores mobiliários obrigatoriamente convertíveis) como se não soubessem que os nove milhões de lucro anunciados neste último trimestre nem para a compra de um jogador banal chegariam.
Eu sei que isto é impopular, mas é o que é.
RÚSSIA FORA
Não foi só o futebol - e aqui regresso ao tema - que colocou a Rússia fora das competições. Foram quase todos os desportos, dos motorizados, aos mais populares, depois do futebol, como o andebol, o basquetebol, o râguebi, o voleibol, o ténis, o desporto automóvel… o comité olímpico; enfim, foram todos. A sanção não é sobre os atletas; são armas para os atletas terçarem com o regime.
SOLIDARIEDADE
Alegra-me que a Fundação Sporting esteja também envolvida no apoio à Ucrânia, neste caso com ajuda em bens alimentares. Um grande clube tem muitas facetas na sua ação. A solidariedade não poderia deixar de ser uma delas.
FUTSAL
Logo nesta crónica que comecei tão simpático com o Benfica, não podia deixar de assinalar o quanto me regozijei com a vitória do Sporting na Taça da Liga de Futsal. 5-2 contra o Benfica, magnífico resultado de uma equipa que, entre os grandes clubes, foi o primeiro a apostar a sério na modalidade.