Afase de preparação para a época oficial que se avizinha serve para fazer correções, acolher gente nova e fortalecer o espírito de grupo, razão pela qual a nação benfiquista não deve sobressaltar-se por causa de duas derrotas, diante do Burnley e, anteontem, com o Feyenoord. Antes agora, em período de afinações, do que quando começar a competição a sério, dentro de uma semana. O que surpreende, e deve ser tema de análise, é o facto de, como escreveu Vítor Serpa no seu editorial de ontem, em A BOLA, o Benfica ter, indiscutivelmente, melhor plantel e estar a jogar pior futebol. Uma evidência gritante e geradora de natural perplexidade, tanto mais que está próximo o jogo com o FC Porto. Neste teste com o campeão holandês, uma das fraquezas da águia mais amplamente expostas foi a sua inaptidão para combater e anular a pressão contrária. «Uma exibição pálida que deve acender alguns alertas porque já começa a ser um padrão: os encarnados sentem muitas dificuldades perante equipas com linhas subidas e aguerridas», escreveu o jornalista Fernando Urbano, enviado-especial de A BOLA. FOI assim na época transata e nenhuma melhoria efetiva se vislumbra. É uma deficiência que se mantém e se questiona, prova de que Roger Schmidt não levou na devida conta o sufoco por que passou na última visita do dragão à Luz, na 27.ª jornada, e que alterou o rumo do campeonato: o Benfica tinha dez pontos de avanço, que um empate manteria e que uma vitória ampliaria para treze, matando o assunto, mas a verdade é que foi derrotado, uma semana depois voltou a perder, em Chaves, e acabou a tremer o dente por ter reprovado no exame em que tinha a obrigação de ficar aprovado. Mas falhou, deu moral aos portistas e viveu em sofrimento até ao fim por culpa própria. Até aqui ninguém importunou Roger Schmidt por todos lhe reconhecerem o mérito de fazer muito com pouco, mas as coisas evoluíram e, ao dia de hoje, o Benfica apresenta um plantel que não está ao nível de um Manchester City ou de um Real Madrid, obviamente, mas que é suficiente para dominar internamente e recuperar o prestígio abalado. Otreinador alemão passou de um esforçado onze titular, com o qual teve sucesso, para um catorze titular ou quinze titular, vendo enriquecido o grupo com equilíbrio na relação quantidade/qualidade, o que lhe concede mais e melhores escolhas para cada lugar. O problema é que pode dar-se o caso de Schmidt ser um daqueles treinadores de ideias fixas e com dificuldade em aceitar que é ténue a fronteira entre a convicção e a teimosia, não querendo ou não sendo capaz de ver todos os jogadores com os mesmos olhos. É a irresistível tentação de privilegiar os seus e deixar no andar de baixo os que não foram por si escolhidos. Esse perigo existe, não pode ser ignorado e os primeiros sinais foram dados no jogo de Roterdão, ao preparar as pessoas para Aursnes ser o par de Kokçu no eixo central quando a sensatez e os interesses da equipa sugerem outras opções. Kokçu é um jogador especial, de classe superior, isso é inequívoco, mas ainda não conseguiu afirmar-se, talvez por Schmidt confundir as identidades dos dois clubes e pretender transformar o Benfica numa espécie de sucursal do Feyenoord. Aguardemos por novidades de Giménez, como consta, no caso de Gonçalo Ramos sair… ANTES perder agora do que mais tarde, é um facto, e desse ponto de vista dois fracassos em tão pouco tempo devem ser recebidos como consequência natural de um processo de crescimento e de afirmação que muito progrediu em menos de um ano, mas ainda tem muito para andar. Roger Schmidt merece-me todo o respeito, mas, por exemplo, continuo a entender mal a infinda tolerância com as irritantes intermitências exibicionais de Rafa Silva e a sua indisfarçável dificuldade em responder aos sacrifícios que a alta competição pede. Basta dar um pouco de atenção ao que ele não fez e devia ter feito em Roterdão. Mais me interrogo por haver no plantel alternativas que, podendo não ser as melhores, no mínimo, são merecedoras de oportunidades que o treinador não parece disposto a dar. Os adeptos benfiquistas sabem o que sofreram para festejar o título 38. As desilusões que suportaram, as esperanças que se diluíram, o futuro que foi sendo adiado. É preciso acelerar o processo de mudança e tendo Rui Costa declarado que é seu propósito recuperar o estatuto europeu do Benfica significa que, se calhar, chegou a hora de ordenar a revolução necessária em matéria de atitude competitiva, de respeito pela grandeza do clube. Dessa demora se têm aproveitado os principais opositores, principalmente o FC Porto. A Supertaça é um jogo, para jogadores e treinadores, mas para os adeptos é muito mais. É a redefinição dos territórios de influência: o Benfica quer afirmar que a história não mente e o mais poderoso é e sempre foi ele; o FC Porto vai replicar que o mais forte continua a ser ele apesar de ter perdido o campeonato.