Spoiler alert: sou amigo, muito amigo do Nuno Almeida, portanto a narrativa que se segue é parcial (no que se refere à forma como o vejo) mas verdadeira (em relação aos factos descritos). Ao longo das muitas épocas em que coincidimos no futebol profissional, eu, o Nuno e muitos dos nossos colegas de então, partilhámos dezenas de estágios, cursos, seminários e ações de formação. Participámos em várias reuniões de classe, sempre na defesa dos melhores interesses do setor. Estivemos num sem número de palestras, conferências e colóquios em todo o país. E fizemos um conjunto substancial de jogos em equipa, alternando como árbitros ou quarto árbitros. O Nuno, que fez toda a carreira em crescendo, terminou essa etapa da sua vida com qualidade máxima, digo eu e dirá qualquer pessoa capaz de ver futebol à distância, sem palas, sem malícia, sem coração ocupado. Estamos a falar de alguém que chegou e manteve-se no topo fruto de muito trabalho, compromisso e resiliência. Mas mais importante do que isso é a sua dimensão humana. Estamos a falar de uma pessoa de bem, simpática, humilde, bem humorada e amiga do seu amigo. Uma máquina, o nosso sócio. O reconhecimento da sua competência e seriedade ficou expresso na forma como foi aplaudido (de pé) por adeptos de Moreirense e Santa Clara, no último jogo que dirigiu na carreira. Esta quarta-feira aquele que é agora o mais conceituado árbitro algarvio será homenageado num jantar que contará com a presença dos muitos que tiveram o privilégio de serem seus colegas. Dos muitos que têm a honra de serem seus amigos. Trinta e um anos de carreira. Quinhentos jogos arbitrados nos escalões profissionais. É obra e merece o nosso aplauso. Entretanto, e decorridas treze jornadas, os crónicos candidatos ao título nacional, Sporting, Benfica e FC Porto, ocupam os primeiros lugares da classificação, com poucos pontos de diferença entre si. Por regra, esta proximidade redunda em duas verdades: a incerteza que cria entre adeptos, não apenas devido à distância pontual mas porque tendem a questionar o momento de forma das suas equipas e das equipas adversárias; e a outro nível, de dentro para forma, começa-se subtilmente a atribuir ao trabalho dos árbitros a responsabilidade maior dessa situação. Apesar da enormíssima diferença na qualidade do discurso e na forma como agora se criticam arbitragens (muito mais respeitosa e elevada do que num passado recente), a verdade é que ainda se nota aqui e ali a tentação de se empurrar para o penálti mal assinalado ou para o vermelho por exibir a justificação de resultados menos positivos. Percebo a estratégia, compreendo a necessidade de se dizer qualquer coisa para fora e admito até que tem havido várias decisões erradas, mas é importante desmontar esse mito. A verdade, minhas senhoras e meus senhores, é que os chamados grandes do futebol português são geralmente mais beneficiados do que prejudicados no que diz respeito a decisões dos árbitros. Isso não acontece de forma premeditada ou intencional (obviamente), mas porque essas equipas, donas de mais e maiores recursos, tendem a ter maior caudal ofensivo, logo fabricam mais lances nas áreas adversárias. Além disso têm excelentes executantes, o que obriga muitas vezes os adversários a cometerem faltas (e a levarem cartões) para os travar. O certo é que por cada dedo acusador às arbitragens ou crítica mais ou menos explícita, há garantidamente um esquecimento preocupante sobre um qualquer benefício obtido no jogo anterior ou dois jogos antes. À exceção dos adeptos mais facciosos, incapazes de verem para lá do coração, qualquer pessoa que entenda de bola consegue perceber isso. Tenho dito várias vezes e repito aqui hoje: numa prova que dura dez meses e se divide em trinta e quatro etapas, o mais consistente, o que melhor controla as variáveis que dependem de si, o que não gasta energias com aquilo que não depende de si, é sempre campeão. Sempre! Com todo o respeito, podem falar dos árbitros, do estado do relvado, da chuva e do calor, do calendário ou do que quiserem. É assim, é tal e qual assim.
