A derrota no treino dos miúdos e a vitória no jogo a sério
Já se sabe que o Sporting tem um grande passado, um excelente presente e um auspicioso futuro. E tem, em Rúben Amorim, um intérprete fabuloso da sua história
U M clube que ganha quando perde é raro. Mas é assim com o Sporting Clube de Portugal. No primeiro jogo da Champions, esta época, depois de perder em casa 1-5 contra o Ajax, os prognósticos eram mais do que reservados. A morte do Sporting europeu foi decretada por gente tão insuspeita como eu próprio. Escrevi nessa semana, a 16 de setembro, que estava provado que não tínhamos nascido para estas competições europeias. Porém, Rúben, que vê mais longe, sabe mais e está em contacto com a realidade, disse que tínhamos aprendido a lição. 15 dias depois, derrotados em Dortmund no segundo jogo por 1-0, opinei: «Não acho que a derrota por um golo, em Dortmund, seja um resultado mau em si mesmo. O problema é que a derrota por um, ou por cinco, é igual em pontos.»
Como se vê, sou um analista de alta qualidade, pelo que nunca acreditei que goleássemos duas vezes o Besiktas e vencêssemos por 3-1, em casa, o Dortmund, jogo que foi, claramente, o decisivo para a nossa passagem aos oitavos de final da Champions. E assim, contra as minhas previsões, mas de acordo com as lições do treinador, entrámos em Amesterdão, na última terça, já apurados.
Se o treinador fosse ganancioso e quisesse muito dinheiro, ou inseguro e precisasse, a cada passo, de mostrar que é melhor do que os outros, teria mantido a equipa que defrontou o Benfica. Mas não, Rúben é um gestor de futuro, um fabuloso intérprete da história do Sporting. E, desse modo, entrou em campo com a equipa com a média de idades mais baixa na história do clube. Prescindiu de Adán (tendo Coates e Feddal impossibilitados); prescindiu do herói da Luz, Matheus Nunes, de Porro e do tridente ofensivo constituído por Pote, Paulinho e Sarabia. Ou seja, sete jogadores que haviam estado na Luz não alinharam. Em vez deles, Virgínia, Gonçalo Esteves, Daniel Bragança, Nuno Santos, Tiago Tomás e Tabata; e ainda Matheus Reis a central do lado esquerdo, e Esgaio a fazer o corredor de Nuno Santos, que foi para o lugar de Pote. Ainda haviam de entrar Nazinho e Essugo… enfim, equipa mais jovem não há.
Porém, da derrota que sofreu por 4-2 há que dizer que dois golos, pelo menos, se devem a ingenuidade; embora ela não fosse essencialmente dos jovens mais jovens e mais inexperientes em campo. A primeira foi a entrada (pisão) desnecessária de Bragança sobre um neerlandês, quando Gonçalo Ramos já tinha condições para despachar a bola da área do Sporting, provocando o penálti que deu o 1-0 ao Ajax; a segunda foi a confusão de pés de Gonçalo Inácio perto da zona do penálti, que acabou por dar a bola ao adversário, para este conseguir o 2-1 (entretanto, numa bela jogada, Nuno Santos empatara o jogo).
Mas a nervoseira parecia maior, justamente, nos mais cotados, exceção a Luís Neto. Nuno Santos, que tem jogado tão bem e que marcou um golo na Arena de Amesterdão, foi um esbanjador de passes; Gonçalo Inácio, sem Coates e sem Feddal pode ter acusado demasiadamente a responsabilidade. E Bragança, tantas vezes chamado, apesar de ter ao lado um jogador de excelentes características, que já se tinha mostrado na Luz - Ugarte -, também não esteve ao nível do costume. Aliás, bastou entrar Pote e Paulinho e, depois, Sarabia para o jogo se tornar mais equilibrado, e Tabata ter aproveitado para marcar um golaço que transformou o que ameaçava ser uma goleada 4-1 num resultado relativamente normal: 4-2.
Se é certo que ambas as equipas estavam apuradas para os oitavos de final, não menos verdade é que o Ajax, ao contrário do Sporting, entrou com a equipa principal quase completa. Para eles tratava-se de acabar a fase de grupos só com vitórias, ou seja 18 pontos nos seis jogos. Para o Sporting não havia um objetivo preciso, salvo ganhar o dinheiro correspondente ao empate ou à vitória e/ou começar a construir uma equipa com a qualidade da atual. Foi, claramente, esta a hipótese que Rúben escolheu. E escolheu bem, apesar da derrota.
Rúben Amorim arriscou em Amesterdão a pensar no futuro do Sporting
REI RÚBEN
TREINADOR do Sporting alcançou um estatuto, através do seu mérito (qualidades de treinador, comunicador e humanas) que lhe permite delinear o que é melhor para a equipa de futebol, senão para as equipas de futebol (recorde-se o que ele disse acerca da equipa da Youth League, também apurada para os oitavos de final, a propósito de ir lá buscar bastantes jogadores).
Rúben já não tem de provar nada e isso viu-se claramente na conferência de Imprensa que deu em Amesterdão, após a derrota. Elogiou o FC Porto por ser de longe, o maior representante de Portugal nas provas da Champions; desejou sorte ao Benfica; assumiu o erro que cometeu quando colocou demasiada pressão sobre João Virgínia, foi humilde em relação aos próximos jogos. Face ao mau humor quase crónico de Sérgio e à fanfarronice de Jesus, Rúben, o mais novo (treinador) e mais jovem (de idade) pode dar lições como o fazem os grandes professores: não parecendo que está a ensinar, mas estabelecendo uma empatia enorme com os que o rodeiam e ouvem.
No Sporting ganhou o título de intocável. Bem sei que estes galardões não duram para sempre, mas espero sinceramente que neste caso dure bastante tempo, mesmo muito.
JOGO DA LUZ
A partida da 13.ª jornada da Liga não foi número de sorte nem de azar para Benfica ou Sporting. O número revelou-se igual a tantos outros em cujas jornadas os resultados são normais e justos. Para além dos golos de Sarabia, Paulinho e Matheus Nunes, com Pizzi a reduzir já seis minutos para lá dos 90, interessa olhar para alguns números. Por exemplo, o Benfica tem 67% de posse de bola, mais de 2/3 do jogo. E com eles faz o quê? Três remates à baliza, ou dois para além do golo de Pizzi: um remate muito mal feito de João Mário e outro de Grimaldi, simples para Adán (podemos ainda considerar a bola ao poste de Darwin). O Sporting com metade da posse de bola fez cinco remates, dos quais três golos, uma bola à trave de Pote e um remate de Esgaio defendido por Vlachodimos.
A eficácia é óbvia e, como disse Rúben, foi com ela que o Sporting matou o jogo, como com ela o Ajax nos venceu.
Curiosamente, há muito que não me lembrava de um jogo entre os dois grandes rivais de Lisboa com tão poucos casos e nenhuma grande polémica final. Os benfiquistas aceitaram o resultado, responsabilizando, bem ou mal, o treinador. Do lado do Sporting exultou-se. Durante os mais de 90 minutos, Varandas e Rui Costa, lado a lado na tribuna presidencial do Estádio da Luz, deram um exemplo inestimável. Talvez algo esteja a mudar para melhor.
JOGAR FORA
PORTO
Uma equipa com a experiência do Porto não pode cair em armadilhas daquelas. Com o Atlético reduzido a 10 jogadores, por expulsão de Carrasco, e quando ainda vencia apenas por 1-0 e o Porto ia a tempo de inverter as coisas, Wendell foi expulso menos de três minutos depois, ao perder a cabeça por uma coisa de nada. Se somarmos a isto uma arbitragem duvidosa, diremos que à equipa do Norte faltou um pouco de sorte… e cabeça fria. Pode ser que na Liga Europa…
BENFICA
Com dois golos, mas com as deficiências conhecidas, sobretudo no final da segunda parte, passam os da Luz aos oitavos de final da Champions, juntamente com o Sporting. Não dependendo apenas deles, beneficiaram também da vitória do Bayern sobre o Barcelona, por 3-0, em Munique. Felizmente para a pontuação e prestígio do futebol português, apesar de alguns benfiquistas já exasperarem com Jorge Jesus.
BRAGA
Só a vitória sobre o Estrela Vermelha, hoje, em casa, interessa. O Braga perdeu na última jornada da Liga Europa a oportunidade de já estar apurado para a fase seguinte. Espera-se que desta fique mesmo.