À atenção de escolas, professores, pais e governantes
(Foto: Imago)
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À atenção de escolas, professores, pais e governantes

OPINIÃO15.09.202322:46

O início deste novo ano letivo, apesar das promessas feitas, está a ser preocupante. O que me empurrou no sentido de, com o título acima, citar o que publiquei em 2009 através de um livro então intitulado O Treinador e a Política. Passados 14 anos, a atualidade da citação seguinte, obriga-nos a alguma reflexão: 

Vivem-se momentos conturbados na sociedade portuguesa. Nomeadamente no que respeita às relações entre a Escola, os professores, os pais e os governantes. 

Uns contra os outros, munidos das razões respetivas, travam uma dura luta pelos seus direitos e respetivas responsabilidades que, óbvia e democraticamente, ninguém põe em causa. No entanto, importa não perder de vista o objetivo comum que verdadeiramente dá sentido a tudo o que dizem defender. Os interesses das crianças e dos jovens deste país, com quem todos assumiram a responsabilidade de criar as melhores condições possíveis para que sejam educados para aprender. 

No seu livro «Textos para Educação», o psicólogo Eduardo Sá diz-nos que «educar é incrementar a autenticidade, em vez da falsidade.» «Nunca se educa à margem da verdade. É bom que as crianças sintam que, quando alguém não gosta do que fazem, é de supor que lhes mostrem que podem fazer melhor. As crianças precisam sentir que os sentimentos maus ou os insucessos, são naturais como a sede e fazem bem à saúde.» 

Será que no meio da luta em curso, preocupações como estas estarão a ser motivo da devida preocupação de escolas, professores e governo? Encontrarão os litigantes tempo e disponibilidade para o devido acompanhamento das crianças e jovens que estão sob a sua responsabilidade? O mesmo autor, atrás referido, acrescenta nessa sua obra que «gostava que a Escola se transformasse num lugar que estimule as incertezas e incentive à dúvida, que reabilite a criatividade e a ousadia de pensar, que ensine a cumplicidade e, com humanidade, promova a esperança.» Será que é assim que as nossas Escolas estão neste momento a proceder? 

«Uma Escola que aceite que, atrás de cada aluno difícil, está um professor em dificuldades e que diante de uma criança distraída, está uma Família desatenta.» Famílias desatentas, uma Escola nem sempre potenciadora de jovens preparados para as dificuldades de um futuro cada vez mais complexo e exigente, professores zangados com os governantes e estes nitidamente desfocados do que deveria ser a sua maior preocupação. Convenhamos, estamos perante uma mistura demasiado preocupante!

 Sabemos que, como diz o povo, «em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão». E se a tarefa principal, entendida como educar os alunos para aprender, corre sérios riscos de ser negligenciada? Com famílias, escolas, professores e governantes desfocados das suas respon- sabilidades educativas, a quem cumpre afinal a missão fundamental de educar os nossos jovens para o futuro? Quem os vai incentivar a prepararem-se todos os dias com prazer e de forma disciplinada e consciente? 

A educação obriga a um treino diário, assente em situações problema que suscitem por um lado, a reflexão necessária e, pelo outro, o retorno de informação de pais e professores, positivo ou negativo consoante as circunstâncias, mas sempre orientado no sentido de potenciar que os nossos jovens melhorem continuamente, a caminho da excelência. O que exige concentração, acompanhamento e preparação prévias pouco consonantes com lutas como aquelas que se travam semana a semana. 

Sem invalidar as razões e os direitos que cada uma das partes deve defender do modo mais empenhado e democrático possível, é fundamental que ninguém esqueça as respetivas responsabilidades em todo este processo. Mais importante que quem vai ganhar ou perder a luta em curso, nenhuma das partes pode negligenciar a tarefa principal que lhe pertence. Impõe-se que eduquem a mente dos nossos jovens para aprender e serem capazes de pensar diferente consoante as circunstâncias, tal como para que se entusiasmem e apaixonem por aprender a fazer, fazendo. Se o conseguirem em simultâneo com a troca de razões em curso, nada a opor. Caso contrário, a razão principal porque existem escolas e professores deve sobrepor-se a todas as outras. 

Perguntará o leitor o que me levou a fazer esta chamada de atenção num momento tão crítico das relações entre pais, alunos, professores e governantes. Acima de tudo preocupa-me como e quem está neste momento a responsabilizar-se pela mobilização da motivação dos milhares de crianças e jovens envolvidos no atual processo reivindicativo. Principalmente, como, apesar de tudo se está a mobilizar a motivação daqueles por quem a Escola e os professores são responsáveis. Quem e como os está a mobilizar para continuarem a aprender do modo mais entusiasmado possível? 

Como tenho defendido, aprendemos mais e melhor em determinados períodos críticos e sensíveis da vida e é nesses momentos que devem ser feitas determinadas experiências. Referi por exemplo que, no que respeita a se algumas das experiências que permitem melhorar a criatividade e a inovação, não forem feitas nas idades mais jovens, as dificuldades para futuras aquisições serão bastante significativas. Experimentar, em devido tempo, é decisivo! Por outro lado, enquanto seres humanos, temos tendência para comportamentos cooperativos. Mas também, e em simultâneo, temos imensas dificuldades em cooperar, pois pensamos, quase sempre, primeiro em nós que nos outros. A cooperação e a empatia aprendem-se e treinam-se de forma lúdica, através da vida em comunidade e da convivência com os outros. Incentiva-se através do culto da ideia que a recompensa por cooperar está para além do consumo e proveito imediatos. Entretanto, todos nos motivamos quando encontramos algo de bom naquilo que fazemos e nos sentimos recompensados por isso. Mobiliza a nossa motivação, tudo o que é novo, o que consideramos ser surpreendente, face ao que estávamos à espera. Aprendemos com maior facilidade o que tem consequências positivas, o que alcança resultados melhores que o esperado e excede as nossas expectativas. Existe aprendizagem sempre que as nossas experiências são positivas e feitas em grupo, (em comunidade). As atividades sociais e cooperativas estão entre os reforçadores mais significativos da aprendizagem. Por sua vez, quem ensina ou treina, tem de gostar do que faz, transmitir paixão e entusiasmo, ser inspirador! Não são tanto os meios audiovisuais ou o muito saber intelectual que motivam quem aprende, mas sim o entusiasmo de quem ensina, a forma como reconhece quem faz bem e desafia os que se mostram mais resistentes. 

Será que no meio do confronto em curso alguém tem vindo a preocupar-se com estas necessidades dos alunos das nossas escolas? Ou simplesmente no futuro próximo as nossas crianças e jovens serão pura e simplesmente vítimas do atual contexto?

 Os padrões do que é ter hoje um desempenho excelente, são muito superiores aos do passado recente. O que significa que aumentou exponencialmente a responsabilidade relativa à preparação dos nossos filhos, netos, alunos, crianças e jovens.

 Adiferença para melhor que todos aspiramos que eles possam vir a fazer, só é alcançável através de um ensino e treino intensivo, exigente e rigoroso, tal como, uma crescente paixão e capacidade de ir além dos seus limites e zonas de conforto. 

Por vezes interrogamo-nos, então e os Mozart e os Tiger Woods deste mundo? Mozart foi iniciado pelo pai aos 3 anos de idade, num programa intenso de preparação e execução musical. Até à sua primeira obra reconhecida como verdadeiramente notável, passaram 18 anos! E, durante esse período de tempo, trabalhou arduamente! Tiger Woods, aos 2 anos, já andava nos campos de golfe a aprender e a treinar! Mas só aos 19 anos emergiu como o grande e notável jogador que ainda hoje é! Muitos outros exemplos comprovam que, em nenhuns deles, se encontraram manifestações precoces de talento. 

Então, se a diferença não reside na experiência, na inteligência, na memória, nos traços de personalidade ou qualquer outro tipo de capacidades inatas, porque razão, uns são excelentes e outros não?

Simplesmente pela auto preparação, a eficiência e a eficácia do treino intensivo a que se dedicam ao longo de anos. Pela quantidade de trabalho que desenvolveram, (volume de horas), mas também pela qualidade (intensidade, o rigor, a exigência), tal como pela presença constante de um treinador, um tutor, um facilitador. É decisiva a ajuda de um pai, um professor, um treinador, alguém que incentive e apoie, que exija e pressione, ajude a refletir, ensine, dê feedback e avalie constantemente o desempenho de forma honesta e frontal. Alguém que nos ajude a “sair” da zona de conforto e nos aponte constantemente novos desafios.

A não acontecer assim, dificilmente escaparemos ao que vamos vendo. Em vez de encontrarmos nas Escolas os modelos, as referências, os princípios e os valores que tanta falta nos fazem, irá acontecer precisamente o contrário. Aumentarão as notícias referentes a atitudes violentas de alguns professores e alunos. Acontecerão falhas graves no processo educativo levado a cabo nas nossas escolas. 

Conclusão: em tudo o que respeita à área comportamental de alunos e professores, não nos deve preocupar tanto o que não deve ser feito, mas sim, o que é necessário que aconteça, quais os alicerces em que deverá assentar. Sempre pela positiva, nunca pela negativa!