Espaço Universidade Comparação dos sistemas desportivos contemporâneos nas suas relações com outros campos e espaços sociais (artigo de Vítor Rosa, 115)
Se colocarmos em perspetiva os sistemas desportivos de vários países europeus, verificamos que a sua história não é linear e que é impossível, como gostaria a lógica culturalista, reduzi-los a uns meros princípios estruturantes aplicáveis a todas as épocas e no conjunto da sociedade.
Nos seus primeiros textos, os sociólogos franceses Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron denunciaram os efeitos simplificadores mencionados por alguns burgueses, que viam o “culto aristocrático na proeza”. Podemos procurar as estruturas dos diferentes movimentos desportivos nos inevitáveis compromissos entre as escolhas individuais, resultante da história política e cultural de um país, e as variantes que resultam dos incontornáveis constrangimentos, sobretudo no que diz respeito ao desporto de alto rendimento, das exigências técnicas e das competições internacionais.
Tomemos aqui, de forma breve, os exemplos da Alemanha, da França e de Portugal. Na Alemanha, o movimento desportivo é uma organização que tem uma autoridade e que regula a prática desportiva, em todas as modalidades e em todos os níveis. Fruto de uma fusão em maio de 2006, entre a União do Desporto Alemão e o Comité Olímpico Nacional, o Deutscher Olympischen Sportbund enquadra todas as instâncias desportivas, que conservam a sua autonomia, e representa-as nas negociações com o Estado Federal (Bund).
O sistema alemão não atribui um estatuto particular aos atletas de alto rendimento. Reconhece-se a herança de uma conceção liberal, segundo a qual o compromisso de alto rendimento é fruto de uma escolha individual. Em França, como em Portugal, o desporto de alto rendimento é uma fonte de enriquecimento e de progresso humano e o atleta assume um papel social, cultural e nacional de primeira importância. O desenvolvimento das atividades físicas e desportivas incumbe ao Estado e ao movimento desportivo, constituído por clubes, associações e federações desportivas, muitas vezes com o apoio das autarquias, das empresas e de instituições sociais. Nesta perspetiva, a lógica é diferente da Alemanha.
As relações são contrastadas entre as organizações desportivas, os Estados e os praticantes. É completamente em vão querer comparar os sistemas desportivos e o seu “grau de autonomia”.
Vítor Rosa
Sociólogo, Doutor em Educação Física e Desporto, Ramo Didática. Investigador Integrado do Centro de Estudos Interdisciplinares em Educação e Desenvolvimento (CeiED), da Universidade Lusófona de Lisboa