Espaço Universidade Um olhar sobre o boxe, com “Rodriguinhos” (artigo de Vítor Rosa, 71)
Entre os vários filmes consagrados ao boxe, existe um realizado por Robert Wise, intitulado “Marcado pelo Ódio” (1956), com a participação do ator de cinema Paul Newman. Tem o duplo mérito de se inspirar da história de um verdadeiro campeão do mundo de pesos pesados, em 1947, Rocky Graziano, e de desenvolver perante todos a fórmula pela qual a ideologia americana converte a violência em estado selvagem de um delinquente em uma violência canalizada, regulamentada: a do desporto de combate. Podemos resumir o filme em dois tempos. Primeiro tempo: o jovem Graziano foi durante muito tempo violentado e aterrorizado pelo seu pai; um falhado pugilista. Crescido, ele vinga-se dele, batendo em todos os homens que detêm uma qualquer autoridade. Ele boxeia, perdidamente, com a vontade de matar. Segundo tempo: Ele continua a boxear, freneticamente, mas no ringue, segundo as regras. Ele compreendeu, com os árduos treinos e o seu treinador, que o verdadeiro inimigo não era o seu pai, mas os outros: os responsáveis pela injustiça social que, precisamente, impediram o seu pai de ter sucesso. Em vez de matar simbolicamente o seu pai, a cada altercação, ele vinga-o. O mesmo ódio que fazia dele um bandido perigoso, levou-o, agora, a ser um cavalheiro. Do Nero (referência ao Imperador Romano, considerado um sádico) adolescente, o desporto tornou-o um “Rodriguinho”, um responsável adulto. Tomamos aqui a referência “Rodriguinho” como surge no dicionário: “[Gíria] Objeto de pouco valor; sentimentalismo barato utilizado como recurso pelo ator para fazer emocionar o público; tremelique, trejeito, frescura. Frase feita para tudo; indivíduo excessivamente apurado no vestir; janota [...]”. Na sua aceção mais popular, quando se diz “deixa-te de rodriguinhos” significa: “deixa-te de intrigas/de conversas sem interesse nenhum”). Como diz Pichon (2015, p. 15), atleta campeão de corrida de corta-mato (de 5 e 10 km), por diversas vezes, e que foi ordenado padre anos mais tarde: “desporto, meu amigo, meu irmão, tu não foste, para mim, somente uma bela e sã ocupação, tu foste uma real e total transformação”.
Referência:
Pichon, R. (2015). L'âme du sport et le sport de l'âme: sport et spiritualité. Paris: Editions La Bruyere.
Vítor Rosa
Sociólogo, Doutor em Educação Física e Desporto, Ramo Didática. Investigador Integrado do Centro de Estudos Interdisciplinares de Educação e Desenvolvimento (CeiED), da Universidade Lusófona de Lisboa