ENTREVISTA A BOLA Henrique Pina: «Foi saboroso ganhar ao Sporting, mas agora queremos o play-off»
Galitos do Barreiro causou sensação no fim de semana ao bater os leões na 17.ª jornada da Liga Betclic. Soma seis vitórias seguidas no campeonato e oito nos últimos dez jogos. O treinador que fez a revolução, e por enquanto não quer o rótulo de 'equipa sensação', falou a ABOLA e revela que é a única pessoa na equipa técnica e acaba por fazer o trabalho de quatro.
Com seis vitórias seguidas na Liga Betclic, oito nos últimos dez jogos contando com os desaires contra o Benfica (90-96) para a Taça Hugo dos Santos e Oliveirense (71-79) na Taça de Portugal, o Galitos do Barreiro (6.º, 9 v-8 d) está em destaque.
No fim de semana, ganhou ainda maior dimensão ao bater o Sporting por 77-76, na 17.ª jornada. Partida com final emocionante, com uma tapinha do americano Rog Stein a 0,8s do apito final, após o também poste Rui Palhares ter falhado um segundo lance livre.
Vindo do Estoril Basket e tendo agarrado no grupo em dezembro, após a saída do treinador Pedro Oliveira, Henrique Pina, 53 anos, está na génese deste sucesso. Recusa o rótulo de equipa sensação. «Só no fim é que se vê quem foi a equipa sensação. Podemos estar a sê-lo na 2.ª volta, mas quanto tudo terminar é que se fazem as contas. Na 2.ª volta já todos perderam — Benfica, FC Porto, Sporting… — , menos nós. Tenho tido uma surpresa agradável, mas, ainda falta muito até ao fim», vai desabafando antes de começar a responder às perguntas.
«Não há pozinhos de perlimpimpim para podermos dizer o que foi feito e o que não foi feito. Tinha que ser através de um apelo à união e ao trabalho para começar a vencer»
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— Não são apenas as seis vitórias seguidas na Liga, são oito nos últimos dez jogos, o que é que mudou no Galitos desde a sua chegada?
— O que é que mudou? Não sei o trabalho feito antes pelo Pedro Oliveira, a nível mental, mas houve bastante foco a nível psicológico com os jogadores. Reuniões individuais, coletivas, apelar à união do grupo... E tentar que a mudança de treinador trouxesse algo benéfico. Às vezes, estas mudanças não são boas para toda a gente. Não é para aquele que vem, para o que sai, não é para os jogadores. Às vezes corre bem, outras mal, mas, realmente, o foco foi a questão mental. Tentar chegar a eles de uma maneira mais próxima e vamos lá embora tentar dar a volta por cima. Foi basicamente isto. Não há pozinhos de perlimpimpim para podermos dizer o que foi feito e o que não foi feito. Tinha que ser através de um apelo à união e ao trabalho para começar a vencer.
«O Galitos tinha jogadores com talento e havia discutido praticamente o resultado em todos os jogos. Sem derrotas muito volumosas. Mas faltava o clique do acreditar que podiam ganhar»
— E quando deixa o Estoril [CN1] a meio da época e tem esse convite, olhou para o plantel e o que viu que podia explorar a nível técnico para dar essa volta à situação? Até porque passou a estar na Liga onde há seis adversários com grande peso e tradição no campeonato.
— Faço um trabalho de casa como treinador em que vou acompanhando tudo em todos os campeonatos, até mesmo da 2.ª Divisão, às vezes à procura de alguns talentos. E também acompanhava a Liga. O Galitos tinha jogadores com talento e havia discutido praticamente o resultado em todos os jogos. Sem derrotas muito volumosas. Mas faltava o clique do acreditar que podiam ganhar. Havia essa possibilidade. É verdade que estamos em alta competição e nela tem que se ganhar, não há as vitórias morais para se perder por um, dois ou cinco. É uma derrota. Sabendo que os resultados eram muito próximos ,era porque haviam ficado muito perto de os poder ganhar. Ao aceitar essa proposta foi um risco de que poderíamos vencê-los. Felizmente conseguimos.
«Tínhamos estudado bem o Sporting relativamente a algumas fases do jogo. Neste estavam fora da sua percentagem da linha de três pontos. Ao entrarmos no último período, faço a alteração da defesa homem a homem para à zona, na tentativa de estarmos ali 3/4 minutos, a tentar enervar o Sporting»
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«Isto é engraçado: depois de me pedirem a manutenção, agora já se fala em ir ao play-off [risos]. Até já não é um play-off [top 8] qualquer, é conforme as posições. Mas tenho os pés muito assentes na terra»
— Contra o Sporting, além de nunca terem deixado que fugissem no marcador, o que é que mudou no fim para discutir a vitória?
— Tínhamos estudado bem o Sporting relativamente a algumas fases do jogo. Neste estavam fora da sua percentagem da linha de três pontos. Ao entrarmos no último período, faço a alteração da defesa homem a homem para à zona, na tentativa de estarmos ali 3/4 minutos, a tentar enervar o Sporting. Se os primeiros dois, três, quatro lançamentos deles não entrassem, poderíamos aproximar-nos. Foi o que aconteceu. Fizemos a mudança defensiva, surtiu efeito e conseguimos aproximar-nos. Depois foi discutir o jogo até ao fim. Tratou-se de uma vitória muito saborosa, sobretudo pela maneira como aconteceu. Até disse que se tivéssemos vencido por 20 não tinha tanto impacto como foi com aquela bola no último décimo. Um jogo que ficou para a história e serve como alento para nunca desistir.
— O próximo treino será a seguir a uma vitória importante, que vale tanto como as outras, mas face a um adversário que tem peso e é candidato a tudo em que compete a nível nacional. Acha que vai ser um treino diferente, em que será preciso chamá-los à terra?
— Como tivemos uma sobrecarga de jogos emocionais nas últimas jornadas e não estando na Final Four da Taça de Portugal, era um objetivo mas fomos eliminados pela Oliveirense, demos dois dias de folga aos atletas. Quarta-feira regressamos e vamos já começar a preparar o jogo para daqui a 15 dias, com o V. Guimarães. É claro que eles sabem que foi importante esta vitória, mas desde que cheguei aqui todas as vitórias são relevantes. A equipa vinha de muitas derrotas seguidas, estava num desacreditar e qualquer vitória era importante, fosse o Galomar, Queluz ou o Povoa. E esta, é claro que foi bastante, mas acaba por ser mais uma vitória. É isso que tento passar aos jogadores.
Há uma maior visibilidade quando se vence um candidato ao título, mas o treino de quarta-feira é já pensar no próximo jogo. Aliás, isto é engraçado: depois de me pedirem a manutenção, agora já se fala em ir ao play-off [risos]. Até já não é um play-off [top 8] qualquer, é conforme as posições. Mas tenho os pés muito assentes na terra e até vou-lhe confidenciar: é muito difícil atingirmos os play-off face ao que nos falta do campeonato.
«Sou o único treinador da Liga sozinho, não tenho mais ninguém comigo, seja preparador físico, adjunto… Sou eu que faço o scouting e quem toma todas as decisões durante o jogo e o treino. É difícil»
— Faltam-lhes cinco jogos para o fim da fase regular.
— Sim, faltam cinco. Recebemos o Benfica, vamos a casa do FC Porto, da Oliveirense, a Guimarães e só temos um jogo de 50-50 com o Imortal, em casa. São cinco confrontos muito difíceis e o V. Guimarães, Imortal e Esgueira, que estão fortes, também ambicionam os play-offs. Além do mais, estamos um bocado desfalcados. Não só porque não temos o sexto estrangeiro, não nos reforçámos em janeiro como muitas equipas - trocaram jogadores e algumas até acrescentaram mais alguma coisa - e na nossa infelicidade temos tido o Malcolm Richardson lesionado nos últimos três jogos - o primeiro que fez foi com o Sporting e apenas 9 minutos. O que significa que, na prática, temos quatro estrangeiros. Nem devia dizer isto, mas não sei se não vamos perder mais algum…
— Mas a ambição do play-off está lá, não é?
— Quando me puseram a questão da manutenção na Liga ambicionei logo aos atletas que não vinha para isso. O objetivo era o play-off. Apesar da equipa estar numa fase difícil, tinha de ser o play-off porque se fosse pedir apenas a permanência da Liga as coisas poderiam não correr bem. Coloquei a fasquia alta perante o grupo e para mim porque só falo comigo mesmo, não tenho sequer adjunto. Sou o único treinador da Liga sozinho, não tenho mais ninguém comigo, seja preparador físico, adjunto… Sou eu que faço o scouting e quem toma todas as decisões durante o jogo e o treino. É difícil. Assim, coloquei a mim próprio o objetivo do play-off para não nos nivelarmos por baixo. É claro que o play-off está uma ou duas vitórias, mas serão bastante difíceis de conquistar.
«Se consigo fazer tudo isto sozinho, consigo-o com muita dificuldade. Tenho que estar a ver os jogos, para cada adversário que tenho que preparar, vejo os últimos três encontros deles. Tenho de preparar o treino, o scouting para mostrar aos jogadores, a parte física também sou eu que cuido, ou seja, aqui tenho que realizar as tarefas de quatro elementos»
— Sobretudo por causa dos adversários [V. Guimarães, Benfica, Oliveirense, Imortal e FC Porto] que aí vêm?
— Sim, sobretudo pelos adversários e pelos concorrentes diretos ao play-off, que terão um calendário claramente mais fácil do que o nosso.
— Se eu fosse presidente do Galitos do Barreiro e lhe desse a hipótese de escolher três elementos para aquilo que diz que é sozinho, o que queria?
— Isso é o que todos os treinadores ambicionam. Primeiro um bom preparador físico na área do basquetebol. Alguém que nos planeie essa parte física na área da modalidade. Depois ter um treinador de campo e um que me pudesse ajudar e outro que tratasse do scouting dos adversários na parte do vídeo. Três elementos que normalmente constituem as equipas profissionais, porque as de topo ainda têm mais gente. Se consigo fazer tudo isto sozinho, consigo-o com muita dificuldade. Tenho que estar a ver os jogos, para cada adversário que tenho que preparar, vejo os últimos três encontros deles. Tenho de preparar o treino, o scouting para mostrar aos jogadores, a parte física também sou eu que cuido, ou seja, aqui tenho que realizar as tarefas de quatro elementos.
«As pessoas entenderam, porque também sempre lhes havia dito que que um dia desejava regressar à Liga Profissional, onde já tinha estado [Barreirense]. Quando falei sobre esta hipótese todos foram compreensivos e apoiaram-me. Ainda me enviam mensagens quando ganhamos e estão contentes com o meu desempenho»
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— Custou-lhe, não queria dizer muito, mas foi difícil deixar o Estoril Basket a meio da temporada, quando já lá estava há duas épocas e meia?
— Custou-me. Estava lá na terceira temporada e tínhamos ambições. Desde que cheguei que havia o desejo do clube voltar à Proliga. Mas o projeto não ficou a meio. As pessoas entenderam, porque também sempre lhes havia dito que que um dia desejava regressar à Liga Profissional, onde já tinha estado [Barreirense]. Quando falei sobre esta hipótese todos foram compreensivos e apoiaram-me. Ainda me enviam mensagens quando ganhamos e estão contentes com o meu desempenho, tal como também fiquei com o desempenho do Estoril, que vai disputar a subida à 1.ª Divisão.
Esta não tem muita visibilidade na nossa sociedade, comunicação social e mesmo na Federação, mas é uma divisão muito difícil. Quem deseja subir investe já alguns valores e é muito complicado porque acaba só por subir uma equipa. Já começam a aparecer bons valores na 1.ª Divisão, com bons técnicos, equipas bem orientadas, alguns bons estrangeiros e portugueses que não têm tido algum espaço na Proliga e preferem jogar nesta divisão. Também me deu esta capacidade de preparar-me para outro tipo de campeonato.
«Ainda não falei nada disto com os diretores, se continuo para o ano ou não. Há algumas conversas, mas nada concreto. Mas quando me fizeram o convite foi para a manutenção e essa está garantida»
— Com a manutenção assegurada, a sua continuidade no Galitos do Barreiro está pendente de chegar ou não ao play-off?
— A minha continuidade... ainda não falei nada disto com os diretores, se continuo para o ano ou não. Há algumas conversas, mas nada concreto. Quando me fizeram o convite foi para a manutenção e essa está garantida. Aí, em dois meses e meio, cumpri o objetivo que me colocaram e estamos a cinco jornadas do fim da fase regular. Agora, relativamente à continuidade do próximo ano, só o tempo dirá.