PARIS - Pichardo pisa o estádio olímpico e vai direto ao banco de apoio da pista onde vão saltar os atletas do grupo B. Enquanto a maioria dos rivais iniciam o aquecimento, ele permanece sentado. Muito depois dos outros, levanta-se e ensaia um arranque curto. Caminha depois para o início da pista e faz uma corrida mais forte, antes de voltar a sentar-se. À vista do público e dos jornalistas, não aquece mais do que aquilo. Espera sentado pela sua vez e quando ela chega caminha calmamente para o início da pista, com os olhos da maioria centrados noutras partes da pista. Na final do salto com vara feminino. Nas meias-finais dos 400 m metros barreiras masculinas. É quase incógnito, de calças e com a pala do boné virada para trás, que o campeão olímpico em título faz o seu ensaio. Sim, no singular. Pichardo não precisa de mais do que uma tentativa para ultrapassar a marca de qualificação fixada nos 17,10 metros. Ele aterra nos 17,44m, a melhor marca da qualificação, veste a camisola, troca umas ideias com o pai, que é também o treinador e está ali ao lado na bancada, agarra na trouxa e vai à sua vida. E como a vida é dele, e nada do que está a sua volta lhe interessa, não fala à rádio. Fica em silêncio para a TV. E nada mais diz na zona mista do que um seco «falamos na final». Arrogância? Talvez. Táctica? Pode ser. Aparentemente, vale tudo no lançamento daquela que muitos esperam que seja a prova de triplo salto mais equilibrada da história. Razões para isso não faltam. E todas têm algo a dizer. O espanhol Juan Diaz, por exemplo, que em junho roubou a Pichardo o título europeu, ao saltar 18,18m, a terceira melhor marca de sempre, fica mais de cinco minutos a falar com os jornalistas. Apesar de também não lhe importarem os restantes. «Não vi as marcas dos outros. Entrei, fiz o meu salto e vim embora», resumiu, admitindo esperar uma prova muito equilibrada. «Vai ser uma competição dura. Vai ser muito dura. Isto são os jogos olímpicos, todos dão o máximo para chegar à medalha. Há muitos atletas com grandes marcas, por isso vamos ver como será a final», acrescentou, ele que fez a segunda melhor marca da noite, com 17,24m. Além de Pichardo, outro que tem uma dessas marcas para ter em atenção, o burquinês Hugues Fabrice Zango, também pára e fala até com os jornalistas portugueses. E também não quer saber muito dos outros. «O maior rival que eu tenho, sou eu mesmo. Sei que se estiver ao meu melhor nível, serei campeão olímpico. E eu estou ao meu melhor nível», remata, despedindo-se com uma pancadinha no braço do jornalista mais próximo. Seria algum recado? Isso ficamos sem saber. Porque disso ele não fala. Tal como ninguém sabe como se sentiu Pedro Pablo Pichardo. Ou o que ele acha que pode acontecer na final de sexta-feira. Será uma pressão extra a possibilidade de ser o primeiro português a conseguir revalidar um título olímpico? Shhhh! Ele fala na final.