Luca Brecel primeiro campeão mundial em 96 anos vindo de país sem o inglês por idioma

Snooker Luca Brecel primeiro campeão mundial em 96 anos vindo de país sem o inglês por idioma

SNOOKER01.05.202323:07

O belga Luca Brecel, de 28 anos, terceiro do ranking, sagrou-se na noite desta segunda-feira pela primeira vez campeão mundial de snooker, ao vencer o inglês Mark Selby, de 39 anos, quinto da hierarquia e tetracampeão mundial (2014, 2016, 2017 e 2021), por 18-15 na final do Campeonato do Mundo, prova maior da época 2022/23 da World Snooker, que decorreu desde 15 de abril e neste dia se concluiu em Sheffield (Inglaterra).

Campeão europeu há 13 anos, em Bucareste-2010 (7-4 ao neerlandês Roy Stolk na final) – Luca Brecel, natural de Limburg, ultrapassou autismo moderado até à adolescência. Snooker era (é) terapia, promove o desenvolvimento das faculdades intelectuais, cognitivas e sociais: à mesa, todos são iguais, mesmo se não o são, ou não parecem. Mas ali equivalem-se.

Histórico é o triunfo por ser o primeiro de um jogador de um país que não tem o inglês como língua materna ou idioma oficial, a Bélgica - é o flamengo, na sua região -, e segundo não nascido em nações da Commonwealth (comunidade britânica, Irlanda não faz parte e teve Ken Doherty campeão em 1997) a erguer o troféu em 96 anos e 91 edições do Mundial, desde 1927 – não se realizou de 1941 e 1945, devido à 2.ª Guerra Mundial - quanto mais no Crucible (1977): o ‘resto do Mundo’ meteu lança em África, no ‘império’.

43 anos após o canadiano Cliff Thorburn, em 1980 - 18-16 a Alex Higgins na final - e 13 anos depois do australiano Neil Robertson em 2010 (18-13 a Graeme Dott) Luca ‘Tunes’, verdadeira animação para miúdos e graúdos e a roçar brilhantismo e perfeição quase utópica e de ficção, é apenas o terceiro não nascido nas duas ilhas britânicas – Inglaterra, Escócia e Gales, mais a da Irlanda e Irlanda do Norte - campeão, em 47 edições do Mundial no Crucible Theatre, em Sheffield, palco da prova desde 1977. O ‘teatro dos sonhos’ já não se rendia a campeão inédito há quatro anos: desde Judd Trump, em 2019.

Tarde no espaço: belga hipnótico a (com)vencer

‘The Belgian Bullet’ (‘a bala belga’) chegou ao último dia da final a liderar por tangencial 9-8, mas três centenárias (113, 101 e 141 pontos) nos primeiros quatro parciais da terceira sessão, até ao intervalo da tarde, cedo o fizeram disparar até inéditos cinco ‘frames’ de vantagem sobre Mark, pela primeira vez no duelo, que liderou desde o início: 13-8.

Só após duas horas à mesa Selby clamou vitória num ‘frame’ neste último dia: após o intervalo da sessão, ao 22.º parcial, a atenuar então para 9-13, com ‘break’ de 63 pontos. A iniciativa cabia ao inglês, e o 10-13… veio logo após (‘break’ de 54 pontos). Luca, que domingo obtivera sete entradas de mais de 50 pontos, foi arrebatador e magnético à tarde: foram quatro centenárias, e 6-2 em parciais.

Apogeu de tarde inesquecível foi quarta centenária (entrada de 119 pontos). para 14-10. Fechou a tarde 15-10: pela segunda vez, ‘mão cheia’ de parciais na frente. Contexto capaz de porventura levar o pai, Carlo, e a namorada, Laura, com sensatez e sem presunção alguma, a pôr o champanhe no frigorífico.

Intratável Brecel, que neste Mundial, além de Selby (tetracampeão), e após ‘negra’ (10-9) diante de Ricky Walden nos ‘16avos’, batera o galês Mark Williams (tricampeão) por 13-11 e o inglês Ronnie O’Sullivan (heptacampeão) por 13-10, trio de ícones que juntos somam 14 títulos mundiais! Mais mérito? Impossível.

Enorme Selby prega valente susto antes da consagração

À noite, só o melhor Selby aliada a ‘sumiço’ de Luca permitiria emoção. A distância parecia irreversível. Mais quando Selby, após ‘break’ de 67 pontos do rival e ao falhar bola preta, concedeu o 16-10: Luca estava a dois de ser o 22.º campeão diferente em 47 edições do Mundial em 46 anos no Crucible.

Mas Mark é um titã, ode à resiliência, nunca desiste: ‘break’ de 78 pontos e atenuou para 11-16, e o 28.º e dividido parcial também caiu para si, a selar o 12-16. Ciente da importância de 13-16 ao intervalo, arriscou vermelha longa a abrir o 29.º ‘frame’ para ser feliz e embalar para centenária (122 pontos) e ficar, mesmo a três: o défice de seis já ia em metade.

Extraordinária coragem de Selby. No recomeço, à primeira aberta, entrada de 50 pontos do inglês, que selou o 14-16. Quatro de rajada… que passaram a cinco com um ‘chouriço’ a embolsar encarnada: 43 pontos de Selby e mais 52 na segunda visita à mesa, para colar ao belga: 15-16. Emoção e jogo em aberto.

O oxigénio pelo qual Luca (des)esperava veio de Selby: preta não embolsada, no 32.º ‘frame’, e entrada de 51 pontos do belga, que, mesmo com nova vermelha de felicidade de Selby, estancou a hemorragia de parciais para o rival e selou o 17-15. E quando Mark deixou a branca na metade inferior da mesa, no 33.º parcial, Brecel embalou para o 18-15... e a vítória, com direito a cereja no topo do bolo: entrada centenária, de 112 pontos, a limpar a mesa. Feito histórico, a provar que o snooker já não se confina ao Reino Unido: agarrou o Mundo.

Brecel sucede a Ronnie O’Sullivan, que vencera em 2022 o Mundial (18-13 a Judd Trump na final), prova transmitida para Portugal (EuroSport), e que atribuiu £2,395 M (€2,720 M) em prémios: meio milhão de libras (€567.859) para o belga, £200 mil (€227.144) para Selby, mais €31 mil do ‘147’ na final.

Final do Campeonato do Mundo (campeão a negro):

Luca Brecel, Bel – Mark Selby, Ing, 18-15

Marcha do marcador: 3-0; 3-1; 5-1; 5-2; 6-2; 6-3; 7-3; 7-5; 9-5; 9-8; 13-8; 13-10; 16-10; 16-15; 18-15;