Jéssica Rodrigues patina sobre rodas todo o ano na Madeira, todos os quatro anos que dura uma olimpíada e esporadicamente calça patins para o gelo. Para melhor se preparar para a estreia absoluta de Portugal na patinagem de velocidade nos Jogos de Juventude de inverno, neste final de janeiro, a atleta de 17 anos esteve mais vezes nos pés patins de lâmina e mais amiúde deixou a sua ilha para competir e estagiar. Não no Continente, porque pistas de gelo não existem em Portugal, país de clima temperado em que desportos de inverno só se praticam por lazer, e só quando neva na Serra da Estrela... Então como é que Jéssica de Ponta do Sol chega à Coreia do Sul, aos Jogos Olímpicos da Juventude de inverno (COJi), em representação do nosso país, e compete de igual para igual com adversárias de nações com tradição na modalidade, que treinam e competem (sempre) com patins de gelo e de países tem infraestruturas, e conquista muito meritória e inédita sexta posição para Portugal na prova de patinagem de velocidade mass start? «Com muita força de vontade e adaptando a técnica da patinagem sobre rodas à do gelo, e treinador e competindo sempre que a federação nos proporciona, pois é fundamental treinar e entrar em provas de patinagem de inverno. Porque, convenhamos, utilizar patins com rodas em piso seco é bem diferente do que usar os de lâmina no gelo», explicou a A BOLA, Jéssica Rodrigues antes de partir para Gangwon, onde decorrem os JOJi 2024, e após um programa de preparação promovido pela Federação de Desportos de Inverno de Portugal que incluiu estágios em Inzell, na Alemanha, e em Heerenveen, nos Países Baixos, ambos em complexos desportivos com pista de gelo longa (long track) de regulamentares medidas olímpicas. Na última sexta-feira, derradeiro dia de competição dos atletas portugueses, a jovem do Clube Desportivo Recreativo dos Prazeres, no Funchal, venceu um dos sprints da final de mass start e somou três pontos que lhe valeram a sexta posição na corrida e o consequente diploma olímpico, o primeiro de um atleta português em Jogos de inverno. «ESTAVA MUITO NERVOSA» «Estava muito nervosa, porque gosto especialmente desta prova de mass start, em que me sinto sempre bastante bem. E porque tinha algumas expectativas, confesso. Sinto-me muito realizada e feliz por este resultado», afirmou Jéssica Rodrigues, citada pelo Comité Olímpico de Portugal (COP), que, na meia-final, foi batida apenas pela neerlandesa Angel Daleman, que conquistaria a medalha de ouro. «Transcendi-me ao alcançar o segundo lugar e depois na final consegui chegar ao sexto lugar, o que é ótimo», referiu a patinadora. O resultado de Jéssica foi o ponto alto da representação lusa nos COJi 2024, a maior de sempre em número de atletas, com seis, o triplo das duas anteriores participações, em Lillehammer2016 e Lausane2020. Com a diplomada estiveram os compatriotas, também patinadores, Francisca Henriques e Martim Vieira, ambos de 16 anos e também residentes na Ilha da Madeira, e Manuel Piteira, de 15, na Matinha Grande, que à imagem de Jéssica Rodrigues competem regulamente com patins de rodas. Em Gangwon, patinaram os 500, 1500, incluindo estafeta mista, e a referida mass start – que junta todos os atletas na mesma corrida. Portugal foi um dos 14 países a conseguir qualificar quatro atletas para os COJi 2024, a quota máxima permitida pelo Comité Olímpico Internacional e «a mesma que as maiores potências mundiais», destacou o chefe da Missão de Portugal, Pedro Flávio, presidente da Federação de Desportos de Inverno de Portugal (FDIP), que enfatizou o caráter histórico do resultado de Jéssica Rodrigues, considerando-o «um sinal forte de que o investimento que a FDIP tem vindo a realizar nas suas modalidades está a começar a traduzir-se em excelência». Ao quarteto de patinadores juntou-se o duo de esquiadores, Nahia Vieira da Fonte e Emeric Guerillot, ambos de 16 anos e residentes em França, que participaram nas disciplinas de esqui alpino Super G e combinado alpino, e ainda no slalom e slalom gigante. «Este sucesso desportivo é fruto do esforço dos atletas e também do empenho dos treinadores e dirigentes envolvidos nas nossas modalidades. No caso da patinagem de velocidade, deve-se ao projeto que promove anualmente três estágios de três níveis diferentes, permitindo identificar atletas», esclareceu o dirigente federativo. «Estou bastante satisfeito com os resultados que conseguimos alcançar nas duas modalidades durante estes Jogos», afirmou ainda o chefe da Missão, que aponta já ao próximo objetivo: «chegar aos Jogos Olímpicos de Milão-Cortina2026 com a possibilidade de qualificar mais atletas, em mais modalidades».