«Vamos tentar fazer com que as pessoas compreendam as decisões dos árbitros»

FPF «Vamos tentar fazer com que as pessoas compreendam as decisões dos árbitros»

NACIONAL03.08.202317:02

José Fontelas Gomes, presidente do Conselho de Arbitragem (CA) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF), recebeu hoje a comunicação social na Cidade do Futebol, em Oeiras, tendo os jornalistas assistido ao treino dos árbitros e, também, como se desenrola a comunicação entre os homens do apito e a cabine do VAR.

O presidente do CA traçou as principais ideias para a nova época, na qual alguns audios vão ser divulgados. Eis o que disse Fontelas Gomes.

- Há mais abertura este ano por parte da arbitragem? Estão a mostrar o estágio, algumas comunicações vão ser tornadas públicas… Há uma política nova a este nível?

- Não diria uma política nova, nós sempre tentámos esclarecer e dar a conhecer aquilo que é o nosso trabalho. Se calhar nos últimos anos as pessoas têm tido um bocadinho mais de curiosidade por aquilo que nós fazemos e pensamos que esta é a altura certa de o poder fazer. Depois de algum treino, digamos assim, alguns anos e algum tempo a esta parte, penso que estamos em condições de poder dar a conhecer a forma como trabalhamos. Na verdade, trabalhamos como uma equipa todas as semanas, quatro dias por semana. E obviamente, com o passar dos anos, vamos fazendo um bocadinho mais.

- As comunicações, ou algumas comunicações, vão ser tornadas públicas apenas um mês depois. Isso não significa também trazer de novo a polémica? Três semanas depois, mais ou menos, o assunto regressa às primeiras páginas precisamente porque a comunicação só então foi divulgada…

- Foi esse o entendimento que tivemos para o início desta nova era, digamos assim. Em 2017 já tínhamos feito algo do género, mas infelizmente, nessa altura, aquilo que eram as comunicações da vídeo-arbitragem, e estávamos no início uma de uma nova era no futebol, não só na arbitragem, mas no futebol, começaram a ser utilizadas quase como arma de arremesso. É isso que nós não queremos. Ao fim de 5/6 anos estamos com uma mentalidade um bocadinho mudada, digamos assim, e penso que as pessoas vão entender aquilo que são as comunicações das equipas de arbitragem. Espero que as pessoas utilizem isto por algo mais pedagógico, esse o nosso principal objetivo. Vamos tentar fazer com que as pessoas compreendam as decisões dos árbitros e de que forma eles a tomam. Se não for esse o caminho, temos sempre oportunidade de fechar novamente. Mas o que queremos é que entendam a arbitragem. Entendam que os árbitros cometem erros, toda a vida vão cometer enquanto forem seres humanos, em Portugal ou qualquer país do Mundo. É isso que queremos que se perceba.

- Então depende do nível de ruído o alargar ou suprimir a chegada das comunicações ao público, é isso?

- Basicamente, sim. Ou seja, aquilo que queremos é abrir, mostrar, para que o público perceba as decisões que são tomadas e porque é que foram tomadas. A verdade é que ainda não conseguimos fazer como faz a FIFA, apesar do pedido que fizemos assim que houve essa oportunidade por parte do IFAB (International Football Association Board). Mas neste momento o IFAB só deu autorização à FIFA para poder fazer em tempo real. Nós na altura fizemos logo esse pedido e não nos foi concedido. Penso que fomos a primeira federação a fazer esse pedido. Enquanto não chegarmos a esse patamar, que é muito interessante para o entendimento do público sobre a decisão tomada em tempo real, vamos fazer este patamar intermédio. Aquilo que não queremos é que com a nossa abertura haja mais ruído no futebol. O que queremos é que, com a nossa abertura, haja mais calma no futebol.

- Mas há modalidades em que já se ouvem os árbitros em tempo real. Porque é que no futebol é mais difícil?

- Há modalidades em que, efetivamente, já existe, mas essas modalidades já têm mais ou menos esse sistema há muitos anos, não é? Temos sempre de pensar que em 5/6 anos, e 5/6 anos é muito recente para uma mudança tão drástica naquilo que é a arbitragem, naquilo que foi o futebol com a introdução do vídeo-árbitro. Essas modalidades já têm há mais anos que o futebol, mas penso que o futuro, tal como está a ser esta experiência por parte da FIFA, essa vai ser vai ser uma realidade muito em breve. Obviamente, Portugal estará a acompanhar a essa introdução e esse estudo.

- Sobre o relacionamento entre os árbitros e os bancos. Os avisos deixam de existir e o amarelo é a decisão. Isso significa que, na realidade, um dos grandes ruídos que tem havido nos jogos de futebol é o comportamento de dirigentes, treinadores e jogadores que se encontram no banco?

- Essa é uma questão que foi colocada pela UEFA, é uma instrução UEFA. Tivemos uma reunião com a UEFA há cerca de um mês, existe um grupo consultivo para aquelas que são algumas das alterações na UEFA em que estão seis países, Portugal, Espanha, França, Itália, Alemanha e Inglaterra. Estivemos nessa primeira reunião, e foi definido entre este grupo que iríamos fazer algumas alterações em termos daquilo que é o comportamento dos bancos, muito por força também da própria UEFA ter identificado nas suas competições alguns comportamentos que não são a melhor imagem para o futebol, e para a venda do futebol. E esta é uma instrução a todas as 54 federações. Posteriormente, fizemos uma reunião com as 54 federações, é uma instrução para as 54 federações, exatamente para não termos algumas imagens como aqueles aglomerados de jogadores ou outras pessoas a levantarem-se do banco, todos atrás do árbitro, ou os jogadores atrás uns dos outros, um banco contra o outro banco…  Isso é o que a UEFA não quer para o futebol, ou seja, esta instrução é mais no sentido de proteger a imagem do futebol e foi dada às 54 federações. Há um compromisso das 54 federações em atuar desta forma e é isso que vamos fazer.

- Adivinha-se uma época muito competitiva tendo em conta que só uma equipa entrará diretamente na Liga dos Campeões. Isso causa-lhe algum receio em termos de problemas para esta nova época?

- Nós encaramos todas as épocas, independentemente das vagas nas competições europeias, como sendo sempre mais difícil do que a anterior. Encaramos e tentamos encará-la sempre dessa forma. Obviamente, esta preparação foi feita a pensar numa época mais competitiva do que a anterior, estamos à espera disso, sabemos que a pressão vai ser ainda maior, fruto da questão que colocou agora, mas o que vamos fazer é estarmos aqui e ali imunes a essa pressão. Tratamos, sabemos, identificamos, fazemos também essa análise, efetivamente poderá vir a haver mais ruído. Estamos conscientes disso, mas vamos tentar obviamente passar um bocadinho à margem desse ruído.

- Falou de ruído. Imaginemos que esta experiência das comunicações corre bem. Admite, na próxima época, divulgar as comunicações áudio logo quando saírem os castigos, em vez de ser no final do mês?

- Sim, ou seja, correndo bem, as pessoas estando de boa fé para aquilo vai acontecer. Porque os erros vão acontecer e vamos mostrá-los. As comunicações que vamos tornar públicas podem ser erros, mas, obviamente, serão muito mais decisões acertadas do que erros. Mas poderão ser erros e não vamos esconder os nossos erros. Se correr bem, e as pessoas entenderem qual é a o nosso objetivo, porque a verdade é que a arbitragem não tem rigorosamente nada a esconder, concordando com ele e não utilizar para que se ande durante a semana com armas de arremesso contra a arbitragem, tentaremos que haja uma periodicidade maior do que apenas um mês.

- Há também a preocupação de humanizar mais o papel o árbitro aos olhos da opinião pública…

- Essa é uma preocupação que também temos. O que fizemos com todos os clubes da primeira divisão foi não só dar instruções [na quarta-feira estiveram dois representantes de cada clube da Liga a ver o desenrolar dos trabalhos...], mas também para as pessoas se conhecerem, ou seja, falarem de tudo e mais alguma coisa sem ser só arbitragem, só aquele momento do jogo, aquele erro, as decisões certas que tiveram. As coisas correram muito bem, as pessoas saíram daqui muito satisfeitas com essa abertura. Há que humanizar mais a figura do árbitro e que as pessoas entendam mais o que é esta profissão. Vamos ter mais ações deste género, o facto de vos trazer aqui também é para isso e, entre aspas, que nos ajudem e colaborem connosco a divulgar este treino que fazemos, para as pessoas não pensarem que, às vezes, é o árbitro chegar ao fim de semana com um saco e apita um jogo de futebol. Já não é assim. Eles trabalham quatro dias por semana, observam jogos de Portugal e não só, exatamente para tomar decisões, tentamos que as decisões sejam tomadas de uma forma mais rápida, em apenas um minuto têm de tomar uma decisão, isso faz tudo parte do treino. É apenas um pequeno exemplo. Os árbitros trabalham, tal como trabalham as equipas, para não errar ao fim de semana.

- Dentro deste pioneirismo e abertura, um desafio: quem é o árbitro da Supertaça?

- [risos] Esse é um desafio que ainda não pode ser divulgado. É um árbitro que efetivamente já está em forma, já está obviamente na nossa cabeça, depois deste curso que fizemos, depois daquilo que foi uma análise da época anterior, e obviamente também para aquilo que é o futuro que queremos para esse árbitro. Será um árbitro da primeira divisão e, obviamente, não vou divulgar neste momento.

NOTÍCIA ATUALIZADA ÀS 16.44h