Treinadores 'gringos' chegaram e estão para continuar no Brasil
Portugueses, na senda de Abel, Caixinha e Oliveira, continuam com as portas abertas no país. Tal como os argentinos. «Não é modismo, é tendência», diz presidente do Fortaleza
A meio de um treino do Palmeiras, o treinador português Abel Ferreira sublinhava os cuidados com a receção. No final, o guarda-redes brasileiro Weverton perguntou-lhe o que raio era essa tal de recessão, a forma como a palavra receção, dita por portugueses, soa aos ouvidos brasileiros. «A partir de então passei a usar domínio...», explicou Abel.
Os treinadores estrangeiros, mesmo os portugueses, ainda podem ter dificuldades de comunicação, como sucedeu com o pluricampeão técnico palmeirense, mas a tendência dos clubes do Brasil apostarem em gringos, como são chamados todos os não nativos do país, está para ficar, de acordo com os especialistas ouvidos por A BOLA.
Para Marcelo Paz, CEO da SAD do Fortaleza, a contratação de profissionais de fora «já está totalmente consolidada». «Não é mais um modismo, mas, como estão há muito no Brasil, entraram na roda vida das demissões a curto prazo», disse o dirigente, insuspeito de cair na tentação: o argentino Juan Pablo Vojvoda está no clube desde maio de 2021.
«Baseado no que ouvimos dos dirigentes nos últimos dois anos, a expectativa é de que sigam buscando mais treinadores estrangeiros», opinou Thiago Freitas, CEO da Roc Nation Sports no Brasil, empresa que agencia diversos jogadores, entre eles os palmeirenses Endrick e Zé Rafael ou o meio-campista do Bragantino Lucas Evangelista.
O Brasileirão de 2023 começou com dez estrangeiros, chegou a ter um recorde de 13 dos 20, sete portugueses, cinco argentinos e um uruguaio, mas terminou com apenas seis, entre eles os resistentes Abel, Pedro Caixinha (Bragantino) e António Oliveira (Cuiabá). Apesar da queda brusca na reta final, o Cruzeiro, que terminou com Paulo Autuori, já contratou o argentino Nicolás Larcamón.
Larcamón, pela primeira vez no país, pode, entretanto, sentir a barreira linguística a que nem Abel escapou. «O treinador deve ter a humildade de se adaptar à cultura, e não a cultura a ele, essa adaptação cultural é fundamental», explica Sandro Orlandelli, diretor técnico com passagens por Arsenal, Man. United, Internacional e seleção brasileira.
«Observamos, nas entrevistas, principalmente a treinadores de língua espanhola, não se importarem de tentar pelo menos ser um melhor comunicador com a língua, pois são fatores que no dia a dia vão ser decisivos para ter continuidade no trabalho», argumenta. Mas Thiago Freitas discorda.
«O idioma não foi problema para nenhum dos treinadores, é muito fácil a compreensão, tanto em espanhol, quanto com as pequenas variações do português falado em Portugal», afirma, tendo em mente Ramón Díaz, o treinador do Vasco que, mesmo falando um castelhano carregado, salvou o gigante da colina da descida.
A tendência chegou, entretanto, à Série B. Para 2024, o Sport Recife contratou o argentino Mariano Soso e o Botafogo de Ribeirão Preto o português Paulo Gomes.
«O projeto pede treinador com muito conteúdo e buscámos no mercado o Paulo Gomes, que fez a formação e tem a Licença Pro da CBF», explicou Sergio Dimas, gerente executivo do futebol do pantera.