O que é nacional é bom? No Berço dizem que sim, o Benfica acredita menos
Primeira volta da Liga mostra que se mantém o padrão da aposta em mais jogadores nascidos fora de Portugal; na Liga 2 a tendência é a oposta; V. Guimarães é o clube mais 'português', encarnados são os que menos apostam no talento luso
O futebol tem feito com que Portugal seja reconhecido como formador de talento. E continuam a ser muitos os jogadores que saem de Portugal para os maiores palcos do futebol internacional, dando força a esse selo há muito colado ao campeonato luso. Porém, também já não é de agora que se percebe que em Portugal não se formam (e exportam) apenas jogadores portugueses.
O Sindicato dos Jogadores fez um levantamento sobre a utilização de jogadores portugueses e estrangeiros nas ligas profissionais e o estudo mostra que o padrão se mantém inalterado: continuam a ser mais jogadores estrangeiros do que portugueses aqueles que atuam na Liga. A diferença na primeira volta foi até a maior das últimas três épocas, ultrapassando os 60 por cento.
Dos 282 jogadores utilizados pelas 173 nasceram fora do país, contra 109 nativos lusos, o que representa um crescimento de 4 por cento dos estrangeiros, comparativamente com a época passada.
«Ouro da casa» brilha mais no berço
Olhando para os dados apresentados pelo Sindicato, foram utilizados 63 jogadores estrangeiros e 40 portugueses com menos de 23 anos. Ainda assim, é no escalão entre os 24 e os 28 anos que a predominância de jogadores estrangeiros é maior: 80 para 42. O maior equilíbrio é encontrado nos atletas com mais de 29 anos, ainda com predominância dos estrangeiros: 30-27.
No que diz respeito à utilização por clubes, só V. Guimarães e o Boavista apostaram em mais portugueses do que estrangeiros: os vimaranenses utilizaram uma média de 12 atletas lusos e quatro estrangeiros por jornada, enquanto nos axadrezados a média é de oito portugueses e seis estrangeiros.
De resto, os Conquistadores não utilizaram menos de 11 atletas lusos em nenhuma das 17 primeiras jornadas e o máximo de estrangeiros foi cinco, sendo mesmo o único clube que teve mais atletas nacionais em campo em todas as rondas.
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António Miguel Cardoso, presidente dos vimaranenses, realça, porém, que o clube não olha a nacionalidades na hora de escolher o talento.
«Trata-se de uma feliz coincidência. O Vitória nunca deixará de apostar em atletas vindos da formação e, por aí, naturalmente que os jogadores portugueses são uma larga maioria. Mas o clube olha para o mercado por inteiro, sempre em busca de bons atletas, não havendo no processo de seleção qualquer constrangimento relacionado com nacionalidades. A qualidade dos atletas estará sempre em primeiro lugar em conjugação com outras vertentes», refere o dirigente.
No prato oposto da balança, o Benfica foi o clube em que a disparidade foi maior: as águias utilizaram em média 13 jogadores estrangeiros e apenas três portugueses. Em oito das 17 rondas, os encarnados fizeram alinhar apenas dois jogadores nascidos em Portugal e aquela em que apostou no maior número de lusos foi na 2.ª jornada (vitória por 3-0 sobre o Casa Pia), com cinco: Tomás Araújo, António Silva, Florentino, João Mário e Tiago Gouveia.
O documento mostra ainda dois casos de paridade entre jogadores portugueses e estrangeiros: o FC Porto e o Estrela da Amadora utilizaram em média oito nacionais e oito internacionais.
No que diz respeito aos dragões, o «ouro da casa», como lhe chamou Vítor Bruno, superou em seis das 17 jornadas o número de atletas estrangeiros, em nove foram mais os internacionais, enquanto em duas delas o número foi igual.
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O conjunto da Amadora, por outro lado, alinhou em sete jornadas com tantos jogadores nascidos em Portugal como fora do país.
Na Liga 2 o talento nacional... compensa
Quando olhamos para a Liga 2, a realidade é quase oposta. Em 282 jogadores utilizados, 150 são portugueses e 131 como estrangeiros.
Em termos etários, 42% dos atletas têm até 23 anos, sendo que apenas no escalão de mais de 29 anos – que corresponde a uma fatia de 23% - é que os portugueses estão em maioria: são 42 contra apenas 22 estrangeiros.
De resto, em praticamente todas as jornadas foram utilizados mais jogadores lusos do que estrangeiros. A única exceção aconteceu na ronda número 9 em que o número foi igual: 139.
O estudo do Sindicato mostra ainda que três das equipas que, em média, utilizaram mais jogadores portugueses, terminaram a 1.ª volta nos três primeiros lugares: Penafiel (12), Tondela (10) e Benfica B (12). Já o Felgueiras, que foi a equipa que apostou mais na nata nacional (em média 13 por jornada), era 11.º classificado.
O mínimo de jogadores nacionais utilizados pelo Felgueiras foi 12, sendo que nas duas primeiras jornadas esse número subiu para 15, contra apenas um estrangeiro.
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Para Reinaldo Teixeira, presidente do clube do distrito do Porto, a aposta no jogador luso tem sustentado o crescimento da entidade.
«A razão de sermos o clube que mais aposta em jogadores nacionais é simples: surge da crença que eu e a minha equipa temos nas capacidades dos jovens jogadores portugueses. É um processo desafiante ensinar, motivar e acreditar neles, de forma a extrair o melhor do seu potencial e a levá-los a acreditar que é possível atingir o topo do futebol», refere o dirigente.
«Quando o trabalho de formação é bem feito, conseguimos, juntos, alcançar os objetivos que propomos aos atletas: mudar a sua vida desportiva e financeiramente, e, ao mesmo tempo, gerar mais valor económico para o clube, contribuindo para o seu orçamento», orgulha-se.
Ainda na Liga 2, o Benfica B, que foi a segunda equipa que, em média, apostou em mais talento nacional, chegou a ter 14 lusos em campo num jogo e o mínimo foram 10.
Das cinco equipas que utilizaram mais atletas nascidos em Portugal, o FC Porto B era o pior classificado, no 17.º lugar.
Em sentido contrário, o Portimonense é o clube mais estrangeiro do segundo escalão do futebol nacional, com uma média de cinco jogadores lusos contra 11 internacionais.
«No topo da pirâmide prevalece a lógica de mercado»
Confrontado com os resultados do estudo, o presidente do Sindicato dos Jogadores, Joaquim Evangelista, defende que «os números apresentados não parecem desanimadores», no que diz respeito às competições profissionais.
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«Na Liga, a tendência de maioria de jogadores estrangeiros explica-se pelo facto de, no topo da pirâmide do futebol português, prevalecer a lógica dos resultados imediatos e do mercado», realça.
«Também porque somos um país iminentemente exportador do talento, sobretudo de jovens jogadores, o que perante uma base de recrutamento nacional limitada pela própria dimensão do país, obriga ao recrutamento fora de Portugal», nota.
«Na Liga 2, os jogadores portugueses continuam a representar a maioria dos futebolistas utilizados (53%), precisamente porque este é um espaço competitivo que dá mais oportunidades aos jovens formados localmente, até pela presença de duas equipas B (Benfica e FC Porto) na competição, bem como pela menor capacidade de investimento no recrutamento de atletas estrangeiros», finaliza.
Força Vitória!