O clube da Liga 3 que (quase) desapareceu
Nii Plange e João Guilherem jogando pelo Oriental Dragon frente ao Sporting B (Fotos: ASF/ALEXANDRE PONA e Oriental Dragon-Facebook)

Pelos Caminhos do Futebol O clube da Liga 3 que (quase) desapareceu

NACIONAL02.04.202509:00

Pelos Caminhos do Futebol é uma rubrica de A BOLA que, semanalmente, o levará até ao país profundo. Esta quarta-feira, recordamos um projeto que desafiou expectativas, mas que agora está em banho-maria, aguardando a construção de um centro de estágios inspirado nas academias de Benfica e Sporting

«Foi mesmo no último dia de fechar as inscrições das equipas, disseram-me para mandar um email para a Associação de Futebol de Setúbal a dizer que não íamos ter equipas». Fundado em 2014, o Oriental Dragon teve nove épocas desportivas com uma equipa sénior. Até desaparecer do radar, em 2024/25, desta forma, conta-nos Luís Sousa, diretor do clube detido pelo empresário chinês Qi Chen, mas que em Portugal é gerido por Chen Long. 

«Isso não se faz, isto não era uma equipa qualquer, esteve na Liga 3, mas foi feito em cima do joelho», acrescenta Luís Sousa. O Oriental Dragon começou do zero, nas divisões distritais, esteve na Liga 3 em 2021/22, época na qual quase eliminou o Moreirense da Taça de Portugal.  

Luís Manuel treinou a equipa nesse período dourado, que recordou assim, falando com A BOLA: «Ninguém sequer pensava em chegar à Liga 3, não era o objetivo. Mas com o grupo que reunimos, chegámos a esse patamar. E sabíamos da dificuldade que era, porque não tínhamos infraestruturas.» 

Sediado no Pinhal Novo, a equipa tinha de andar com a casa às costas, treinava no campo do Palmelense ou do Moitense (onde também jogava, para o Campeonato de Portugal), e na época da Liga 3 jogava no Estádio Alfredo da Silva, do Fabril, no Barreiro.  

Luís Manuel subiu o Oriental Dragon à Liga 3 (Foto: ASF/JOSÉ LUÍS)

«Não conseguiram criar uma infraestrutura para aguentar o clube», explica Luís Manuel, que mesmo assim ficou «surpreendido com a queda, sobretudo para a distrital». «Nesse ano em que desce, tinha plantel para ser candidato à subida de divisão, porque tinha uma equipa forte. A queda para a distrital foi dolorosa para o clube e para mim, que passei lá alguns anos.» 

«Foi-me vendida uma coisa e depois aconteceu outra» 

Entre 2020/21 e 2023/24, o Oriental Dragon nunca esteve duas épocas seguidas no mesmo escalão, e a queda até à 1.ª Divisão distrital ocorreu um ano após a equipa disputar o último jogo na Liga 3. David Kong representou o Dragon nesse jogo e admite «que as duas descidas de divisão tornaram o projeto impossível». 

«Já sabia que as condições não eram as melhores, treinávamos num relvado sintético e jogávamos num de relva natural, isso faz toda a diferença», explica. 

Hugo Falcão fez parte deste trajeto, treinando a equipa em quatro jogos na época da descida à divisão distrital. «Passado uma semana já estava arrependido. Foi-me vendida uma coisa e depois aconteceu outra e por isso é que eu me fui embora. Era um clube com poucas condições, não tinham campo. Os próprios jogadores já estavam cansados do projeto», recorda. 

Hugo Falcão, aqui enquato técnico do Sintrense, só orientou o Oriental Dragon em 4 jogos (ASF/SÉRGIO MIGUEL SANTOS)

A abordagem ao treinador foi feita por Chen Long, com a equipa ainda na Liga 3: «Na altura eu estava no Sintrense e não aceitei, mas depois voltou a fazê-la já no Campeonato de Portugal». Falcão foi substituído por Toni Pereira, que foi contactado por A BOLA, mas não quis prestar declarações. 

Projeto chinês e um «acordo de cavalheiros» 

O Oriental Dragon sempre teve como objetivo potenciar jogadores chineses, para depois os vender para a China. Luís Manuel, o treinador que mais tempo passou no clube (50 jogos), explica como é que tal era posto em prática no campo: «Quando cheguei havia... não era uma imposição, uma conversa de que tinha de pôr alguns jogadores chineses a jogar.»

«Isso era importante para eles. Essa exigência não era contratual, no papel, havia um acordo de cavalheiros. Da minha parte, cumpri essa situação», conta o técnico, que não terá tido a mesma experiência de Hugo Falcão.

Uma reportagem de A BOLA foi conhecer os jogadores chineses do Oriental Dragon em 2014. Agora, o clube não tem jogadores (foto: ASF/RUI RAIMUNDO)

«Havia uma obrigação de usar um ou dois jogadores, desde que não afetassem o rendimento da equipa», conta: «Mas a verdade é que depois esses jogadores, em jogo, cometeram erros muito graves. Eu cheguei ali a uma altura que pensei se aquilo já era premeditado. Parecia de propósito. Durante a semana trabalhavam de uma forma e depois no jogo havia muitas falhas».

O jovem técnico, atualmente na formação dos sauditas do Neom, diz que «houve jogadores que beneficiaram do projeto, como Liu Yang que é internacional chinês», mas que «com o passar do tempo, o projeto foi perdendo credibilidade e valor».

Uma obra principesca

Quem nos fez a primeira garantia que o Oriental Dragon não desaparecera foi Francisco Cardoso, presidente da AF Setúbal: «O clube está inscrito na associação. A informação que tenho é que vão construir um complexo novo». Nem Luís Manuel, amigo de Chen Long, estava a par: «Tenho falado e almoçado com o Sr. Chen algumas vezes e não sabia dessas obras.»

Luís Sousa, diretor do Oriental Dragon, fala-nos de uma obra de grande dimensão: «O arquiteto mostrou-me o projeto. O objetivo é ter três campos com relva natural, um sintético, um edifício com 25 quartos, cinco suítes, restaurante e ginásio.»

A construção será no Pinhal Novo, na zona da Palhota, e em Portugal, só se poderá equiparar às academias de Benfica e Sporting. «O que está no projeto é uma obra desse género», adianta, tendo em conta que a obra ainda não arrancou.

Nii Plange, que representou o Sporting, aqui enfrenta a equipa B dos leões pelo Oriental Dragon
Nii Plange, que representou o Sporting, aqui enfrenta a equipa B dos leões pelo Oriental Dragon (Foto: ASF/ALEXANDRE PONA)

«Isto atrasou-se um bocadinho. Acho que aquele terreno era agrícola, tiveram de o reverter. Mas o município facilitou isso tudo, tem ajudado e vê isto com bons olhos», acrescenta Luís Sousa.

Ainda não há previsões para o início da construção, mas quando esta estiver concluída, a ideia, segundo o diretor do clube, é que o Oriental Dragon volte a competir: «Vamos começar do zero, na 2.ª divisão distrital». No entanto, o centro de estágios também terá o objetivo de albergar equipas chinesas para estágios em Portugal.

«Estavam a pensar trazerem trabalhadores da China para construir o Centro de Estágio, por ser mais rápido. Até deram o exemplo do hospital que fizeram no Covid», acrescenta Luís Sousa.

Assim, o futuro do Oriental Dragon escreve-se, para já, em poucas linhas. A Qi Chen cabe a decisão de voltar a competir, mas ao foco está numa obra que não começou. Deste modo, uma garantia final é-nos dada por Luís Manuel.

«Se o Oriental Dragon voltar com infraestruturas, não tenho dúvidas de que se pode projetar para outros patamares, porque é um clube com muita ambição, dinheiro e que não deixa faltar nada aos atletas.»

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