A normalidade, se é que poderemos considerar normal uma equipa apresentar-se sem o seu treinador principal na área técnica, evaporou-se quando Cristo, ao minuto 83, colocou o Arouca a ganhar. Porque não é normal o FC Porto estar a perder em sua casa, mais a mais diante de um adversário teoricamente mais fraco. Ninguém saberia nessa altura, mas haveria 30 minutos para jogar e tanto, tanto para contar. Os jogadores do Arouca cerraram linhas, adivinhando o que aí vinha, FC Porto ainda mais intenso, a carregar, a responder com tudo o que tinha e não tinha à pressão do resultado e dos próprios adeptos, até porque atacava para a baliza guardada pela sua claque. Ninguém ainda sabia, como referimos, que o jogo só terminaria aos 90+23, pelo que os dragões tinham mais pressa do que arte, acusando a ausência de Otávio, da sua mente criativa. E corajosa. A tentação chegaria, pois, na sequência de um livre lateral: bola na área do Arouca, Fábio Cardoso no chão, Taremi no chão, protestos, pressão sobre Miguel Nogueira, que esperaria pelo VAR para confirmar que Arruabarrena tinha socado a bola, sem razões para falta, para penálti. Mas a pressão não cessava, antes aumentava. O árbitro que o diga, pois ao minuto 90 assinalou, com alguma hesitação, penálti sobre Taremi, que se fez a uma bola no coração da área bem marcado por Bogdan. O iraniano apareceu estatelado, Miguel Nogueira não apontou para a marca do pontapé de penálti tão depressa quanto seria desejável. Logo aí cresceram as dúvidas. Os jogadores do Arouca rodearam o árbitro, o juiz dirigiu-se à zona das imagens como se tudo estivesse perfeitamente sob controlo, mas acabou a falar demoradamente através de um aparelho que parecia um telemóvel. O protocolo indica, todavia, que seja um walkie talkie a aparecer em cena quando não há imagens e som, o que alegadamente acontecia. Independentemente do equipamento utilizado, em conversa com o VAR Rui Oliveira e sem consultar imagens, o árbitro decidiu reverter a decisão tomada em campo. Drama, farsa e comédia, tantos géneros teatrais numa mesma peça. O penálti, porém, era ator principal e chegaria novamente, uma vez mais envolvendo Taremi. Galeno foi chamado, minuto 90+15 (!), e perdeu o duelo com Arruabarrena, espetacular nesta especialidade. Mesmo com Sérgio Conceição no camarote, Pepe lesionado e Otávio na Arábia Saudita, o FC Porto foi, no entanto, capaz de mostrar do que é feito e chegar mesmo ao empate, ao incrível minuto 90+19’. Evanilson acrescentava justiça a este grotesco espetáculo de domingo. ... e até algum futebol Sérgio Conceição, como já referimos, estava castigado e longe do banco, Pepe, o capitão, estava lesionado, Otávio, o génio e o nervo em pessoa, estava na Arábia Saudita. Sem a autoridade destes três pilares, a equipa portista entrou sem a identidade que a caracteriza, deixando andar em vez de ir à procura, parecendo acreditar que mais tarde ou mais cedo o golo chegaria, mais a mais perante um adversário agarrado ao 5x4x1 como uma lapa a uma rocha. O Arouca é uma equipa recheada de bons jogadores em todas as zonas do terreno e depressa mostrou que sabia defender, mas os seus criativos e ambiciosos jogadores da frente não disfarçavam dificuldades para fazer algo com os desequilíbrios constantes através do drible, pois estavam tão longe que nem viam a baliza portista. O Arouca era um daqueles carros velozes que não usam todos os cavalos, o FC Porto ia vivendo das tentativas de Toni Martínez, que chegou a acertar na trave. Sairia com alguma surpresa ao intervalo, deixando Taremi em campo. O FC Porto voltou diferente, mas não tanto quanto necessitava. Foi procurando mais e arriscando todos os argumentos à disposição, mas foi o Arouca que marcou mesmo, numa rara subida à área de Diogo Costa. Vários ressaltos ganhos depois, Cristo ficou em posição de visar a baliza. Golo ao minuto 83, só faltava ao Arouca aguentar a meia hora seguinte. De penálti reclamado em penálti reclamado pelo FC Porto, o jogo foi-se arrastando - só na conversa por walkie talkie foram mais de cinco minutos... -, Miguel Nogueira acabou por conceder 17 (!) minutos de tempo extra. Galeno falharia penálti ao minuto 90+15’, tudo parecia perdido, mas o relógio chegava mesmo ao minuto 90+19’, o minuto em que, com justiça, Evanilson fez o 1-1. Era só um bocadito de futebol puro, porque rapidamente voltaram os géneros teatrais à cena: ao minuto 90+20, Miguel Nogueira era visto a entregar ao 4.º árbitro isqueiros oferecidos pelas bancadas. A cortina foi corrida ao inédito minuto 90+23’. O árbitro: Miguel Nogueira (nota 4) A dificuldade dos lances é uma realidade e, ainda assim, com ajuda do VAR, acertou quase sempre, mas não se pode marcar penálti sem convicção. E parece ter sido o caso ao minuto 90. Melhor em campo A BOLA - Arruabarrena (Arouca)