CRÓNICAS DE UM MUNDO NOVO A Premier League e o respeito pelos adeptos (artigo de José Manuel Delgado)
Ontem ficou a saber-se que pelo menos 29 dos 92 jogos que faltam para que termine a edição de 2019/20 da Premier League serão transmitidos gratuitamente, em canal aberto.
O Daily Mail explicou que «os 92 jogos que faltam para concluir a época 2019/20 serão transmitidos em direto no Reino Unido pelos parceiros da Liga - Sky Sports, BT Sport, BBC Sport e Amazon Prime - já que as partidas decorrerão à porta fechada.
A BBC dará quatro jogos em direto, em canal aberto; a Sky Sports transmitirá 64 jogos, com 25 a serem disponibilizados gratuitamente –incluindo o derby entre Everton x Liverpool; o BT Sport exibirá um total de 20 partidas ao vivo, enquanto o serviço de streaming Amazon Prime também dará quatro jogos ao vivo.»
Coube ao diretor-executivo da Premier League, Richard Masters (o Pedro Proença dos ingleses), lembrar, a propósito do regresso do futebol, a importância da televisão e o respeito pelos adeptos:
«Concordámos em retomar a Premier League na quarta-feira, 17 de junho, mas essa data não pode ser confirmada até que cumpramos todos os requisitos de segurança necessários, já que a saúde e o bem-estar de todos os participantes e adeptos é nossa prioridade.
Infelizmente, os jogos terão de ser disputados à porta fechada, daí que estejamos particularmente satisfeitos por termos encontrado uma solução positiva para que os adeptos possam assistir aos 92 jogos. A Premier League e nossos clubes têm orgulho de ter adeptos incrivelmente apaixonados e leais e é importante garantir que o maior número possível de pessoas possa assistir aos jogos em casa.»
Cada caso é um caso, cada país tem o seu próprio modelo de negócio, e só é pena que em Portugal não tenha sido possível seguir uma via semelhante, com a disponibilização em canal aberto de um ou dois jogos por jornada. Mas os fundamentos desta decisão inglesa, essencialmente o profundo respeito demonstrado pelos adeptos, traduzem uma forma de estar que percebe que é preciso compensar e até mimar quem representa a alma do jogo, quem aporta ao espetáculo a paixão que o torna ímpar no mundo.
Pois é. Pedro Proença, num afã de ganhar o protagonismo que todos os dias sentia que estava a perder, deu um passo maior que a perna ao enviar cartas a sugerir jogos em aberto ao ministro da Economia e ao Presidente da República, sem ter dado cavaco prévio a clubes ou operadoras. A forma usada por Proença foi desastrada, mas o conteúdo era muito válido e baseado nos pressupostos corretos.
Não sei se ainda será possível fazer alguma coisa por esta causa, ou se há que dá-la como perdida.
Mas, à inglesa, de forma adulta e responsável, e encontrado o consenso possível entre clubes, operadoras, e canais da TDT, esta era a via mais justa, porque recompensaria a paixão dos adeptos que não podem ir ao estádio, vão ter dificuldade em frequentar cafés e esplanadas, em função das regras de distanciamento social, e em milhares (ou milhões?) de casos, não dispõem de orçamento que comporte 40 ou 50 euros por mês para ver futebol.
Este é mais exemplo que nos permite perceber de forma cristalina as diferenças entre os players da indústria do futebol em Inglaterra e em Portugal. Enquanto os adversários se virem como inimigos e os sponsors não vestirem a pele de parceiros, enquanto houver meros fornecedores e compradores, continuaremos condenados a não sair da cauda do pelotão da modernidade.