ENTREVISTA A BOLA «Ficaria surpreendido se Ronaldo deixasse a Seleção antes de 2026»

SELEÇÃO10.07.202408:45

A BOLA foi recebida por Francisco Ribeiro de Menezes, embaixador de Portugal da Alemanha. Uma conversa sobre a campanha da equipa das quinas no Euro 2024, mas também sobre Sporting, carreira diplomática e Sétima Legião

BERLIM - Poucos dias depois da eliminação de Portugal do Campeonato da Europa, e a menos de uma semana da final do torneio, a equipa de reportagem de A BOLA é recebida na embaixada de Portugal na Alemanha. O embaixador, Francisco Ribeiro de Menezes, aceita fazer um balanço da campanha da equipa das quinas, da relevância e do futuro de Cristiano Ronaldo, e também olhar para a própria organização do torneio.

A BOLA - Como foi receber a Seleção Nacional aqui na Alemanha? Teve oportunidade de estar com a equipa? Assistiu a todos os jogos?

FRANCISCO RIBEIRO DE MENEZES – Foram semanas muito intensas para todos. Para os portugueses que compõem a nossa comunidade na Alemanha, para os portugueses que vieram ver os jogos. E para nós, embaixada e consulados, que acompanhámos estas idas e vindas a par e passo, para ter a certeza que tudo se processava da melhor maneira. O balanço é muito positivo. Os portugueses foram muito bem recebidos. Também sabiam ao que vinham. Só foi pena termos saído mais cedo do que seria o anseio de todos nós. Eu, por questão de agenda, não fui ao primeiro jogo-treino, em Marienfeld, que foi aparentemente épico. Logo aí se viu o grau de atenção e paixão que a Seleção desperta. Não apenas entre adeptos portugueses, mas também alemães, e de muitas outras nacionalidades. Depois estive em Leipzig, Dortmund, Gelsenkirchen e Frankfurt. Só não pude ir a Hamburgo, por um compromisso familiar importante – o meu filho recebia o diploma do ensino secundário alemão. Espero não ter dado azar. Foi muito motivador, sempre. Foi muito interessante ver como adeptos alemães, e de outros países, saudaram a presença dos representantes portugueses. Tivemos cá o Sr. Primeiro-ministro duas vezes, o Sr. Presidente da Assembleia da Républica duas vezes, e o Sr. Presidente da Républica uma vez. Foi muito interessante ver tantos estrangeiros com a camisola da Seleção, normalmente do Cristiano. Foi muito bonito ver como, de uma maneira geral, as seleções se respeitaram, e o público se respeitou. Há sempre uma assobiadela na altura dos hinos, mas nada que fosse chocante. Foi muito comovente ver como todo o estádio se calou no minuto de silêncio por Manuel Fernandes. Tivemos muito contacto com a Federação Portuguesa de Futebol, que foi inexcedível e extremamente profissional. Para nós, mesmo tendo acabado um pouco mais cedo do que devia, foi uma experiência única.

- Que balanço faz da campanha da Seleção?

- Saímos nos quartos de final com o velho nemesis, o arqui-inimigo do futebol português, que é a seleção francesa. Paradoxalmente – parece-me opinião consensual – no jogo em que a nossa Seleção mais jogou, mais perto esteve de todo o seu imenso potencial. Não acho que seja uma desonra sair nos quartos de final, com a França, e nos penáltis. Acho que é um Europeu marcado pela surpresa do equilíbrio do nível das equipas, sobretudo no plano defensivo. Nós próprios tivemos problemas para contornar defesas de seleções teoricamente mais fracas. Tivemos a surpresa, mais ou menos consentida, da Geórgia. Mas vimos como outras seleções tiveram problemas sérios para ultrapassar rivais mais fracos. Termos ficado nas oito melhores seleções não é, de maneira nenhuma, uma desonra.

- Não sei se estava a torcer por uma final entre Portugal e Alemanha

- Estava. Mas até aí tivemos uma dificuldade acrescida: a nossa metade do campeonato era, no plano teórico, a mais difícil. Infelizmente, tínhamos pela frente França, Espanha e Alemanha. Nunca seria possível ter uma final entre Portugal e Alemanha. Como imagina, para um embaixador de Portugal neste país, ter a Seleção no Estádio Olímpico, num jogo dessa natureza, seria um ponto muito alto da minha vida profissional e pessoal.

- Foi embaixador em Espanha. É por essa seleção que torce agora?

- Fui embaixador e antes já tinha estado lá colocado com outra função. Tenho uma relação muito chegada aos nossos vizinhos espanhóis,. Admiro muito a sua seleção, que tem jogado muito bem. Tenho uma costela de simpatia muito grande também pela Inglaterra. É um pouco o submarino deste campeonato, tem conseguido esgueirar-se e sair de situações difíceis. Vamos ver. Se Espanha ou Inglaterra conquistarem o título ficarei muito satisfeito.

- Como referiu, em todo o lado era possível encontrar estrangeiros com camisolas da Seleção, e de Ronaldo. Ouvimos também emigrantes a dizer que muitos alemães nem sabiam onde era Portugal, antes de aparecer Cristiano. É uma espécie de embaixador universal?

- Cristiano Ronaldo é um embaixador universal de Portugal. Isso é um dado assente, incontornável, e muito merecido. Na Alemanha, de alto a baixo, há um surpreendente grau de conhecimento do que é Portugal. Há muito interesse no nosso país. Está sempre no top 3 dos nossos parceiros de turismo. Há muito interesse pela língua e pela cultura portuguesa. Há, obviamente, a influência da comunidade portuguesa, que se começou a instalar aqui, de forma organizada, há 60 anos. O primeiro acordo entre Portugal e a RFA data de 1964. Milhões de portugueses passaram por este país. Acho difícil que, qualquer alemão que seja interpelado na rua, não saiba que Portugal é um país independente, membro da União Europeia, e situado no extremo ocidental da Europa. Agora: o que é certo é que figuras que se destacam no mundo do desporto, com o grau de projeção do Cristiano, e antes dele outros, como Eusébio, dá um contributo importante para um maior reconhecimento de Portugal.

- Acredita que este Europeu marca a despedida do Cristiano Ronaldo da Seleção? Como viu a sua prestação no torneio?

- O Cristiano é um fenómeno único de dedicação, compromisso, superação, tenacidade, ambição… Pulverizou todos os recordes. Continua empenhado. Temos o Mundial daqui a dois anos… quem sou eu para vaticinar, mas conhecendo o seu percurso até agora, e o grau de dedicação que tem à profissão, ficaria surpreendido se Cristiano Ronaldo dissesse que ia embora antes de 2026.

- E como viu aquela imagem final do Pepe a chorar abraçado ao Cristiano Ronaldo?

- Muito sentida. Profunda emoção. O Pepe fez um campeonato extraordinário. É outro caso de superação e de dedicação. É possível que esse abraço tenha outras dimensões. É possível que tenha sido um sinal do Pepe, mas são jogadores de tal maneira profissionais, conhecedores do seu próprio corpo, que só eles saberão o momento em que penduram as chuteiras.

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