Vinte e cinco de abril

OPINIÃO25.04.202107:00

Há precisamente quarenta e sete anos não tive aulas na Faculdade de Direito. Havia uma «revolução em marcha». As Forças Armadas estavam a «tomar conta do poder». A derrubar o «regime», já em agonia. Vai acabar, dizia-se com alegria, a guerra colonial, uma das angústias existenciais da minha geração. Sou, assim, de uma geração que sentiu a alegria intensa  daquele dia, a exaltação nos e dos dias seguintes - e desde logo a imensa festa que foi o seguinte Primeiro de Maio -,e a fúria, bem contraditória , que Portugal viveu em muitas das semanas e meses seguintes. Como escreveu George Sand «a recordação é o perfume da alma, é a parte mais delicada e mais suave do coração, que se desprende para abraçar outro coração e segui-lo por toda a parte»! Em cada 25 de Abril, até vivido e partilhado como Deputado num tempo concreto da minha vida, comemoro a liberdade de dizer sim e de assumir o não, o pluralismo de opiniões, de perspetivas de vida e de visões do mundo, o sentimento de um Abril sem donos - mesmo que alguns se julguem donos de Abril! - e, também, sem mestres! E desfruto deste Abril que é feito de diferenças mas como o abraço de comum semelhança que é a liberdade. Que bem senti quando dei aulas, e com ele tanto  aprendi e muito me enriqueci, a um Homem corajoso e generoso, a um Herói discreto e bem singular, a um Cidadão exemplar mas de uma simplicidade perturbante,  de seu nome Salgueiro Maia, «o homem que deu tudo e não pediu  nada»! E são todas as recordações destes largos anos que, para mim, são verdadeiros momentos de vida. E, também, e neste jornal de resistência e de excelência, de pluralismo e de liberdade, e apesar das crispações do momento, «perfumes da minha alma»! 

Agora que terminou, escrevo por ora (!), a ideia de Superliga Europeia vivemos, nas próximas semanas, jornadas de super disputas! Disputas pelo título e pelo acesso à Europa - que vai dos milhões aos tostões em razão de um único lugar -, disputas pela manutenção na Liga Portugal ou pelo acesso a esta Liga que conseguiu ,  e bem, um extraordinário patrocínio para os próximos cinco anos e disputas pela não descida das competições profissionais ou pelo acesso restrito à Liga Sabseg. São muitas disputas, diria que, seja em termos desportivos seja em termos financeiros, intensas super disputas. E até se vai igualmente jogar a manutenção ou o acesso nos tribunais, em especial no TAD, por extenso  Tribunal Arbitral do Desporto. Que merecerá, um dia, e aqui, uma serena reflexão e, até,  uma cuidada análise acerca da sua criação, seu funcionamento, suas competentes deliberações e também perturbantes insinuações! Mas, como estamos em Abril e no seu dia emblemático, apenas repetimos a frase mais escutada em janeiro de 1924 no enterro de Lenine: «O túmulo de Lenine é o berço da revolução!» Não o túmulo do TAD, escrevo eu! 

Faltam seis jornadas para o final da Liga principal e quatro ( já que se disputam hoje três jogos da jornada trinta!) da Liga Sabseg para terminar, nos relvados - sublinho e evidencio nos relvados! -, esta singular época desportiva. Singular pela ausência total de adeptos, nem que seja a título de experiência nestas semanas próximas, como, aliás, vai acontecer, e bem, com a cultura. O que sabemos é que hoje em Braga, com a arbitragem de Artur Soares Dias - que merece um cumprimento bem especial pela sua escolha para o Europeu e para os Jogos Olímpicos! -, teremos um jogo determinante para Sporting de Braga e Sporting e que, nestas duas jornadas, o Benfica joga depois do Sporting - frente ao Santa Clara - e antes do Futebol Clube do Porto - que quando jogar em Moreira de Cónegos já sabe o resultado da equipa de Jorge Jesus face ao Santa Clara! -  e, na jornada seguinte, o último a jogar será , na noite do Primeiro de Maio, o Sporting - frente ao Nacional - e o primeiro a entrar em ação será o Benfica na sua deslocação a Tondela. E já sabendo, também, o resultado obtido pelo Sporting de Braga no seu confronto, no Funchal, face ao aflito Marítimo. O que constatamos é que a diferença entre o Portimonense ( 12.º) e o Farense (17.º) é de sete pontos e estes dois históricos clubes do Algarve defrontam-se, em Faro, na noite da próxima terça-feira num dérbi que decerto esgotaria um Estádio emblemático. Há muitos pontos em disputa nas duas  competições da Liga Portugal. Por razões pessoais  - também no mesmo berço se nasce e se morre - acompanharei com toda a atenção - e imensa paixão! - o meu Benfica e também o Académico de Viseu. Que se confrontará, depois do jogo da manhã de hoje (Futebol Clube do Porto B), com o Casa Pia, o Vilafranquense, a Oliveirense e termina a época com o Covilhã. Sofrerei no sofá, o que já não é nenhuma novidade nestes largos meses de confinamento, voluntário e (ou) forçado. O que implica, de verdade, uma metamorfose de vida. E que nos leva a uma interpelação: onde e como estou? Nas antevésperas de ser vacinado!

E esta interpelação leva-me a uma reflexão na sequência do fiasco que foi, por ora, e de novo, a ideia de uma Superliga. Nesta semana, em conversa com o Doutor João Correia - Bom Amigo, ilustríssimo Advogado, benfiquista exemplar e Cidadão comprometido com Abril! -, ele recordou-me que no final do século passado participou, em Londres, no escritório de uma reputada sociedade de advogados, numa reunião embrionária da criação de uma Superliga Europeia de futebol. Os clubes envolvidos eram vinte e, ontem como hoje, terá sido o Bayern de Munique a dizer o primeiro não e logo a suscitar o fracasso de uma  ideia que, na altura, havia motivado um convite ao Benfica. Vinte anos passaram e a ideia voltou, regressou acelerada pela pandemia e pela reforma da Liga dos Campeões apenas em 2024. O que sinto e pressinto é que há clubes (em regra SAD´s) que, em razão da pandemia e das suas crises (financeira, por excelência) estão em sérios riscos de solvência, logo de sobrevivência. Podem aguentar os clubes- Estado e aqueles outros cujos donos tenham robustez financeira e lhes aportem fundos de outros negócios de que sejam titulares ou participantes. E o que se pode antecipar é que haverá clubes que irão vender participações sociais e outros, em verdadeiro estado de necessidade, vão alienar ativos relevantes ou, até, antecipar todas as receitas possíveis. E, aqui, este não rotundo à Superliga pode desencadear um outro terramoto em clubes de referência da Europa. Os sinais aí estão… e não são, apenas, do lado de lá ou para lá do Guadiana! Olhemos para o drama do Bordéus, como exemplo marcante de um clube médio! O que aprendemos com Jean-Jacques Rousseau é que «a verdade não é a estrada para a riqueza»! Não é mesmo. Verdade de sempre e verdade assumida neste dia da Liberdade, neste dia 25 de Abril!