Villas Boas e João Pereira que os deixem a falar sozinhos

Villas-Boas não tem de ir falar com quem faz atos de arruaça, crimes, quem gostava de ver novamente as macacadas do passado. Se for falar com eles… só para os mandar à fava! Crucificar João Pereira depois do primeiro desaire parece-me manifestamente exagerado, para não dizer desonesto. Este é o ‘Nunca Mais é Sábado’, espaço de opinião de Nuno Raposo

1 Nunca seria fácil. Nunca seria um barco a navegar em águas calmas. Acreditar que a transição no FC Porto se faria sem turbulência era como acreditar no coelhinho da Páscoa. Porque foram 40 anos daquilo, no muito bom que teve e no muito mau também, que apesar de derrotado por 80 por cento nas urnas deixou franja de 20 por cento daquilo, que estava só à espera de um par de derrotas para se manifestar e ruidosamente. Eles não querem saber de como André Villas-Boas herdou o clube, das dificuldades que enfrenta. Claro que a grandeza do FC Porto exige vitória, e mais atitude também, mas também tolerância que num ano zero é bem precisa. E paciência. Veja-se a que teve Frederico Varandas no Sporting, que antes da cartada Amorim enfrentou a ira de muitos.

Calha a propósito a lembrança do presidente do Sporting para ir ao que me trouxe a Villas-Boas. Varandas cortou com claques, Villas-Boas quer pô-las na ordem. Mas para isso não tem de ir falar com um conjunto de meia dúzia de indivíduos que esperaram a equipa no Dragão depois da eliminação da Taça de Portugal. Os adeptos têm o direito de protestar? Claro. Mas protestar não é atirar petardos ao autocarro. Isso são atos de arruaça, crimes. É certo que muitos portistas, até dos 80 por cento que votaram na nova Direção, estão a reclamar agora, mas os que foram ao Dragão no domingo à noite são os mesmos que gostavam de ver as macacadas do passado a acontecer. E a esses Villas-Boas não deve explicação alguma. Não tem de ir falar com eles, se for… só para os mandar à fava!

2 Nunca seria fácil. Nunca seria um passeio em águas calmas. Acreditar que a transição no Sporting, de Ruben Amorim para João Pereira ou outro qualquer treinador, se faria sem pedras no caminho era como acreditar no Pai Natal. Porque foram quase cinco anos de sucessos (com pelo menos uma época de insucesso pelo meio mas tolerada) que a maioria dos sportinguistas nunca se lembra de ter vivido noutra altura. E Amorim não foi apenas o sucesso desportivo, foi a estabilidade que deu ao clube, que permitiu a Varandas pôr ordem na casa mesmo na hora das medidas impopulares mas necessárias, foi a comunicação que tranquilizou e resolveu problemas.

Amorim só há um, como só há um Mourinho, um só Klopp, um só Guardiola. No Liverpool, no Sporting agora, nos passados clubes da época áurea de Mourinho e no futuro no City, substituir alguém genial foi, é e será tarefa árdua. Sobretudo porque a tentação da comparação acaba inevitável… Mas sinceramente: crucificar João Pereira depois do primeiro desaire — que por acaso foi só com Arsenal, mas pesado, sim, e o Sporting, como diz Hjulmand, «não pode perder 1-5 com nenhuma equipa do mundo», bem o dinamarquês na pele de capitão, apontando à grandeza do clube, mesmo que saibamos que até Real Madrid, City, Barcelona às vezes perdem por cinco… — parece-me manifestamente exagerado, para não dizer desonesto.

João Pereira nunca será Ruben Amorim, ninguém o seria, mas deixem pelo menos ver como corre com o Santa Clara, como corre com o Moreirense, como corre com o Club Brugge. E neste particular, os sportinguistas mostraram em Alvalade que o novo treinador vai ter apoio. Sim, claro que serão os resultados a ditar o futuro, como sempre, mas pelo menos deixem o homem trabalhar. E até prova em contrário, que João Pereira os deixe, para já, a falar sozinhos.