Sérgio Conceição: os grandes querem-se entre os maiores
O treinador do FC Porto está há demasiado tempo pronto para um grande clube europeu
Sérgio Conceição não terá chegado a conclusões muito diferentes das que a maior parte de nós já identificara, porém só ele conseguiria, graças à capacidade que tem, aliada à cultura que se condensa nas paredes de onde profere tantas palestras carregadas de combustível e ao medo cénico que o rival tem do Dragão, entrar em modo demolidor. Ao fazê-lo, deixou, naturalmente, um Benfica de novo cheio de dúvidas e a bater no fundo como nunca até aqui se vira na era Roger Schmidt.
A ténue pressão feita pelos avançados, os alas que não acompanham e deixam os laterais, já de si permissivos, em inferioridade numérica, o espaço que se abre entre linhas no momento em que defensivamente os encarnados se deixam partir não são grandes descobertas, mas poucos as exploraram tão bem como o técnico do FC Porto, exímio predador, como sempre, na preparação da batalha, mesmo que aqui e ali não possua armas para ganhar a guerra.
É sobretudo depois destes jogos e de outros que já fez na Liga dos Campeões, o último diante de um Arsenal poderoso no momento com bola, que a ideia sempre nos assalta: Portugal é já há bastante tempo demasiado pequeno para ele. E tenho consciência de que o escrevo nos dias em que, mais de 300 quilómetros a sul, Rúben Amorim disse precisamente o contrário, que este campeonato e o Sporting nunca teriam uma dimensão menor para si. Mas têm. Tal como para Conceição. Os grandes querem-se entre os maiores.
Consigo perceber porque o técnico se mantém ainda por cá, embora ache que esta temporada arrisque partir com menor poder de negociação caso a oportunidade surja. É o que também ditam os resultados e as coisas nesse patamar não estão nada fáceis, mesmo depois da goleada ao Benfica. A identificação que tem com o clube e a sua cultura, história e tradição, e que pode tornar para si mais fácil a criação da identidade à-Porto na equipa, será um dos motivos. O outro poderá ter que ver com o conforto de ter a família por perto. No entanto, esse momento virá. E talvez surja já dentro de poucos meses.
Taticamente, tanto na antecipação como na reação, acho-o pronto há muito, e Itália, pelo passado e perfil, parece destino quase anunciado. Da mesma forma que mostra um maior controlo em contexto europeu, em alternância com os exageros nas provas nacionais, já sabe que a sua postura em muitos momentos terá de ser diferente. No entanto, ter consciência da necessidade de mudar é ótimo ponto de partida.
Resta-me, no entanto, uma dúvida: que Sérgio seria esse num grande clube europeu? Uma réplica da ideia que plantou no Dragão e que coloca o compromisso à frente de tudo e torna difícil a gestão dos fantasistas – tal como aconteceu com nomes como Óliver Torres, Nakajima e Felipe Anderson, para citar alguns – ou uma nova, capaz de equilibrar na perfeição exigência e criatividade? É que, lá fora, não será fácil criar ou reforçar uma identidade se a cultura do clube não for propícia a tal.